sábado, 30 de agosto de 2014

(...)

O amor é o final de um caminho que encontramos depois de nós próprios. Somos capazes de gostar sem saber quem somos, de nos apaixonarmos por sedução, de nos sentirmos atraídos por complemento, de apreciarmos por devoção. Julgo até que conseguimos percorrer uma vida sem nos procurarmos, que podemos trasladar montanhas sem nos encontrarmos, que somos capazes de procurar pela eternidade um rumo, sem o descobrirmos. Mas sendo assim nunca amamos. Um amor real implica solidão e encontro, necessita de fraqueza e de força, carece de retiro e pensamento, e só depois chegaremos à companhia da certeza. Jamais poderá ser uma mera projecção, será sempre um conhecimento, uma aceitação, um respeito a dois muito além de nós mesmos. Um amor real parece-me um caminho difícil que nem todos conseguem percorrer, daí a facilidade do suposto encontro e desencontro, do enamoramento enfeitiçado, do desprendimento rápido, da cómoda leviandade. 

quinta-feira, 28 de agosto de 2014

em escuta

Hoje fui ao rio. Crianças geladas saltavam para a água enquanto as mães as olhavam com cuidado do lado de forma, ao mesmo tempo que os maridos jogavam cartas numa mesa de pedra. Um homem a meu lado afirma entre-dentes que ser mãe é diferente de ser pai, e eu fico surpresa com a assumpção. Inquiro, exijo uma explicação que me satisfaça a curiosidade beliscada por uma figura alta e corcunda, cinquentona e triste. A natureza não engana ninguém, disse-me, mas eu insisti numa melhor explicação. O homem adulterou o mundo ao ponto de hoje tudo estar fora de sítio, prosseguiu tranquilo. Domesticou os homens, profissionalizou as mulheres, colocou as crianças fora do colo cedo demais. Não credito no homem, mas acredito na natureza. São as fêmeas que gestam, que parem, que amamentam e que cuidam. É assim com todos os animais. O pai complementa, eventualmente substitui, em caso de necessidade, mas o verbo cuidar não nos pertence. Tal como não é nossa a dor suprema do parto, ou o dom final do amor. 

( Gosto de ouvir quem pensa alto. Independentemente de onde estiver a verdade, que não pretendo descobrir.)

segunda-feira, 25 de agosto de 2014

pecado

Ontem abeirei-me de uma mesa de queijos como se de um manjar se tratasse. Agarrei num prato grande e abasteci-me das mais diversas qualidades, gostos e cheiros, enquanto uma fatia de pão bem grossa acompanhava o repasto. Sentei-me com calma e tranquilidade ao mesmo tempo que uma nesga de sol teimosa me atingia na cara, mas não lhe liguei grande coisa. Vazei meio copo de tinto para molhar a boca a cada mudança de paladar, e demorei-me naquilo uma boa hora. Soube-me pela vida, e fez-me repensar que a fartura é uma virtude francamente pouco recomendável. Há muito que não comia queijos e a espera valeu-me a pena, julgo ser capaz de aguardar mais um meses para tamanho petisco. É claro que não me apraz aproveitar a ideia para a generalidade dos prazeres terrenos, mas ainda assim levou-me a pensar que a avidez da ganância é um pecado bem mais danoso do que a simples satisfação de uma gula. Tudo é sempre relativo, até quando se joga ao pecado.

sábado, 23 de agosto de 2014

manhãs

Descobri há muito que sou do dia. Pertenço à claridade das manhãs, ao canto dos pássaros, ao sol nascente. Em tempos jamais transitava a noite em claro, contam-se pelos dedos de uma mão, se é que as houve. Nesse caso não duvido de que tenham sido por nobres e fortes motivos, raros portanto. Enquanto a juventude acordava a aurora com o barulho da festa, eu adormecia a madrugada, cedo, a horas decentes. Quis a vida e o destino que o trabalho apareça por vezes em horas tardias. Que o raciocínio tanja a perfeição depois do pôr do sol, que os ouvidos necessitem de estar atentos ao fim da tarde, que as palavras nasçam certeiras no inicio da noite, tudo exigências de carácter importante. Hoje, pela fresca, tudo parecia mais fácil. A arrufada escorregou lesta com o café, a senhora do botequim estava simpática, a praça ali ao lado cheirava a fresco e a flores. As palavras de quem falou percebiam-se bem, deveria ser do vento fresco que me entrava pela janela. As frases que eu proferia soavam na perfeição, certamente pela música clássica que se ouvia ao de leve. O raciocínio estava escorreito, apesar de ocupado, julgo que foi das gerberas, símbolo da pureza. À noite, por sua vez, tudo se conflui. A clareza de espírito tem, também ela, tendência a convergir com a disposição. Nem sempre o final dos meus dias é tão limpo como as manhãs. Diria até que nunca é.

