quarta-feira, 9 de outubro de 2013

infertilidades

Espanta-me a leviandade com que pessoas escrevem livros. Aceito artigos de opinião, ensaios de pequenos textos, blogues, revistas, palavras seguidinhas com um propósito específico de carácter diverso, mas livros são outra questão. Um livro é um conjunto de folhas reunidas onde as palavras se encaixam para um propósito unipessoal, destinado a cada leitor que se deixe desafiar. É um aglomerado de factos, ideias ou histórias com capacidade para sacudir o mundo que nunca mais ficará exactamente igual, perante a novidade. É um conto fantástico e impossível narrado ao pormenor do detalhe, e deixem-me referir-vos aqui as intermitências de Saramago, não há exemplo melhor. É um encaixe encadeado em personagens inventadas mais próprias do que a pele que as escreve, por dentro e para fora. Quando pegamos num livro folheamos e cheiramos as folhas, olhamos a lombada, espreitamos o prefácio e a partir daquele exacto momento sabemos que a história também nos pertence. Em conclusão, um livro oferece imaginários, e oferecer imaginários é uma responsabilidade. A ligeireza com que hoje se vendem histórias só é comparável à maternidade imprudente. Mães que não são mães geram o corpo mas não geram a alma crescente, deixada sozinha ao Deus dará deste mundo. Não sabem o cheiro, não conhecem o choro, perdem a essência e não acodem aos medos. Em ambos os casos deveria reinar uma certa infertilidade.

4 comentários:

  1. Ah.. que bela e grande frase final, Carla. Subscrevo, of course. Olha, e a mesma leviandade existe em pessoas que se dizem devoradoras dos livros, do género dizerem que leem sempre e muito. Leem, é certo, mas muito do que não interessa e que não as faz crescer em alma nem evoluir. Conheço tantos exemplos...
    Beijinhos *****

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    1. Também eu Fátima, também eu... Beijinhos, bom fim de semana :)

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