domingo, 30 de junho de 2019

o trajecto

Percorro o trajecto para o trabalho devagar, escondida atrás de um transporte perigoso com combustível inflamável. Subo a serra ao encontro da história de uma menina perdida, que ambiciona que a vida futura lhe traga um curso perfeito, um trabalho perfeito, um marido perfeito, uma vida perfeita. As lágrimas que deita escorrem-lhe velozes, pronúncio de que os melhores dias da vida dela estão a ser engolidos depressa, pela sua boca e por vontades alheias, esquecidas de que o caminho é sempre o nosso maior encontro com a felicidade. Quem sou eu para matar sonhos. De resto, compreendo-lhe perfeitamente a necessidade da orientação definida, encaixada no padrão escolhido pela mãe, linda, esbelta, de sorriso estudado e fato engomado. Professora, digo para mim, entregue ao preconceito, obviamente antes de saber. Enganei-me por um triz, é dona de casa, a vida foi-lhe fácil, a única dificuldade parece ser tornar a filha, digna de ser sua filha. Nunca percebi ao certo o porquê da natureza ser tão madrasta para certas pequenas. Que desde cedo, muito além do rigor das etnias culturais, são prometidas a uma vida vazia de escolhas e de sentido, de liberdade e de avanço. Das duas uma, ou o grito surge depressa, difícil e condenado, ou o ciclo vinga sobre a sua capacidade de ser pessoa. E daí em diante será mais do mesmo: mais frustração, mais submissão, mais (im)perfeição e mais beleza estereotipada. A única perda será a genuinidade e a paz de ser o que ela quiser ser, um balanço tão óbvio quanto impossível de se ver. Não sei se me explico.  

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