sexta-feira, 22 de agosto de 2014

quinta-feira, 21 de agosto de 2014

é ver e aprender...



cumplicidade

Ontem peguei num livro na calada da noite. Folheei-o com cuidado e cheirei-lhe as páginas, olhei-o muito de perto e voltei a colocá-lo na estante que enfeita com particular delicadeza, é especialmente bonito. Lamentei porque não me leu, não conseguiu encontrar-me, as suas palavras não me atingiram no sítio exacto em que me apaixono. Aviso sempre todas as pessoas para que não me ofereçam livros. Os livros escolhem-me, não sou apenas eu a escolhê-lhos, são mais ou menos como o amor. No seguimento, podem até dizer-me que está sujeito a emergir de surpresa ou em aproximação desprevenida, mas não foi o caso. Uma noite de insónia é o teste perfeito para qualquer tipo de cumplicidade. Nascente ou sucessiva.

terça-feira, 19 de agosto de 2014

não há mulheres feias, há mulheres tristes

Não há mulheres feias, há mulheres tristes. Não me cabem discursos fundamentalistas sobre o universo feminino, mas preocupa-me o exagero do conceito estético como uma necessidade fulminante, na qual qualquer mulher deve caber. Ser mulher é muito mais do que um corpo, é muito mais do que um sentido, é muito mais do que o objectivo, cego, da perfeição. Ser mulher é todo um conjunto indefinível de conteúdos, princípios, meandros e fins, para os quais o corpo é um meio, independentemente de tudo o resto. Não deixarei nunca de ser mulher à medida que as rugas se instalem, que o corpo se canse ou que o cabelo ceda, mas sou capaz de quebrar, se permitir que o mundo me governe em nome de um padrão. Deixar que a sociedade mate a beleza que todas reunimos, é uma fraqueza. Sorrir para a vida no corpo que temos, uma das nossas maiores forças. 

segunda-feira, 18 de agosto de 2014

complexidades

( Imagem retirada de Psicopatos)

Tenho horas em que dou por mim a querer que um ser do sexo oposto me entenda. Seja ele filho, amor ou progenitor, amigo ou conhecido. Armo-me de intenção, escolho as palavras a dedo, alinho as frases de acordo com um raciocínio quase matemático, e deito cá para fora toda a explicação que me parece sempre entendível, compreensível, óbvia até. Nas primeiras dúvidas manifestas realinho tudo, dou a volta do avesso e experimento a questão da perspectiva, atalho caminhos, aligeiro arestas, opto por outros trâmites, posso até gerar novas etapas, tudo em prol da boa explicitação e do consequente entendimento. Normalmente, minutos depois de todo o esforço, volto a mim. Reitero que a nossa complexidade é um problema tão sério, que transforma a (magnifica) simplicidade deles num obstáculo.

sexta-feira, 15 de agosto de 2014

nada é por acaso

Encarando o sonho como um reflexo inconsciente, sou efectivamente obrigada a concluir que não há censuras que valham, ao nosso eu mais interno. Conseguimos reunir num mesmo local o sagrado e o profano, o medo e o desejo, o amor e o rancor. Talvez sejam eles, sonhos e inconscientes, a prova provada de que a sociedade mata a nossa natureza, ao mesmo tempo que nos coloca no patamar possível da existência. Nada é por acaso. 

