sexta-feira, 25 de novembro de 2016

divindades

O perdão sério é uma das maiores artes do mundo. Em conversa científica dissertou-se o assunto, com uma devoção missiva de imperativa conclusão. Escrutinou-se o trauma, analisou-se os fundamentos, acolheu-se a dor e deu-se significado ao impacto. O impacto. O impacto é sempre um dado de análise importantíssimo de compreender, ou não fora o principal suspeito no caso do sofredor. Mas dizia eu que o perdão é uma arte. Dissemos em conjunto, a dada altura, médicos e não médicos, psicos, e psiquis. Tudo se prende com a dor que não passará. Com a tristeza que não morrerá, com o alfinete espetado no sítio onde a alma pica. É lá, nesse exacto local, que o danado mora. O perdão, sim, o perdão. Possível apenas depois do reconhecimento de que aquela dor nos pertence porque foi sentida, ficará connosco, e possivelmente nada a matará. Antes disso, antes de a vivermos até ao infinito do osso, antes de reconhecermos que é nossa, que magoa, mas que mesmo assim a queremos para a vida, não poderemos nunca falar de perdão. Poderemos eventualmente falar de tentativa de compreensão. Da boca para fora, num registo meramente cognitivo, longe, muito longe do essencial. 

(O perdão pertence a um território quase divino.) 

6 comentários:

  1. sim, o perdão verdadeiramente perdoado não é uma coisa deste mundo.

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  2. E como os semideuses praticamente não existem, não há perdão que nos salve. E lá se vai a fé nos homens...

    (Não obstante, consigo perdoar quando dou um pouco de mim e percebo muito melhor o outro)

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    1. Não olho para o perdão como um salvamento, mas como uma aceitação...

      ( O importante, a meu ver, claro, é percebermos as consequências que teve em nós. O meu foco está na dor que fica, não no porquê do que foi feito... O que foi feito, fosse porque fosse, já está. O que fica daí, é que importa integrar...)

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  3. CF, eu não esqueço, mas perdoo. Não o faço pelo outro, mas por mim.

    Um beijinho :)

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    1. É sempre por nós, Miss Smile. Perceber e aceitar o que nos dói, é um caminho sempre só nosso...

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