Chega-me sempre com um ar de vitória farta, daquelas que nos alimentam o ego como uma feijoada nos trata da gula, e cheinho de prosápias insólitas, grandes o suficiente para que não caia por terra nos próximos anos, ainda que a sua jactância não seja mais do que uma mera nica de coisíssima nenhuma, que ele aumenta para seu belo prazer, possivelmente crente de que é de facto maior. Armo-me de paciência, engulo devagarinho e de vários goles as sapiências que emana de si, aceno com a minha cabeça insistentemente e sem ouvir quase nada, olho de frente, não vá achar-me em desinteresse e esqueço quase tudo no limiar de um segundo, o grande pecado que me permite continuar a ouvi-lo como se de uma sumidade se tratasse. Hoje insistiu a fundo. Explicou-me por A mais B os pormenores de funcionamento de maquinaria diversa, fez questão de me dar a conhecer o que toda a gente já sabia, de descobrir o que há muito já lhe foi dito, de enunciar os pontinhos todos que percorreu até conseguir, por obra de mérito, resolver a séria problemática quase impossível. De vez em quando tem por hábito arquear os braços e girar os dedos em torno da testa, ao mesmo tempo que faz uma estranha pausa, como que em pensamentos profundos, capazes de comandar. No final de tudo, conversa e gesticulação adjacente, confesso, já estou normalmente enojada. Já não consigo muito bem disfarçar o enfado, continuar a engolir para dentro de mim vaidades inconvenientes, fingir que me encontro defronte a um qualquer ser dotado de inteligência maior. Hoje hesitei no que fazer. Pensei ser este o dia em que da minha boca sairia um chorrilho de palavras arremessadas ou umas faiscas dos olhos capazes de matar gente, mas acabei por respirar fundo e por o convidar para a festa do Natal, uma tábua de salvação, ou certamente não se calaria nunca, tal o empenho da dissertação. Ele disse que sim, claro, poderíamos até precisar dos seus préstimos. Anui com a cabeça e confirmei. Há sempre tanto para fazer. Carnes para panar, pratos para enfeitar, teatros para representar, músicas para cantar, fraldas para mudar, famílias por receber.
LOL... nada como um certo conhecimento da psique alheia :)
ResponderEliminarPaulo, tenho dias em que dá jeito. Partilharia contigo o que sei, que não é muito, se achasse que precisarias. Mas não é o caso, portanto... :)
EliminarGabo-te a paciência :) ultimamente tem-me feito tanta falta!...:(
ResponderEliminarTambém me falta muitas vezes, acredita. E isto, é treino. E o treino vê-se por fora, mas custa por dentro :)...
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