terça-feira, 12 de agosto de 2014

tempos

Espreito uma porta encostada que se esconde à minha entrada com a vergonha de quem não se deixa invadir há muito. Insisto, encontro-lhe a chave debaixo do vaso do lado esquerdo, azul, povoado por uma terra seca e já sem vida. Rodo a fechadura com jeito e o clic permite-me sentir realmente o passado. Recuo uns trinta anos no tempo. Visto uma saia rodada e calço umas sandálias de tiras brancas. O gato Tareco brinca debaixo da mesa onde eu me sento a cozinhar massinha esparguete em água fria. Tentei atá-lo ao pé de mim e ao pé da mesa, mas ele esgueirou-se pela porta e renunciou ao pitéu que eu confeccionava com a delicadeza de uma senhora muito prendada. Carmina borda uns lençóis na mesa quadrada. Pergunta-me se tenho trabalhos de casa, se quero doce de tomate no pão, se a professora mandou algum recado. Tenho fome, claro. Como um papo-seco estaladiço e abalo porta fora, o cão Camões espera-me, cego de um olho, já sabe que dali em diante e até ser escuro é hora de passear. Volto sempre antes da ida ao leite. Gosto de ver Gertrudes apertar as tetas da vaca até que o púcaro se encha até ao fim, sou capaz de o levar à boca logo ali, mas o zelo impede-me, antes de tudo necessita de levantar fervura. Nestas coisas o meu pai está sempre do meu lado. Se ele já tiver chegado permite-me colocar o dedo na nata fresca e lambuzar-me sem que o fogão mate o que quer que seja, nunca adoeci da barriga por tal deleite, e se foi o caso já me esqueci. Num instante volto ao presente. Talvez porque o silêncio incómodo do vazio faça ranger muitas tábuas, faça estalar muitos móveis, deixe os ratos correrem o soalho, por baixo dos meus pés. Ainda arrisco abrir umas gavetas, ainda ouso espreitar a fotografia pendurada na sala de jantar, num golpe de sorte encontro uma caixinha de madeira que guardava os alfinetes e que lá dentro, tem um mundo enorme. Não destapei o fogão coberto pelo pano velho, não abri o guarda-fatos onde os vestidos se emparelham por cores e onde o espelho reflecte saudade. Por querer levantei um pano que me deixa a descoberto a máquina de costura. Dezenas de carrinhos de linhas encontram-se arrumados, devidamente ordenados, prestes a morar ali para sempre. Do lado de fora, um tempo depois, alguém arrisca dizer que tem de se dar a volta ao lixo. Nunca percebi bem a noção exacta que as pessoas têm de desperdício. Desperdício é um resto, e uma casa vazia de pessoas não é resto nenhum, penso para mim. Em seguida percorro a aldeia com os olhos. As casa fechadas, os restos, os desperdícios, tantos lugares já sem gente. Daqui a um tempo estarei no futuro, e nesse dia que há-de vir, toda a casa e toda a memória estará arrumada. Nunca morta, jamais apagada, meramente arrumada. Por ora e em mim, há muito passado e outro tanto presente. O tal futuro parece sempre tão longe, mas dizem que virá.

