terça-feira, 30 de agosto de 2011

Retratos

No meio de umas casas novas, acabadinhas de fazer por entre uns areais recentemente descobertos, passeia-se, regalada com tamanho presente, dado por uma vida retraída, e quase sempre avarenta. Nem bem percebe de onde lhe surgiu tal regalia, sabe porém que o melhor, é sorver o que o seu corpo conseguir armazenar, sob pena de um dia, e de novo entregue às agruras, não ter sequer o que lembrar. Há muito interiorizou que as dádivas do mundo são servidas em jeito doseado, umas vezes muitas, outras nenhumas, sendo que esta capacidade de guarda, tem-lhe valido de grande ao coração, pobre músculo ressequido, que bebe muito de quando em vez, e se aguenta no resto do tempo, que é muito. Iniciou o primeiro passeio de madrugada, que a aurora traz-lhe força, mais desperta nesta horas. Passeou-se por entre as casas branquinhas de riscas azuis, com chaminés terminadas em arrebites, nunca houvera visto nada assim. Do meio do nada, nasciam edifícios sem fim, a urbanizar um terreno agreste e selvagem, com vista a que o Homem possa verdadeiramente deleitar-se, naquelas praias de areia fina e águas calmas. Ali pode banhar-se sem ninguém a ver, até porque, nenhuma pontada lhe afecta o costado, já velho e esburacado, que se aguenta com o morno da água. Fosse-lhe assim morna a vida... Um dia encontrei-a a sorrir, por entre poças de água parada, no meio de rochas e caranguejos. Não esperava ver-me, mas não se intimidou, continuando com uns abanicos de mãos, idênticos a uma criança feliz. A felicidade das crianças é diferente das dos adultos, já sei disso. Podemos ser infinitamente felizes enquanto gente grande, mas ainda assim, sempre e só na ausência da ingenuidade. Ficou-me em forma de um retrato, mais presente do que muitos verdadeiros, para onde tenho de olhar, a fim de os rever.

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Viagens

Lá num alto, muito acima da minha cabeça, repousavam os coelhos. As coelheiras, dispostas em filas, viviam dentro de um barraco de madeira construído para o efeito, comido devagarinho pelo sol e pela chuva, que pareciam dele alimentar-se, como se disso carecessem, para se assumirem grandes e fortes, pobres de nós que sob eles vivemos, submissos. Mesmo ao lado, o galinheiro, rodeado de uma rede larga e redonda, acomodava os frangos brancos e gordos, que se degolavam quando estavam capazes para isso, dois meses volvidos do nascimento, mais coisa, menos coisa. Nunca assisti à operação, embora tenha visto com frequência a dos coelhos, um espectáculo pouco recomendado, mas que na época, soava a banal. Um murro no lombo, o pobre esperneava, e pouco depois era amanhado, enfiado em vinho e alhos, e no dia a seguir na panela. Não podiam esquecer-se de retirar o fel, um pequeno pedaço de fibra verde alojado no fígado, que se deixado, largava um amargo forte e intenso em todo o cozinhado, que ficaria de imediato inutilizado, deitando por terra todo o preparado, desde a matança, até ao tacho, passando pela incredulidade da expressão dos meus olhos, ainda pequenos. Por detrás das casas da bicharada, ervas cresciam todas misturadas, sendo preciso algum tacto na colheita, a fim de se apanharem apenas as apropriadas, não fosse o descuido acontecer, e deixar os pobres coelhos envenenados. Eu, gostava especialmente de lhes tirar as caganitas, em forma de azeitona, duras e abundantes. Os frangos, esses, ingeriam uma pasta de farelo e couve migada, misturada com outros restos de comida de sobejo, todos remexidos num alguidar de barro especialmente destinado ao efeito, riscado de verde e laranja, envernizado por fora e muito brilhante. Tudo isto, se dava na casa da minha bisa, território do qual já só existe o sítio. Hoje, no Alentejo, ainda que ao de longe, vi cenários quase iguais. Não trouxe um coelho, mas veio um pão. Cheira a fermento e atenta-me a alma.

...

A propósito, e apenas para que não julguem que não posto fotos por me estar a armar aos cucos, aqui me confesso. Ingeri, sofregamente, umas bolas de Berlim, que por ora repousam em mim. Ando a ver se as bano, mas as malvadas gostaram do sítio. Outra coisa foram as conquilhas. Farta de ouvir falar nelas, nunca as tinha provado. São pequenas e inofensivas, ao invés do pão alentejano que de seguida se esfrega no molho. E pronto chega.

Do perdão...

