terça-feira, 25 de fevereiro de 2020

inquietos

Há na sociedade uma incrível tendência à perfeição. Oiço-a quase sempre em silêncio, como se ali ao lado cantasse um fado, palavras que inseridas umas nas outras produzem uma sonoridade cadente, de um lado o que é certo do outro o que é errado, uma pauta musical que se justifica pela vontade indómita da informação e do conhecimento. Nessa orquestra, e muito embora imensas verdades possam convergir, há uma convicção alicerçada no ego de cada qual, sempre devidamente fundamentada e condimentada com o que cada pessoa tem de melhor, ou do que ouviu na noite anterior de um autoproclamado erudito na matéria. No final da história a moral é sempre a mesma, e estamos longe das fábulas de Fontaine. Nestas existia uma moral a aprender, mas na história da sabedoria individual, carregada de eus indiscretos e perdidos no nada, há alvos a abater. Não há nada pior na sociedade actual do que pessoas que consigam manter-se à parte desta insana sabedoria popular e colectiva, que engloba muitos dos assuntos fracturantes da actualidade. Quem o faz, quem à margem do joio se ergue e rebenta na sábia ignorância de quem não conhece, procura respostas sem obstinações rápidas próprias da multidão, e é olhado com desdém por quem já sabe tudo o que deve saber. E o que me assusta às vezes, nem é só isto. É olhar para um sistema de educação que permite a alguns intervenientes perpetuar a continuidade deste conhecimento absoluto e irrefutável, ceifando a direito quem ousa questionar e procurar outras respostas. Como se estes inquietos não fossem o futuro, e como se quem nada questiona, não fosse a estagnação.

A boa notícia é que os espíritos inquietos nunca morrem.

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