segunda-feira, 11 de agosto de 2014

natalidade

No centro de saúde apinham-se velhinhos e um deles profere que não há descendência suficiente para os substituir. Os outros anuem com a cabeça, os mais novos dizem que sim com a boca, não há dinheiro, há vida profissional, o governo não ajuda. - Mentira, o governo instituiu há pouco um subsídio, diz alguém, pouca coisa, mas não deixa de ser um incentivo. Oiço tudo aquilo e mantenho-me calada. Sei da conjuntura, sei da crise, sei do trabalho em demasia e do dinheiro diminuto, mas ter ou não filhos não passa só por aí. Há uns anos atrás ter filhos fazia parte da cultura e da família, as pessoas casavam (mesmo que depois se divorciassem), e o dois era o número perfeito que ditava a ordem, mais um menos um, dependendo da vontade, da possibilidade, às vezes da sorte que se seguia a um erro de cálculo do calendário fértil. Depois começámos a era da evolução e da diminuição da importância da família e dos valores. Basta olharmos os cartazes da publicidade e as revistas da moda, para constarmos que as criancinhas estão excluídas dos restaurantes de luxo onde se ouve jazz e se degusta gourmet, das férias de sonho onde se fotografam mares infinitos num sossego possível apenas a dois, das carreiras de sucesso onde o tailleur só assenta às esbeltas que também não têm olheiras, que não são interrompidas a meio de uma reunião importante pela professora da escola, e que podem trabalhar sem interrupções de infantários insistentes ao menor sinal de febre, conjuntivite, virose ou estomatite aftosa.  O elixir da felicidade de hoje não é liderado por criancinhas, é encabeçado por dinheiro e viagens, paixões e vontades, carreiras e vocações, menos família, mais individualidade, menos conjunto, mais indivíduo, menos nós, mais eu. A dedicação ao outro está frágil há muitos anos, a realização pessoal depende mais do próprio umbigo do que do nascimento e do crescimento dos filhos, o ginásio é um local de culto onde se passam longas horas por dia, a cozinha um lugar de onde se foge a não ser aos fins-de-semana, nas noites longas de amigos, a dissertar sobre o futuro da sociedade que ninguém sabe onde irá parar, sem sopa, sem sujidade, tudo soft e muito clean. Não tenho nada contra este tipo de perspetiva. Não me incomoda de forma alguma a preservação da individualidade de cada um e de cada qual, não me perco a discorrer sobre as vantagens ou desvantagens de se ter filhos ou não, é uma questão pessoal, e como tal liberta de avaliações e juízos de valor, pelo menos da minha parte. Só não me parece ser tão simples como querem fazer parecer as análises que atribuem a diminuição da natalidade à falta de recursos do país e à culpa das políticas. Será também por isso, mas vai muito além disso.

Talvez um dia. Talvez um dia se reequilibre isto tudo.

quinta-feira, 7 de agosto de 2014

confiar

Sou da opinião de que no mundo deveria existir um compêndio emocional. Não uma brincadeirinha como o DSM, onde se colocam apenas as perturbações, meia dúzia de folhas, uma miséria que tapa os olhos à necessidade e que se centra na patologia declara, esquecendo os intervalos, os intermeios, os estados mornos do sentir, que muito embora equilibrados têm que se lhe diga. Um compêndio, o que era necessário era um compêndio com todas as formas possíveis de expressar a emoção de tudo o que nos acontece e de tudo o que acontece aos outros, uma ferramenta que esgotaria num ápice, dado o proveito revelado. A mim, por exemplo, faz-me uma falta tremenda perceber ao certo o que sente o velho que ontem deixou a casa de sempre, o café da vida, a esquina dos ventos do norte (o norte faz-nos sempre tanta falta), a horta cultivada na hora ditada pelo borda d’água, o livrinho que orienta  quase tudo quando a terra produz. Faz-me falta saber como se encontra hoje, na companhia da esposa de todos os anos, quando de repente (a velhice acontece sempre de repente), se juntou à comunidade onde agora reside, a comer ao lado de quem nunca viu, a escutar os gritos de quem já enlouqueceu, a solicitar ajuda à menina que o olha e lhe descobre a nudez do corpo. Faz-me falta sentir o que pensa o meu filho quando lhe imponho a regra da educação. Quando o ensino que deve ser correcto mesmo quando algum outro membro do grupo não é, quando lhe explico que intervir e reagir, sim, sempre, mas no limite da civilidade, sempre sempre do lado de cá. Faz-me falta perceber o que sente o enfermeiro a quem é exigida a clareza perante a morte, a competência perante a doença, a ligeireza perante o horário excessivo de trabalho, o ordenado magro e os anos de serviço, cada vez maiores e cada vez piores. Faz-me falta saber o que é o outro lado da educação. Qual o papel e o sentir do professor invadido, do professor avaliado, do professor excluído e do professor cansado. Faz-me falta, uma falta imensa conseguir olhar para os outros e saber o que lhes vai na alma, não por curiosidade, mas por compreensão. Se no mundo todos colocássemos num livrinho de bolso o que sentimos ao longo do tempo, se registássemos os medos e as certezas, as dúvidas e as ansiedades, as dores e as felicidades, no fim de uma vida estaríamos perante um precioso manual de orientação (não de instrução, claro, nunca de instrução), onde por certo caberia tudo quanto pode haver, devidamente organizado alfabeticamente, tematicamente, por estados de dimensão e de existência. Por consultá-lo e acolhê-lo, haveria de ser bem mais fácil a harmonização da humanidade, a partilha dos recursos e o respeito pelas diferenças necessárias para a continuidade disto tudo. Assim, cada um na sua, e temos a intolerância e a ignorância, até porque, valha-nos Deus, não conseguimos crer nem confiar. Nem, pior ainda, fazer crer ou confiar. 