Os dias de descanso já foram. Poucos mas bons, mas poderiam, a bem ser, ter sido mais. Não sou muito apologista de postar fotos de alapansos ao sol, coisas minhas, mas respeito muito quem o faz. Ao invés disso, vou falar de uma cronica fantástica escrita pelo Pedro Mexia no Expresso. Fala da Noruega, do atentado e da capacidade de perdão. Assim, dito desta forma, pode até parecer ridículo, assumo, mas podem sempre ir lê-lo, que ele explica-se bem, como sempre, aliás. E transporta-nos para outros perdões, uns mais perdoáveis do que outros. Pegando no tema, confesso que o penso inúmeras vezes. Não aliado a acontecimentos de grande porte ou consequência, como trata o referido, mas aliado ao nosso dia a dia, de todos os dias. Esperamos muito, damos quase nada, cobramos de mais. Perdoamos pouco ou perto disso, que nos cremos detentores de uma qualquer superioridade interna, que nos julga capazes de julgar, de criticar, de exigir, de sentir forte, quando nos atingem. Agimos tão pouco no perdão. Eu própria me confesso, como deixar de fazê-lo, se pouco tolero o que de mau me fazem, apenas porque não o faço eu. E de que me serve, pergunto em pensamentos, tal atitude? E o que recebo, se ao invés de aceitar as limitações alheias, as condeno e as critico, sendo isso o que faço, ainda que internamente, quando me afasto, ou quando desinvisto? E tem sido tanto, como provavelmente sempre será, no decorrer de toda a minha vida, que se há coisa que apanho amiúde, são defraudes, esperanças vãs, amargos de boca. Não perderei com isto evoluções, de gente que ao consciencializar erros e falhas, cresce e emenda, o que em tempos realizou? Tenho por perto. Pessoas para as quais olho com olhos defensivos, metidos para dentro de mim, protegidos por um eu já atingido, como todos os eus, incapaz de perdoar mesmo a sério, talvez até seja medo. E não deveria eu olhar para o mundo com uns olhos brandos, iguais e sempre novos, como se a cada dia, uma nova pessoa pudesse nascer? E aceitar que a envolta me protege ou me desampara, subjugada a um conjunto de factores, sempre presentes e sempre diferentes, de acordo com circunstância? Arrisco umas respostas, fracas que sejam, que não mais do que isso podem ser, perante tamanha delicadeza. Ganharia mossas, mais ainda, tenho isso por certo. Ganharia porém mais esperança, que com toda a certeza existe também em quem já me falhou. Arrisco dizer que o perdão, é uma ambição desmedida, inatingível a quase todos, parece-me. Arrisco também acreditar, que na fraqueza do Homem, ou lá chegamos, ou nunca veremos tudo. Nunca veremos tudo, eu sei. Gostaria então de conseguir ver, apenas um pouco mais além.

terça-feira, 23 de agosto de 2011

...

Vou até aqui, que bem preciso. Até daqui a uns dias.

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

...

Sabemos o que é estar na iminência de um colapso cardíaco, quando nos telefonam da Volkswagen, e nos dizem que temos a módica quantia de três mil e quinhentos euros para pagar, se quisermos a máquina a andar de novo. A máquina, que é como quem diz. A maquinazinha. E nos entretantos respiramos fundo e a coisa não se restabelece. E respiramos mais e começamos a acalmar um bocado, que não é assim muito, mas que permite sorver o ar compassadamente. E antes que me digam, a julgar que me acalma, que existem desgraças maiores, não o façam, que eu sei disso muito bem. Mas ainda assim, dispensava esta, que é a modos que chata, incómoda, inconveniente, desnecessária, entre outras que agora nem me ocorrem. No meio disto tudo, e a ver se relaxava, comi um gelado de chocolate que me caiu mal. E agora, estou com azia.

Férias

Eram férias. Todos os dias pela manhã, rumavam as duas para o telheiro, muito velho e descaído, que guardava o tanque da água, diversos utensílios que serviam a horta, carregadinha de batatas e abóboras compridas e doces, os aranhões gordos que habitavam nos buracos da parede, e o baloiço de corda e madeira escura. Dependurado nas vigas grossas e redondas, muito carunchosas, o pobre abanava de cada puxo toda a estrutura, deixando antever uma desgraça iminente, daquelas que hoje constituiria sério perigo, mas que antigamente, parecia nem se ver, a par e a passo com as brincadeiras na estrada, em cima de paletes de tábuas quadradas, e junto de poços de água, redondos e fundos, onde as pedras faziam plooc, e os sapos croaac. Era frequente o dia ser passado naquilo, provavelmente intercalado com um passeio de bicicleta, ou até, e em dias de sorte, na carroça do burro do Tio Zé Pio, um homem velho e grisalho, muito gordo e paciente, que se fazia acompanhar de sua esposa, a Dona Ana, atamancada invariavelmente em lenços cinzentos atados no pescoço, que afagavam a bata florida que terminava exactamente ali, no cimo das costas. As golas eram assim presas com força, não fosse entrar alguma ponta de ar destemida, que penetrasse por baixo da roupa e lhe entrasse para o corpo, coisa essa capaz de a levar à cama, por mor de uma pneumonia. No quintal deles, existia uma pequena talha de cimento, com água até ao cimo, onde centenas de girinos nadavam, mesmo ao lado do forno do pão. Num enorme alguidar de barro, o amasso era feito a preceito, para logo depois, entrar para dentro daquele forno encardido e com cheiro a fumo, que nos trazia cá para fora, em lugar da massa crua que engolia, um pão macio e gostoso, que era barrado logo ali com manteiga primor.

O meu filho, nunca andou num baloiço de madeira, nem viu pão a sair do forno. Já viu burros, mas nunca andou de carroça. Não anda perdido no meio do batatal, nem tampouco viu girinos. Viu outras coisas, claro, que espero, honestamente, lhe compensem isto tudo. É que era tanto.

