Um dia acordei e descobri que podia ser eu a sentir o que já escutei de vozes aflitas. Que podia ser eu a temer pelos meus dias e pelas minha noites, pelos meus sonhos escondidos e pelos meus projectos inacabados. Eu já sabia que a vida nos trai como um homem de meia idade, sedento de mudança. Sabia que ela se enche de sopros que nos encostam a paredes e a espadas, paredes duras, frias e silenciosas, espadas firmes, violentas, precisas. Nada disto me espantou. Nada disto me fez redimensionar o espaço da minha existência. Nada disto me fez acreditar mais ou menos no divino, ou procurar respostas escondidas na fraqueza da esperança. A esperança é uma fraqueza, é um encosto mortiço e frágil, derrubado por uma brisa que parece não mover um grão de pó. O silêncio talvez seja o que mais dói, quando a esperança se aloja em nós como um bichinho de conta prestes a ser espezinhado. O silêncio na dúvida mata o sossego, derruba a mente, cria desarmonia no espaço côncavo do nosso corpo. Engraçado, mesmo que todos falem alto e ninguém se oiça no barulho, o que reina é o silêncio. Quem sabe da resposta que não queremos encontrar, quem sabe se das ausências que nos atiram ao rosto com força, como chapadas sem respeito.
O que me faz reflectir... Todos os textos que aqui publico são de minha autoria, e as personagens são fictícias. Excluem-se aqueles em que directamente falo de mim, ou das minhas opiniões, ou onde utilizo especificação directa para o efeito.
domingo, 28 de fevereiro de 2021
sexta-feira, 1 de janeiro de 2021
busca
Grupos de mulheres são um mundo que reúne a veracidade dos opostos. Ali convergem inúmeras reacções, que encerram construções, ambições, sentimentos, projecções. Há alguns com os quais me identifico, elegem o amor e o sonho, posso acreditar ou não, mas gosto muito. Há os que se concentram na prática do quotidiano, os filhos, a casa, o supermercado mais acessível, a receita mais eficaz para a tosse. Há os que se concentram na futilidade, um território alargado e inexplicável que por vezes mata tudo quanto é verdadeiramente importante, uma espécie de vazio vestido ao rigor de uma festa com direito a passadeira vermelha, dress code, e discursos que falam sobre a fome no mundo, os animais em extinção e a fragilidade do planeta. Não sei porquê, quase todos me confundem, quase todos me fazem afastar o quanto posso da generalidade do meu género. Escapam-se muitas, novas, velhas, analfabetas ou universitárias, ricas ou pobres, sociais ou solitárias. Que conseguem olhar para a consubstancia do mundo e falar dele com o sentir de uma mártir, com a sensibilidade de um toque ao de leve, com a consciência, clara, das forças opostas, e com a vontade, inabalável, de ainda assim continuarem em busca delas.