Veio cá para casa a máquina da costura da minha avó. Antiga, a pedal, envernizada e pintada, pronta para coser calças, camisas, saias, botões e folhos, joelheiras e cotoveleiras. Nada me fez cair ao chão, até ao momento em que abro a gaveta e encontro os pertences velhinhos da sua dona. Carrinhos de linhas de várias cores, um dedal, uma fita métrica, um saquinho com botões, tudo com um fortíssimo cheiro a Albertina. Não posso dizer que caí redonda, mas devo confessar que precisei de sentir as tábuas do soalho a ancorarem-me o corpo frouxo e o espírito. Não sei ao certo para onde fui naquele momento. Se para o sótão da casa dela, se para o hospital onde a vi respirar pela última vez, se para o cemitério onde o meu avô chorava com olhos de horror, quando a viu descer à terra. Somos pequenos, somos mais pequenos do que um bago de milho, dizia ela. Se ela não tivesse sido tão infinitamente grande, seria obrigada a concordar com isto que dizia. Completamente.
Ao ler isto, sinto o cheiro da máquina da minha avó, cujo recheio ainda está na minha caixa de costura e quando vou ao monte onde ela morava, vou mil vezes às suas louças, aos lençóis, ao chá na horta e a todo o hábito que deixou, a máquina ainda não foi restaurada talvez porque está em boas condições mas é impagável, as emoções que faz crescer. Um beijinho
ResponderEliminarAs memórias de infância são um território mágico. Tenho algumas precisas, como uma história guardada em suspenso, com cheiro, cores e sentires. Costumo dizer em jeito de brincadeira, mas muito a sério, que o mundo me pode levar tudo, menos a minha memória. Talvez por isso me assustem tanto algumas doenças do século... :(
EliminarOlá CF
ResponderEliminarHá momentos na vida em que a transcendência se materializa numa contradição que só a vida e os sentimentos podem explicar.
Também já me aconteceu situação semelhante.
Primeiro a surpresa foi enorme, mas depois chegou a sensação de conforto. De um conforto que só aqueles que muito amamos nos sabem dar.
Um abraço para si.
Maria
:) Faz parte de nós e da nossa plenitude esse conforto, não acha Maria?...
EliminarOutro abraço para si.
A minha mãe também herdou a máquina de costura da avó, na qual e com quem aprendeu a coser. Guardou-a e deu-ma a mim. Nela me ensinou a coser também. Com ela já transformei muitos trapos em agasalhos. É uma maneira de poder continuar a dar em seu nome. Estime bem a máquina.
ResponderEliminarUm abraço