Perseguições

Em escuta na rádio, concluo factos ou pessoas da nossa Sociedade, que vão perseguir-nos para sempre. Destaco o TGV, a avaliação de professores e o Alberto João Jardim.

domingo, 21 de agosto de 2011

Quem manda sou eu

Nunca percebi muito bem a necessidade inerente aos géneros, de tecer considerações sobre o oposto, habitualmente denegrido, com uma insurgência forte e desconcertante. Calculo que deva ser mais ou menos sob o mesmo pressuposto da crítica ao Pais vizinho, ao clube oposto, ou qualquer uma outra diferença encontrada entre espécies, embora esta, a dos géneros, se assuma com uma intensidade superior, subjugada quiçá à ausência da possibilidade de troca, apenas possível em meandros sérios, nada frequentes. Dos diálogos proferidos ora por um, ora por outro, encontro amiúde laivos de vaidade completamente despropositados, vindos em forma de bitaite, não raras vezes duvidoso, ou não fora proferido pela boca de quem deseja enaltecer-se, perante o outro género, que pode ser, dependendo de quem profere, chato, machista, feminista, mulherengo, controladora, mesquinha, dependente, enfim, uma panóplia de adjectivos normalmente pouco abonatórios, proferidos de forma certeira e direccionada ao alvo, que constitui o sexo oposto. Ora e se em tempos idos eu ainda consigo considerar diferenças sérias, que ainda assim surgiam subjugadas a educações vetadas e totalmente específicas, direccionadas de formas totalmente opostas, hoje, e pelo menos quando as encontro em abordagens exageradas, e não apenas centradas nas diferenças óbvias, que sempre existiram e sempre existirão, ganho um sentimento estranho de que algo funciona mal. Retirando obviamente Países de culturas extremistas, e centrando o que digo nas sociedades ocidentais, parece-me perder sentido as abordagens ao macho latino, coisa que honestamente, já nem sei bem do que trata. Um macho, é um homem, ponto. Uma fêmea, é uma mulher. Essa história antiga e ultrapassada que por vezes parece renascer, e que algumas mulheres veneram, sob algum desígnio sexual de submissão, transcende-me verdadeiramente. Até porque, e não carecendo de tecer considerações mais profundas, as submissões e supremacias são de carácter variável, e não necessitam de um marmanjo entroncado de palito ao canto da boca. Eu pelo menos, e a encontra-lo, por certo fugiria, que me traduz um carácter frágil, fraco e dependente, completamente oposto ao que tenta transmitir. Esquecer estas diferenças empedernidas pelo tempo, que deveríamos amaciar ao invés de enaltecer, será talvez o melhor caminho para acabar com elas. E não, não está totalmente erradicado nas gerações mais novas. Está atenuado, talvez, mas ainda assim vigente, podendo emergir de forma subtil, quase escondida. Muitas vezes, quem manda ainda é ele. E quem obedece ainda é ela. Deixando de lado a tão falada igualdade, com o devido respeito pela individualidade.

sábado, 20 de agosto de 2011

No seguimento...

Ainda no seguimento das ambiguidade, reitero o que há muito sei, e não aprecio. Cabe ao meio mundo que luta, suportar com a outra metade de arrasto. Aos que são sérios, remendarem as trafulhices dos que não são, e ainda sofrerem com elas. E por aí fora. E depois, a meio do caminho, os que pensam e labutam questionam o prosseguimento. E umas vezes mantém a dignidade, mas outras, deixam-se ir, e encostam-se, nem que seja de mansinho, à metade que segue ao colo. Assim, cada vez mais uma parte cresce e a outra minga, ou seja, já nem me parece que hajam metades. Qualquer dia, e entrando obviamente num discurso de exagero, temos uma ínfima porção do mundo com o resto dependurado, numa desarmonia desconcertante, como toda a desarmonia. Nesse dia, e por consequência lógica, a minoria irá colapsar, quanto mais não seja por falta de forças perante o excesso da carga. Ou até, quiçá, poderá esse dia nem chegar nunca, que antes disso, um qualquer caos sociológico poderá inverter a tendência, não nos deixando chegar ao verdadeiro colapso. O Homem é um ser estranho, que nasce, cresce e age, de acordo com os seus interesses individuais, esquecendo que é social. É que ser social, não significa apenas e só, ser detentor de algum estatuto importante, posição relevante, ou cargo proveitoso, a fim de sobressair. Implica um conjunto de outras realidades, tantas vezes esquecidas, mas muito mais profundas.

