sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

mudança de paradigma

Existem sociedades onde as decisões sobre o testamento vital já fazem parte integrante dos procedimentos e da cultura de acção. Temos por exemplo cerca de 40% da população dos Estados Unidos a predefinir e a registar precocemente o que quer que lhe aconteça na exacta altura em que for necessário tomar uma decisão, se for caso disso.  Não é impossível, sequer difícil, numa era em que os pensamentos acompanham a evolução global, considerarmos que o corpo é pertença nossa, de acordo com uma vontade interna capaz de ordenar os destinos que lhe impomos e consequentemente o que queremos que lhe façam quando já não tivermos a lucidez ou a capacidade física para exercermos o nosso poder de optar, quando tal é preciso. Desde que não entrando em confronto directo com princípios éticos das classes profissionais ligadas à saúde, como é o caso, tudo me faz sentido. Mas surge-me uma questão central para a qual não encontro resposta definitiva, necessitarei talvez de deixar correr o tempo e as acções que me atestem uma real competência sobre a qual tenho sérias dúvidas. Questiono directamente a capacidade de acolhermos a mudança de paradigma necessária para que seja exequível a generalização deste tipo de deliberações. A classe médica continua a exercer e por necessidade do utente, na maioria das vezes, um paternalismo de protecção que nos salvaguarda o ego das decisões importantes. Há uma persistente entrega, uma passagem de testemunho para mãos e cérebros que escolhem por nós em decisões tão importantes como o que fazer com o nosso corpo, em caso de sobrevida. Definições precisas e nossas sobre esse destino, transportam-nos para o centro da questão, com uma consequente inversão de papéis e uma considerável auto responsabilização.   
Estaremos aptos, na globalidade? Ou manter-se-ão estas livres escolhas reservadas a uma determinada classe populacional com características muitos próprias, que é o que tem acontecido até então? Prender-se-á este facto unicamente com a escassa divulgação do tema? Ou será que e na inversão, continuaremos a depositar confiança externa em vez de decisão própria, por comodidade e conforto mental?

6 comentários:

  1. Não seremos nós, com sintomas noutros pontos da sociedade, por si só um povo, uma sociedade infantilizada?

    ResponderEliminar
  2. Não sei se deveremos dizer infantilizada. Dependente, sem dúvida, e devido a isso infantilizada até talvez nem fique mal. Gostamos de nos depositar, e isto na generalidade, numa confiança cega, em decisões exteriores à nossa capacidade de escolha. Eventualmente por uma questão de gerência de frustrações, entre outras. Acontece em várias questões, sem dúvida, mas nesta é verdadeiramente gritante...

    ResponderEliminar
  3. Por vezes, a classe médica, exerce "paternalismo" por necessidade do utente, por vezes. Outras vezes a "necessidade" é mesmo do profissional de saúde. Porquê essa atitude que em alguns momentos raia a arrogância?
    Relativamente à questão do testamento vital, julgo haver pouca divulgação e como consequência escasso esclarecimento de dúvidas que possam surgir. A título de exemplo a parte em que mesmo tendo um suporte legal, os médicos podem ignorar o testamento em casos excepcionais e alegar objecção de consciência.




    ResponderEliminar
  4. A questão do paternalismo será transversal a ambos, possivelmente. Tudo quanto não é rigorosamente objectivo, potencia estas situações e a medicina é uma delas.
    Quanto à falta de divulgação, falta claro. Há muito a fazer, ainda. Esperemos que se faça. Nos técnicos e nas pessoas em geral.

    ResponderEliminar
  5. Perante as questões que coloca, sugiro que se envie à AR um pedido de acrescento de um artigo, à Constituição Portuguesa. Artigo esse que delimite o tempo máximo de vida. Findo esse tempo, independentemente do estado físico e psicológico, cada um será conduzido a um local de "reencaminhamento".
    Globalização é isto, todo em massa, tudo igual.
    ;)

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Bartolomeu, não é essa a globalização de que falo. Nunca por nunca ser, encararei o tudo em massa, tudo igual. E muito menos em questões de vida e morte.

      Eliminar

Deixar um sorriso...


Seguidores