sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Sinos

Todos os dias passo na beira da igreja. Umas vezes oiço o sino, outras vezes não, que as horas, são coisa para não me preocupar em demasia, sendo que já lá vai o tempo, em que as ditas me controlavam os passos, que se dariam mais rápido ou mais devagar, numa total subjugação da qual me fartei. Nem sei se foi por organização, se por desleixo, estranha dúvida esta, pelo carácter oposto onde se insere, pelo que passo a explicar. Se pela melhor organização do meu tempo, facto que detenho como verdadeiro, se por um menor rigor e fixação à perfeição, ou seja, algum desleixo, facto também ele real. De qualquer forma, nem bem importa a catalogação das minhas acções, importa-me sim, a paz de espírito que consigo com elas, pelo que esta coisa das horas, e do desprendimento que lhe faço sempre que tal me é possível, é coisa para me deixar deveras agradada. Não me julguem cá um inveterada incumpridora, que tal não se verifica, que a ter de cumprir, cumpro e com muito gosto. Deleito-me porém nos incumprimentos, que me são possíveis aqui e ali, e dos quais me aproveito tal e qual como de um rebuçado recebido. Hoje ouvi o sino das dez. Toca exactamente dez vezes seguidas, num toque seco e sem graça, isento de qualquer pausa ou melodia. Ainda que distante em sítio e em procedimento, faz-me sempre lembrar o sino da igreja da terra, que, e muito embora não tocasse diariamente, tocava em ocasiões especiais, ou seja, em dias de missa, dias de festa, horas de nascimento ou horas de morte. Para cada acontecimento, um diferente som, que não assumia sequer qualquer sinal de tristeza, mesmo que fosse caso disso, pelo que todas as melodias se faziam docemente ecoar, como um agradável instrumento. Até ao dia em que descobri ser Dona Fátima, a Senhora que zelava a capela, a responsável pelo tocar do sino, julguei-o algo de mágico. Sabia sempre de ante mão o que se passava na aldeia. Desde aí, altura em que a desilusão me atingiu, que não lhes ligo importância alguma.

1 comentário:

  1. Desde que deixei de me preocupar com horários ( continuo a ser pontual nos encontros) sinto que passei a produzir mais e melhor. Nada como recusar a escravatura do relógio ( que já não uso) para nos sentirmos mais livres e criativos.
    Bom fds

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