Das redes sociais

Gosto muito desta coisa das redes sociais. Traduz literalmente o que se passa com a humanidade, completamente centrada no ilusório. Aprecio especialmente quando me chovem pedidos de amizade de pessoas que não conheço de lado nenhum, que me pretendem lá no burgo apenas e só para fazer número. Pessoas que não vão mais clicar-me para o que quer que seja, podendo eu concluir que ao aceita-las, vou passar a fazer parte de uma larga lista, género call center, para momentos de aflição e para efeitos de enchimento. Depois também gosto muito das pessoas que me conhecem de há largos anos, mas que por algum motivo ou circunstância da vida, se afastaram, sendo até possível que passem por mim na rua sem me cumprimentar. Mas que agora com esta evolução, querem muito ser minhas amigas. É que isto da virtualidade tem inerente aquela coisa gira da ausência de trabalho, do poder-se falar ou não, conforme apetece, do poder entrar no círculo de cada um, mesmo que se esteja fora dele, a fim de poder ver férias, fotografias, pensamentos e assim. E dizer-se gosto, ou não gosto, ou tecer-se uma qualquer outra consideração disparatada, que não significa nada, mas parece que significa muito, e que fica estampada lá no mural para toda a gente poder ler. Tudo isto no enorme conforto da distância. Gostamos mesmo destes fingimentos. Eu pela minha parte, vibro com isto tudo, como devem calcular.

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Ambiguidades

Todos os dias me ocorre, se de facto ensino bem o meu filho. Até hoje, e provavelmente até sempre, tenho-o ensinado a ser esforçado em vez de oportunista, sério ao invés de ardiloso, recto, a todo o custo. Sou das que telefona do meu telefone no local de trabalho, das que não gasta folhas em vão, das que fica para além da hora quando é preciso, das que chega mais cedo se for caso disso, das que se preocupa para além do exigido, para que tudo corra bem. Até hoje, não consegui trilhar caminhos de desrespeito, apenas para eu ficar bem vista, de abuso, apenas para me desenrascar, de desleixo, só porque não me apetece.
Ainda assim, os ganhos obtidos medem-se em níveis internos, não mais do que isso. Não que não sejam importantes, que o são, dado que considero que todo este caminho, me torna melhor a cada dia, enquanto pessoa que sou. Mas ainda assim, traz-me de arrasto um sem número de injustiças, sentimentos ambíguos, julgo que até poderei dizer, frustrações. Ele, ao que me parece, segue-me os passos. Eu, sinto-me orgulhosa, claro, que apesar de tudo, julgo ser este o caminho correcto. Mas ao mesmo tempo, sei que a vida lhe vai ser tão mais difícil.

ípsilon

O Público de hoje fala de sexo. Como quem fala de comida, ou algo do género. Pegando no tema, encontro inúmeras relações. Uns gostam de carne, outros de peixe, com a particularidade de todos precisarem de comer. Gosto de o ver abordado com a seriedade que merece. Recomendo vivamente.

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Felizes para sempre?

Todos os dias se encontram de manhã cedo, enquanto tomam o pequeno almoço, e despacham as crianças para a escola. O beijo da despedida é seco e frio, poderia até nem existir, mas tornou-se num hábito, igualzinho a lavar os dentes, ou qualquer um outro ritual de higiene diária, que a não ser cumprido, deixa uma qualquer estranheza no corpo, como que um amargo de boca, assim suplantado, sem esforços de maior para ambas as partes. O dia corre normal. Entre as decisões de quem leva e quem trás os filhos, entre o que se precisa de trazer do super mercado, entre o que se janta e onde. Em dias de festa, fins de semana, ou qualquer um outro acontecimento social de relevo para ambos, jantam fora, normalmente com alguns amigos que apreciam a companhia amena, correcta por assim dizer. Não existem trocas de impropérios, palavras altas ou outras situações dignas de preocupação, que a indiferença, quando entranhada, é fácil de lidar. É limpa, por assim dizer, que não deixa azo a emoções. São um casal simpático, ouvem dizer, com filhos maravilhosos. À noite, e logo após o sossego das crianças, ficam na sala, cada um no seu espaço, pouco tempo, imediatamente antes de um deles se retirar, para se deitar no quarto, em frente à televisão, na procura desenfreada de algo que o entretenha, mais do que aquela presença que apenas ocupa lugar. Porque há gente, que apenas parece ocupar lugares em espaço. Adormecem, e na manha seguinte, invariavelmente, começa um outro dia em que tudo se repete, mais coisa, menos coisa. Existem vidas cheias de nada. E existem gentes que se desperdiçam nelas. Ignorantes que estão de que um dia, os nadas lhe vão entrar pelo corpo dentro, ocupar o devido lugar que lhes está destinado, e deixa-los vazios de tudo. Em vidas ausentes esse dia surge sempre. Umas vezes cedo, muitas vezes tarde. Tenho medo de vidas ausentes. Mais do que da minha mania de me encher comigo mesma.

Do tempo...

