domingo, 9 de dezembro de 2012

O Senhor Zé comprou uma vez uma cadeira de massagens interessantíssima, onde ele se sentava todos os dias sem excepção, com o intuito de massajar as costas arrumadas pelo tempo, as pernas retorcidas pela fraqueza dos ossos, os músculos contraídos pela falta de magnésio, nunca tomou o suplemento, achou sempre que não era preciso. Trabalhou uma vida como engenheiro mecânico, aturou cães, gatos e pouca gente, não estava para isso, as pessoas tiravam-no do sério, as mulheres davam-lhe cabo da paciência e as vizinhas chegavam para que se consciencializasse a cada dia que o melhor era manter a solidão ímpar que conhecia desde sempre, a única onde encontrava um estranho conforto sem pés aquecidos, sem chás quentes adocicados a bolos, sem camisas engomadas a preceito, borrifadas com lavanda ou ornamentadas com lencinhos no peito. 
Depois e assim de repente, sem justificativas ou fundamentos que se vissem, começaram a surgir-lhe no caminho umas gentes simpáticas, pessoas que a troco de dinheiro lhe traziam para casa utilidades sem fim, desde panelinhas aptas a cozinhar sozinhas, a aspiradores que limpavam em profundidade e com eficácia comprovada, passando pela referida cadeira, isto entre outras coisas que lhe deixavam à porta sem ser preciso que ele saísse de casa, se deslocasse ao local da compra e acarretasse com as ditas, e saber-se-ia lá como, uma vez que todas as diligências eram de quem tão cortesmente lhe oferecia as oportunidades de negócios, do melhor que havia no mercado, e sem qualquer tipo de constrangimento. 
O Senhor Zé que não era cá de modas adquiriu tudo o que os euros disponíveis lhe permitiram comprar, umas centenas segundo oiço dizer, e armou-se de verdadeiras preciosidades, quase todas ainda encaixotadas e para sempre paradas, que se arrumaram à espera de existirem na dispensa da casa, já vazia de tudo menos do gato Sebastião, um matulão preto de olhos verdes com ar de poucos amigos que passa os dias a comer ração e a dormitar dentro das diversas caixas de cartão. Ainda ninguém o conseguiu apanhar, que segundo consta costuma virar-se a quem chega perto. Mete respeito, ordem na casa, e vida, muita vida, onde tudo o resto já morreu.  

(O mundo é um local escabroso para existir em determinadas alturas. Uma delas é o principio, a outra é o fim, o que só pode provar que a verdadeira existência deve de estar algures pelo meio. Depois ainda poderemos ter sorte, é um facto, mas isto de eu continuar a acreditar que a vida também é um jogo de azares, mete-me um medo do caraças.) 

4 comentários:

  1. Já ouviste falar no Dilema do Prisioneiro? Pois a Vida não está muito longe disso. Um jogo de soma nula, já não é nada mau... Bjos!

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  2. Assusta-me, sabes?? Engraçado lembrares o Dilema do Prisioneiro... Não está muito longe, não. E é uma treta, olha, é o que é... Beijos para ti também :)

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  3. Não conheço esse dilema, ou não me recordo dele. Está na hora de investigar :) Gostei muito do texto, para variar :):):)

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  4. Tem a ver com uns prisioneiros e a sua pena. Se se aliarem conseguem uma pena menor para ambos, se ficarem cada um por si, podem ficar mais tempo, ou não ficar tempo nenhum... É qualquer coisa parecida com isto.
    (Obrigada :):)

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