quinta-feira, 15 de novembro de 2012

(...)

Há muitos dias em que me canso. Canso-me das palavras brandas, dos olhares vazios, dos intentos impressos em dizeres que se apagam antes do próximo respirar, da espera dos afagos que se prendem a quilómetros de distância, ainda que nos meandros se esfalfem, bofes de fora, pernas corridas, para que cheguem rápido à beira de mim. Há dias em que me farto dos velhos que morrem devagar em cadeiras de costas direitas, que vivem os dias e as horas ao rigor do segundo, que esquecem que o tempo é aquela grandeza completamente indexada ao sentir, ou seja, para eles é muito, para mim é coisa nenhuma. Ou vice versa, depende. Há dias em que me canso das razões absolutas que nascem de gente igual a mim que não tenho nenhuma, mas que lhes sobem garganta acima com veemência, para destilar a sete ventos, como se o homem já tivesse descoberto tudo o que há para descobrir. Há dias em que me farto de mim e das minhas fraquezas, pequenas brotoejas que me comem por dentro com uma voracidade de leão, e que pungem um liquido fétido que eu deixo escorrer pela pele, pelos olhos, pela boca, sem que ninguém prove, ninguém sinta, ninguém cheire. Há dias em que não queria o mundo tal e qual ele é, com vontades guardadas por celas perfeitas impostas pela vida, coisa que não se vê mas que pode mais do que tudo o resto que possamos conhecer, que manda e desmanda nos corpos que caminham em filas seguidinhas rumo ao sítio que desconhecem mas que querem muito, por vezes esquecidos de que basta ela não querer. Por vezes canso-me, só isso. E canso-me ainda mais quando a impotência me arruma com os pés para o chão, quando oiço os discursos da calma e da sensatez, pequenos nadas, míseras palavras mortas e apagadas pela minha vontade, acesa, fugaz, peremptória, mas ao mesmo tempo tão miserável.

( mas depois há outros. quando as horas inquietas me aproximam do abraço esperado que nunca mais vinha, quando nuns olhos apagados encontro esgares de luzes arrancadas de coisas tão pequenas como nada, quando o meu filho me sorri e me conta as histórias do dia. e parece-me tudo tão fácil que até arrepia.)  

4 comentários:

  1. Só há uma coisa que me cansa a sério: a estupidez. O resto passa e fica ou não, mas passa.

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  2. A mim, ainda me cansa muita coisa para além da estupidez. Mas essa é má, de facto, muito má...

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  3. Percebo-te tão bem :) Infelizmente, ultimamente, mais os dias de cansaço do que os outros :( Não sei se andas inspirada. Li-te de cima para baixo e acho que estás a escrever cada vez melhor :)

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  4. Antígona, se assim é, é hora de inverter...:) ( Ando inspirada, é isso. Mas não é melhor. Se calhar é mais leve...)

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