Gostaria muito de ter tempo para vir aqui. De poder pegar num livro, e ler até me cansar. De poder sentar-me numa esplanada e relaxar. De poder jantar até à meia noite. Em épocas já idas desperdicei tempos, como se os pudesse dar ao desbarato, como se fossem um mal para queimar. Trabalho todos os dias com pessoas que não têm como o preencher, que gostam que passe depressa, que o contam, minuto a minuto, para que se esvaia, e as deixe outra vez num estado de descanso, para que um outro dia comece, e de novo se passe. Passamos, algures no meio das nossas vidas, por um período em que se torna um bem precioso, ambicionado. Uma simplicidade suprema, que nos faz uma falta tamanha. Hoje, assumo-o como um dos meus maiores luxos. Encontrasse eu quem me satisfizesse um desejo, e seria muito provável que pedisse tempo.

terça-feira, 16 de agosto de 2011

Dias

O meu carro encaminha-se, contra a minha vontade, para a oficina. Diz que quer lá ir, e eu, obediente, levo-o lá. A minha torneira da banheira, achou por bem abrir para não mais fechar. Agora, e até Quinta de manhã, hora a que o canalizador vem cá a casa, de cada vez que preciso de água vou abri-la na torneira de segurança, do lado de fora da porta, enquanto a minha banheira se esvai, num gasto de água pouco ecológico, mas inevitável, algumas vezes por dia. Várias. Muitas, pronto. A minha depiladora, apaixonou-se pela minha perna. Sugou-a deveras, engoliu um bocadinho, e colapsou, a pobre. Não aguentou o embate, se calhar sou venenosa ou assim.
Eu, por enquanto vou indo, obrigado.

domingo, 14 de agosto de 2011

Os anjos de oiro

O chão fugia-lhe por debaixo dos pés, tal e qual como se deslocasse em cima de um tapete encantado, que a levava em cima, dependurada. Pensou ela, por fracos momentos, que poderia de tal forma ser transportada, montada em tão nobre artefacto, vindo, quiçá, de uma qualquer história de contos de fadas, daquelas que conhecia a existência, ao de longe, lida num livro, ou ainda, melhor, ouvida da boca de sua avó, que lhe contou tantas que não mais esqueceu. Enganou-se, a pobre, que minutos depois percebeu, que aquele estranho embalo mais não era do que um engano, um embuste, uma farsa, que a vida, não se presta cá a doçuras, contos e outras histórias, inventadas por gente para dourar os negrumes dos dias, os amargos das horas. Tem para ela, que cada uma delas, foi construída por alguns iguais a si, detentores de sonhos e ambições, que nem encontrando poiso onde assentar, assim se acudiram, criando em seu imaginário doces acontecimentos, lugares de descanso, terras do nunca. Resolveu pois criar uma só para si. Precisava dela, pode-o dizer. Era uma vez, dois ou três personagens inventados, com ares de anjo e corações gigantescos, que ganharam vida num dia de sol acentuado, que lhes doirou a pele e os caracóis do cabelo. Tinham o estranho poder de adocicar tudo onde tocavam, sendo preciso apenas um simples encostar. Do lado do mal, uma estranha figura, muito grande e desajeitada, queria apanha-los, ciente que estava do perigo que corria, não fossem os ditos tocar-lhe, e ainda ao resto do mundo. Em emboscada ardilosa, quase que os apanhou, deixando a terra cinzenta, só do susto de os poder vir a perder. Mas eis que por obra de engenho, os divinos seres ousaram escapar, tocando, de mansinho e durante a fuga, aquele monstro enfurecido, que vai-se a ver, e sem querer, se aligeirou, e monstro deixou de ser. Gostou da história. Guardou-a, num baú escuro e escondido, não fosse ser encontrada, indo lê-la, quando carecida. Jura, que nessas horas, os anjos de oiro lhe tocam no cabelo.

sábado, 13 de agosto de 2011

Do equilíbrio

Quem a olha não vê, que dentro daquele corpo, escondido nas entranhas que carrega, se encontra um sofrimento sem fim, sentido por mor daqueles que a acartaram sempre, em ombros, em mãos, em afagos. Hoje, esvaem-se aos poucos. Devagarinho, podia ser rápido, mas não. O que sente, diz-me, é uma impotência de morte, que a transporta a um estado tremendo, do nada poder fazer, pelos que tanto lhe fizeram. Deixa umas lágrimas amargas escorrerem-lhe do rosto, enquanto lá dentro, imagino para mim, uma tempestade muito maior a afoga. O ciclo da vida, o nascer e o morrer, não lhe fazem sentido, como se em suas mãos, pudessem estar as escolhas e as decisões divinas, para que delas se pudesse aproveitar, deixando-os cá para todo o sempre. É a lógica, digo-lhe, já viu se fosse ao contrário? Segue em frente, dá-lhes a mão, submete-se, sem dar por isso, ao exagero da situação, visto aos olhos de todos. São críticos os olhos das gentes. Não concebem a ausência, por a julgarem fria, condenam a presença exagerada, que para além disso, é incómoda, chata. O meio termo, esta e aquela ali, referenciam-me, como pontos de equilíbrio. Equilíbrio é uma palavra bonita, que julgamos apreciar de fora, sem estarmos dentro. Poderemos, e só em ameno exercício, que não perturbe, atenção, procura-lo em nós, e encontra-lo em muito pouco, vos garanto. Mesmo que pareça ver-se e por vezes, sentir-se. Tenhamos calma na crítica, então.
Passados uns largos momentos, sai. Um cigarro, aquece-lhe a alma, e leva-a, quiçá, para próximo do tal equilíbrio que lhe falta. Aquieta-lhe o corpo, atenua-lhe a mente.
Até amanha.

