sábado, 8 de dezembro de 2012

Grandiosidades

Chega-me sempre com um ar de vitória farta, daquelas que nos alimentam o ego como uma feijoada nos trata da gula, e cheinho de prosápias insólitas, grandes o suficiente para que não caia por terra nos próximos anos, ainda que a sua jactância não seja mais do que uma mera nica de coisíssima nenhuma, que ele aumenta para seu belo prazer, possivelmente crente de que é de facto maior. Armo-me de paciência, engulo devagarinho e de vários goles as sapiências que emana de si, aceno com a minha cabeça insistentemente e sem ouvir quase nada, olho de frente, não vá achar-me em desinteresse e esqueço quase tudo no limiar de um segundo, o grande pecado que me permite continuar a ouvi-lo como se de uma sumidade se tratasse. Hoje insistiu a fundo. Explicou-me por A mais B os pormenores de funcionamento de maquinaria diversa, fez questão de me dar a conhecer o que toda a gente já sabia, de descobrir o que há muito já lhe foi dito, de enunciar os pontinhos todos que percorreu até conseguir, por obra de mérito, resolver a séria problemática quase impossível. De vez em quando tem por hábito arquear os braços e girar os dedos em torno da testa, ao mesmo tempo que faz uma estranha pausa, como que em pensamentos profundos, capazes de comandar. No final de tudo, conversa e gesticulação adjacente, confesso, já estou normalmente enojada. Já não consigo muito bem disfarçar o enfado, continuar a engolir para dentro de mim vaidades inconvenientes, fingir que me encontro defronte a um qualquer ser dotado de inteligência maior. Hoje hesitei no que fazer. Pensei ser este o dia em que da minha boca sairia um chorrilho de palavras arremessadas ou umas faiscas dos olhos capazes de matar gente, mas acabei por respirar fundo e por o convidar para a festa do Natal, uma tábua de salvação, ou certamente não se calaria nunca, tal o empenho da dissertação. Ele disse que sim, claro, poderíamos até precisar dos seus préstimos. Anui com a cabeça e confirmei. Há sempre tanto para fazer. Carnes para panar, pratos para enfeitar, teatros para representar, músicas para cantar, fraldas para mudar, famílias por receber.   

4 comentários:

  1. LOL... nada como um certo conhecimento da psique alheia :)

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    1. Paulo, tenho dias em que dá jeito. Partilharia contigo o que sei, que não é muito, se achasse que precisarias. Mas não é o caso, portanto... :)

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  2. Gabo-te a paciência :) ultimamente tem-me feito tanta falta!...:(

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  3. Também me falta muitas vezes, acredita. E isto, é treino. E o treino vê-se por fora, mas custa por dentro :)...

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