quarta-feira, 6 de agosto de 2014

gosto do MEC, mas por vezes não sei onde morar (como é linda a puta da vida)

Descubro momentos felizes em todos os dias da minha existência. É linda, a vida é linda a toda a hora, quando acordamos de manhã, quando miramos a rua, quando levantamos o corpo na direcção do objectivo (se o houver). É linda quando cheiramos o verão quente, quando espreitamos o Inverno, quando devoramos chocolates e escutamos o amor da poesia (ou a poesia do amor, o que não é bem a mesma coisa). É linda quando queremos e quando escolhemos, quando caminhamos contra ao vento ou a favor, dependendo da circunstância e do barco que governamos (ou desgovernamos, depende, há horas em que um barco desgovernado é todo um programa onde eu quero estar). É linda nos momentos e é linda nas noites cheias, é linda nos ensinamentos e nas aprendizagens, é soberana na beleza da natureza que parece desenrolar-se, fluída, em sucessões prováveis que permitem para sempre a continuidade da humanidade (até quando haverá isso tudo?). É linda nas contrariedades. Aprecio quando me testa, quando me põe à prova, quando me coloca objectivos quase impossíveis, tarefas quase impensáveis, montes improváveis de escalar, e rios perigosos de atravessar (ao mesmo tempo que me segreda ao ouvido, em surdina, -anda, só mais um esforço). Nessas alturas, quando o mundo se une a favor ou contra, depende de nós, da nossa força de braços e da nossa forma de sermos, de intervirmos ou de deixarmos correr, de optarmos ou de deixarmos acontecer, enquanto nos deitamos, sossegados, num regaço (um regaço para mim será sempre um avental). Pior, é quando tudo se une em sentidos inverso. É quando a atmosfera não flui, é quando os desencontros se mostram em potência, é quando a realidade se assoma contra tudo e contra todos, é quando a razão nasce em cada qual, sem elos mais fortes ou elos mais fracos, sem frestas perigosas que façam ruir a verdade, sem vencedores e sem vencidos. É quando a inevitabilidade do mundo se instala, é quando o fado acontece, é quando a miragem se confunde com o deserto, que a vida não é tão linda quando eu gostaria que fosse. Gosto do MEC, gosto muito. Mas por vezes, tantas vezes, não sei bem onde morar (como é (linda a) puta (d)a vida).

terça-feira, 5 de agosto de 2014

tudo o que eu te dou

Os caminhos são sempre um desafio. Um desafio é uma incógnita, sabemos lá para onde nos penderá o corpo, sempre ignorante (e ávido) de futuro. A ignorância é por conseguinte uma constância na nossa vida, por muito que saibamos, por muito que ambicionemos. O passado é aquilo que já foi, certo, mas também tem como função o ensino. Afasta-se da ignorância para entrar no âmbito do conhecimento, haverá riqueza maior que possamos encerrar? Não creio. No meu encontro conquistas e encontro vitórias, mas também encontro erros e más decisões. Das conquistas e das vitórias guardo os lucros, dos erros deverei guardar os ensinamentos que a vida me deu? Certamente, mas por vezes esqueço. Hoje, por exemplo, encontrei um para engrossar o admirável livro da falha: julgar intentos é como jogarmos uma roleta russa, cravejada de opções. Do outro lado há o efeito momento e o efeito surpresa, o efeito circunstância e o efeito ocasião, entre dezenas de outros efeitos, alguns deles em permanente fusão. Crer de forma suprema na nossa opinião e expectativa, é tão falível quanto uma noite inteirinha de casino. 

(Só tive uma em que ganhei à séria: no de Lisboa, só eu e uma multidão, com o Pedro Abrunhosa ao piano a cantar o mais extraordinário " tudo o que eu te dou". Há momentos maiores do que um mundo, mesmo que não consigamos ver os olhos de ninguém.)




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