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

A bailarina

O sonho era que ela fosse bailarina. De vestes coladas num corpo magro, enquanto as piruetas ao som dos violinos lhe saiam do corpo, tal e qual como se fosse sacudida por eles. Nos bancos cheios de gente que a olhavam, iria ser admirada, por olhos que gostam da arte e do belo, sendo que no fim de cada actuação, uma onda de aplausos sentidos iria surgir da plateia encantada, enquanto ela agradecia, em vénia, imersa em gratidão. Desde cedo que o ballet figurou nas suas actividades extra curriculares, treinando horas a fio, envergando um maiot cor de rosa, e uns sapatinhos de ponta quadrada, que lhe permitiam aos pés o equilibro, por ela tão bem conseguido. Fosse-lhe possível o de dentro, tal e qual conseguia o de fora, e não teria culminado assim, amargurada. O sonho, o das vestes delicadas, o das danças melodiosas, vai-se a ver e nem era dela. Não entendo, gostaria. Aqui como em tanto, encontro gente que sonha a rogo, como se tal coisa fosse sensata, e como se os sonhos, ao menos esses, não pudessem ser de nós para nós mesmos. Não fui eu, mas serás tu. Uma das mais puras manifestações de egoísmo humano.

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Era bem capaz de me empoleirar aqui...



Revistas cor de rosa

Era manhã. Nas cadeiras, gotas de imensa maresia deixam-na tentada, que o calor da noite fez-se sentir, acalmado com chás gelados, leques de madeira e quadrados de chocolate frio. Na lojinha compra uma revista cor de rosa. Primeiro, nem bem se percebe, que nunca na vida as pega, por não lhe despertarem qualquer tipo de interesse. O A que casa com B a gostar de D, o C que namora com M, mas que nos feriados se entretém com L, tudo histórias demasiado reais para lhe suscitarem atenção, pelo que prefere um outro tipo de leitura, intercalado entre o real com interesse, e o fantasia mesmo à séria. Pára um pouco para entrar em si, e compreender o que a motiva para tal situação, mas nem encontra nada que o justifique. Senta-se, e folheia a dita, minada de caras conhecidas que sorriem, com vestidos de flores esvoaçantes, a deixarem antever corpos bronzeados e torneados. Tudo lá dentro parece perfeito, emanando uma felicidade demasiada e estranha. Como se fosse mesmo verdadeira. Os discursos, proferidos de forma convicta e clara, deixam transparecer vidas cheias de tanto, pelo que nem ousamos sequer duvida-las. De repente, numa página, estanca, quase embriagada com a imagem, constituída por duas figuras que se beijam languidamente, enquanto ao lado se pode ler uma declaração de amor, muito ridícula, com palavras daquelas que se dizem ao ouvido do outro, para mais ninguém ouvir. Conseguiu de imediato perceber, o porquê de nunca se dedicar aquelas compras, embora não tenha percebido o que a impulsionou a adquirir aquela. Uma pena, um gastar desnecessário nos dias que correm. Folhas de papel colorido, onde gente ousa expor o que de mais precioso tem, ou julga ter, deveriam ser banidas da sociedade. Tal qual como deveriam ser banidos alguns blogs. Há coisas, que não interessam a ninguém. Ou não deveriam interessar, pode também ser isso.

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Da festa

Na festa amontoa-se gente que vê, enquanto os festeiros, enfeitam os andores com rosas branquinhas e fios de oiro grosso, muito amarelo, que enfeitam a Santa Padroeira da terra. Todos os Verões, a igreja é adornada, o arraial montado no largo do cemitério, coisa que sempre me causou estranheza, que os cemitérios são sítios de descanso e sossego, e durante três noites a fio, todos os mortos, ciprestes e bichos que por lá moram, necessitam de interromper a calmaria, por mor dos hábitos das gentes, que ao invés de bailarem longe, se ajuntam ali, na beira da morte, num desafio que ela finge não ver. Pela noite adentro, moças e moços bailam ao som do conjunto musical, muito colados uns nos outros, deixando os corpos roçarem e as mãos passearem, num deleite exagerado, perante o desconhecido, coisa que a ser cometida em outro contexto, sem música quero eu dizer, traria de arrasto sérias complicações para os que se atravessem a tal prática, apenas permitida porque o embalo da melodia guarda os afagos, entra nos corpos das gentes, adormece a censura e desperta a sensação. Nos intervalos, enquanto os moços se encostam na borda do muro baixo caiado de branco, as moças escondem-se na envolta, discretas, enquanto cochicham a dança, entre dois bafos de fumo, longe da sociedade. As velhas sentadas nas cadeiras de madeira carunchosa, embrulhadas em xailes pretos e quentes, tecem o que têm a tecer, leis verdadeiras e aceites por todos, ou então, nem tanto, mas temidas, coisa essa mais do que possante, no que toca a condutas e acções, que moça a ser banida do rol dos bons partidos, corre sérios riscos de preterição, futuro temido e nada ambicionado.

