domingo, 8 de setembro de 2013

da vida

O medo vê-se muito no rosto dos vivos doentes. De resto, o rosto é o único sítio onde se pode ver o medo. Na cara dos vivos doentes vêem-se medos que atravessam a pele cinzenta em ânsias por algum alívio, ainda que fugidiço. A doença terminal expõe quem a atravessa a um luto próprio, por expectativas que findam e por dias cancelados por uma força maior da qual se tem um receio profundo, residente ao lado da fraca esperança. Muitas vezes falsa. A esperança é uma confiança frágil e mortiça que por vezes renasce e nota-se nos olhos. É por isso que os doentes nos confundem o olhar perante um ar expectante e ao mesmo tempo assustado. Nem sempre o exterior age em consonância com a necessidade. Do lado de fora, um lugar confortável, acreditem, ousamos alternar a força com a fuga, uma auto protecção, uma defesa declarada. Somos humanos, achamos que temos direito a tudo. Não temos. Não há rigor cientifico, é certo, mas resta-nos a sensatez da retribuição trabalhada, e sempre, mas sempre, a presença. Não há nada que mais me repugne do que a fraqueza de quem foge ou desdenha os que estão na beira da morte. Até porque a morte é uma escola de vida. A cara dos que estão na beira da morte é o único local do mundo onde eu consigo ver a minha. Todos deveríamos vê-la de olhos bem abertos, senti-la, cheirá-la, saber como chega e como se instala, como nos come e como nos arrasta. Não há como o conhecimento para sabermos viver: quanto mais soubermos, melhor vivemos.

2 comentários:

  1. A morte, como o nascimento, não é assim tão normal. Afinal ambas só acontecem uma vez na vida do próprio. Embora muitas nas vidas dos outros.

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    1. Ninguém aqui a banaliza, Paulo, pelo contrário, tenho um imenso respeito por quem está próximo dela. Talvez por isso fale desta forma...

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