No meio delas, está Maria, a rapariga que olha a envolta, e julga não pertencer ali. As pessoas falam, mas ela, enfiada dentro de si, não as consegue ouvir, tal como não ouve a música que toca, tal como não vê o moço que a catrapisca, percebendo porém os sérios riscos que corre, por se sujeitar àquela figura enjeitada, por demais débil e fraca, denunciadora de coisas que não podem ser boas, e que entram nos olhos das gentes, muito depressa, para num ápice atingirem um saco de veneno que muitos têm dentro, e que quando alcançado, jamais será largado. Cansou-se daquela ausência e saiu. Olhou para o cemitério, e resolveu espreitar. Lá dentro, os mortos repousavam num sossego digno dos deuses, quiçá embalados pela música lenta que tocava, e que ali também tinha entrada, claro está. Os ditos, ainda que em sossego, conseguiam ouvi-la, isto mesmo sem ela falar. Não respondem, coisa que por vezes, é totalmente apetecível. Maria não percebe, como exista quem deles tenham medo. Ela, por exemplo, tem muito maior temor às velhas.

domingo, 7 de agosto de 2011

As flores




Hoje resolveu agradecer às flores. Às plantas que lhe sobem a escada, garante, que nem bem sabe o porquê de nunca se terem murchado, que as pobres, são sabedoras de amarguras sem fim, nascidas daquela boca que não sorri, mas que se lamenta, como se mais nada de lá pudesse sair. Algumas vezes, chega a história a chegar bisada, que lá dentro do seu corpo, torna-se grande de mais, e precisa de escapulir-se para fora, uma e outra vez, por mor de encontrar o tal do poiso sadio, capaz de arrumar de vez, ou até, quiçá, apanhar também tal moléstia. Nunca aconteceu. São fortes as flores, por frágeis que pareçam. Sabem das noites sozinha, das agressões verbais, do desamor constante, que lhe doí mais do que qualquer outra dor infligida por este mundo cruel, capaz de a molestar com imensas, como se nada mais tivesse para lhe dar. Para ela, escolheu aquela, o desamor, uma das piores, retirando, obviamente, desgraças mais importantes. Logo quando nasceu, foi a ela condenada, quem sabe se terá sido porque veio ao mundo em dia de azares, e se tal facto se vier um dia a comprovar, conclui que bastariam umas escassas horas para saltar para o seguinte, não deixando por isso de ser tal facto, detentor de um carácter irreversível, pelo que em nada, nunca, e em tempo algum, poderá haver alteração para isso. Sua mãe dispôs-se a deixa-la com uma avó, enquanto lutava pela vida, esquecendo porém, que mais uma dessas preciosidades dela dependia, e que enquanto lutava por vencimento da sua, se desleixava no triunfo da outra, pobre enjeitada e desamada, logo ali. A velha fez o que lhe estava ao alcance, naquela aldeia parida no meio de nenhures, fez questão de a levar à escola, de lhe ensinar lavores de bordadeira, as lidas da casa, as rondas dos dias. Tudo isso, debaixo de um amor seco e distante, de um cuidar o essencial sem entrar porém no ser, quase parecendo que tinha aprendido tal arte num qualquer livro de ensinamentos rectos e precisos, onde as funções se faziam sem recurso ao coração. Conheço muitos casos assim. Não os percebo, embora me esforce, que gosto de entendimentos. Gente que ama à medida, num sentimento pouco esbanjado, nuns afagos de hora marcada, nuns carinhos medidos a tostão. Tudo quanto exceda o que se deve, poderá ter um qualquer efeito adverso, algum excesso, como se no amor, pudessem haver demasias. Talvez seja aí e em nada mais, que todo e qualquer sobejo se sorve a gosto, se arruma e se destila em doçura, em corpos que crescem amados e desejados, e que daí, só darão isso mesmo. Não sabe o que isso é, que a única sabedoria que detém é a da falta, pelo que iniciou cedo o processo de arrumo ao seu. De resto, que mais fazer-lhe, se a envolta dele não vivia, por que raio haveria ela de o necessitar um dia, se a única coisa que de lá lhe advinha, eram sofrimentos, quando a ele se rendia. Quase conseguiu até ao dia em que foi mãe, coisa que veio, por certo, para lhe arrancar do peito o tal órgão, e deixa-lo de novo entregue à mercê da vida, sem qualquer hipótese de negação. Afinal, ainda existia. Por muito que o passado o tenha encolhido, o tenha apertado nos ossos até já não o sentir, o malvado enjeitado tinha poderes sem fim, e acendeu-se-lhe com uma força bruta e destemida, muito direccionada. A partir dali, e durante muito tempo, sentiu o amor do filho como mais nada, e entregou-se-lhe desmedidamente, quase como se no mundo, mais nada houvesse para além daquela querença, sagrada, divina, perfeita, que lhe chegou para dourar os dias, anos a fio. Pudesse ela ter travado a vida, conseguisse ela ter-lhe acrescentado, os dias do crescimento, e não lhe teria permitido um desapego tão rápido, que num ápice, lhe voou. Já não se encontra ao de perto, é isso, para que lhe passe as camisas, lhe prepare as torradas, lhe abra a cama ao anoitecer, e este cuidado que lhe fazia, deixaram-na enfraquecida, que por vezes, nem bem se percebe, que quem muito cuida alguém, é a si que cuida e a mais ninguém. Ficou então no vazio, sem direcção em quem se dar, sem regressos por receber, sem lugares para se deixar sentir.


Foi nesse dia que plantou as flores.

sábado, 6 de agosto de 2011

Desagrados...

Estanco, por vezes, com erros humanos recorrentes. Não os claros, que todos vimos com os olhos, e que se insurgem onde menos os queremos sentir. São demasiado óbvios, não gosto deles, mas vivo com eles. São outros erros, mais subtis, menos declarados, evitáveis, mas que se vão cometendo amiúde, deixando-nos num estado de graça fictício, que parece suster-nos, num sustento frágil, mas o qual queremos até à exaustão. Deixo apenas alguns, como são, por exemplo, a negação clara do que não queremos ver, embora saibamos que exista. Como sentimentos, amor, desamor, ou outro, acontecimentos, morte, ou doença, factos, que não queremos ver, sentir ou saber. Quase parece que assim, na inconsciência do real, os banimos, num erro crasso e cobarde de quem não olha de frente. E se recusa a apelidar com o nome correcto as cruezas do mundo. Existem mais. Como o receio da falha ou da perca, que nos corta umas pernas longas e que caminham, porque o orgulho ferido, é coisa suficientemente forte para nos derrubar. E preferimos, muitas das vezes, a não existência de algo pelo qual não lutamos, do que a derrota por algo que sofremos por conseguir. E que podemos alcançar ou não. Chegamos, nesta última, a apresentar um semblante baixo e envergonhado, denunciador de um sentimento de auto despeito, como se toda o esforço exercido tivesse desaparecido, apenas e só porque não se atingiu o fim proposto. Quando o correcto, seria a altivez do sucesso, ainda que não totalmente alcançado, pelo mérito da vontade. Somos por vezes estranhos e trocamos conceitos, pressupostos. Valorizamos, por exemplo, e nesta linha de pensamento, sucessos mornos, vindos da sorte ou da circunstância, que nos deixam numa satisfação plena da conquista. Mesmo sem a luta. Desvalorizamos por completo o nosso intrínseco papel, como se ele nem existisse. E nem damos por isso.

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

...

Coisas tipicamente Portuguesas, daquelas que de ontem para hoje já vi em número considerável, e que gosto muito. Ou então não;
- Stands de Automóveis com fitinhas de várias cores, em forma de triângulo, presas num cordel;
- Mulheres de bata às flores, a varrer do lado de fora do portão;
- Cães presos por uma corrente, que se desunham em latidos aflitos;
- Homens de camisa aberta, com muitos pelos e um fio com um crucifixo;
- Homens com um palito no canto da boca.

E não, não andei perdida no meio de nenhures.

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Das velhas que riam

Na encosta, inúmeras casinhas azuis e brancas, pintalgam um cenário idílico, daqueles que se vêm dentro de um quadrado televisivo, ou quando muito, num sonho abençoado por mão divina, que em determinada noite, a uma certa hora, resolveu prendar alguma mente pecadora, e dar-lhe o direito a sentir de perto, o toque e o cheiro de tão fabulosa paisagem. De chinelo nos pés, calcorreou devagarinho aquelas ruas estreitas, ladeadas de sardinheiras coloridas, e velhas às janelas. No cimo da colina, uma Mesquita de cúpula azul, alberga dentro um conjunto de gente que resolveu rezar pelo mundo, onde um Rabi concentrado na tarefa que lhe foi concedida, ora despretensiosamente, seguido dos seus fiéis, que ali se depositam dias e dias a fio, como se as suas vidas para isso servissem, nem havendo por certo outra tarefa, à qual se pudessem dedicar. Estão todos, sem excepção, em claríssima devoção. Sai, e continua o seu trajecto, desta feita, descendo a colina. No fundo, um mar azul, cravejado de barcos pequenos que dançam ao vento, lança-lhe um cheiro poderoso, inconfundível, num apelo forte, que juntamente com o calor do ar que respira, o fazem descer mais depressa. Nas ruas estreitas, e no fim da tarde, as velhas ainda estão. Todas, exactamente no mesmo local. Sentiu um tamanho conforto, como se ali sempre tivesse pertencido. Nem bem sabe explicar o efeito que elas lhe trazem. Como se das rugas que lhes cravam o rosto, dos lenços que lhe apertam o pescoço e a alma, do branco encardido dos cabelos atamancados, lhe emergisse uma vida sem limites, ao invés de uma morte próxima, impossível de estancar, já iminente na sombreira das portas, robustas e pesadas, mas por demais fracas, perante tal imensidão. Enquanto passa, os seus ares de sorrisos inundados de boas tardes, trilham-lhe um caminho de cores vivas, deixando-o na certeza de que a vida, emerge de tudo e de nada, do inicio e do fim, do feio e do belo.

Pós fim de semana um tanto ou quanto bera

Às vezes ando um bocado farta. Não disto ou daquilo, nem deste ou daquele, mas de tudo em geral. Tal acontece-me, quando inicio um sentimento estranho, de que me pedem mais do que o que eu consigo dar. Normalmente, todos ao mesmo tempo. É nestas horas, em que uma ilha deserta (ou quase), com um livro ou dois (ou sem nenhum, dependia do quase), com uns cocos, uma cabana, e muita aguinha azul turquesa, fariam de mim uma Mulher muito feliz.

Seguidores