E quando a tempestade acalma, por obra que nem tento definir, que não ouso tal pretensão, eis que de novo algo surge, com intuito de lançar a monte, o bicho da instabilidade. Porque cada vez mais acho, que a calma não é para todos, que nem todos sabem guardá-la, e há quem ambicione de conflito alimentar-se, terrível desaire dos que não sabem o que fazem. Lembro-me deles vezes sem conta, não por este motivo em particular, mas porque a amizade que lhes tinha, cravou fundo e para sempre, sim, que eu às vezes, posso dizer para sempre com toda a certeza, e gosto disso. Mas este que por aqui falo, é também um motivo, que tanto os trás à minha lembrança, que também eles, de forma ingénua, bem sei, se alimentavam do conflito, como se o sal que lhes dava, fosse de facto precioso. Não era, hoje sei ainda mais que não era. O sal que lhes dava alimentava-os assim, pois nem entenderam a tempo, o que o açúcar lhe poderia dar em doçura, e com a mesma emoção. Estende-se a tanto este raciocínio, que peso, do fundo da alma, que alguns dos que me circundam, assim não abranjam. Do alto de mim, que nem sou assim tão alta, mas faço questão de parecer, acabo por cortar caminho e me desviar do tiro, que passou ao lado. Antes, nem o faria, que o orgulho também se treina com o tempo, e o meu também já foi poderoso. Hoje ainda dá ares de graça, mas de forma muito mais ponderada, e que feliz fico por isso, que privilegio um corte na hora exacta, sob um prosseguir de impropérios, apenas e só, pelo prazer do remate.
Ainda magoas alguém. E não, olha que não é preciso.
O que me faz reflectir... Todos os textos que aqui publico são de minha autoria, e as personagens são fictícias. Excluem-se aqueles em que directamente falo de mim, ou das minhas opiniões, ou onde utilizo especificação directa para o efeito.
terça-feira, 31 de agosto de 2010
Desemprego
Num dia em que capas de jornais anunciam nova taxa de desemprego a 11%, eu, procuro desesperadamente, uma funcionária para o Lar. Bem sei não ser trabalho de escritório, mas é trabalho, remunerado e certo. Já me foram enviadas algumas pessoas, pelo IEFP da área, que por isto, aquilo ou aqueloutro, recusaram a oferta. Já nem tiro conclusões daqui. Limito-me a continuar a procura, de quem queira aqui trabalhar. Adiante.
segunda-feira, 30 de agosto de 2010
Velhice

Devíamos saber envelhecer como sabemos nascer e viver, mas nem apetece perder tempo com isso. Era mais fácil, menos doloroso. Chego, e deparo-me com caras novas. Não novas em si, que são por demais velhas e cravejadas de sulcos profundos, em peles curtidas pelo sol, de verão e de inverno. Mas novas aqui, em adaptação a um outro mundo, uma nova realidade, numa inserção tamanha, com alterações do modo de vida, das companhias, do lugar. Os dois dispares, por demais dispares. Um envelheceu inundado de alguma tranquilidade que lhe permite aceitar o processo pacificamente, sem grandes dissabores. Consciencializou claramente a necessidade de ajuda, porque o processo assim exige. Ontem pouco ou nada precisava, que a vida sempre o brindou de força de braços e de vontade. Hoje precisa de uma fralda que lhe ampare os desperdícios do corpo, e de alguém que lhe faça a troca, sob pena de se atafulhar em porcaria, que as suas mãos e pernas já nem força têm para o devido zelo. A lucidez da incapacidade continua lá, grave e acutilante, como só ela sabe ser, nestes processos do fim. O outro recusa a velhice, como se possível fosse libertar-se dela, tamanho disparate, pela impossibilidade de o ser. Porque sempre soube haver-se sozinho, e não concebe que lhe dêem banho, porque sempre deu a volta, e continuaria a dar, se os ingratos dos filhos não o tivessem "depositado" por cá, à sua completa revelia. "Velhos são eles".
Transponho esta realidade a outras já vividas, e constato a frequência com que me deparo, com gente que não sabe ficar velha. Palavra forte, mas ainda assim, não tão forte como o fenómeno em si. A sociedade emerge diariamente em prevenções por vezes alucinatórias, de como viver mais e melhor, com muita saúde e com menos rugas. Importante, claro que sim, que encaixo cem porcento nas teorias positivas do envelhecimento, na busca da qualidade de vida, no percurso proactivo.
Transponho esta realidade a outras já vividas, e constato a frequência com que me deparo, com gente que não sabe ficar velha. Palavra forte, mas ainda assim, não tão forte como o fenómeno em si. A sociedade emerge diariamente em prevenções por vezes alucinatórias, de como viver mais e melhor, com muita saúde e com menos rugas. Importante, claro que sim, que encaixo cem porcento nas teorias positivas do envelhecimento, na busca da qualidade de vida, no percurso proactivo.
Pior, é que muitas vezes se esquece a inevitabilidade do processo. E não se fomenta um desenvolvimento interno capaz de acompanhar a velhice, que mais depressa ou mais devagar, sempre chega. Faz parte de um crescimento, de uma consciência de si, que todos deveríamos seguir e aceitar, sob pena de se atingir um desconforto desconcertante. Um desconsolo.
domingo, 29 de agosto de 2010
...

Continuo a ler sobre lapidações, burqas, niqabs e dupattas, que me surgem daqui e dali, ou não fora assunto de ordem. Bem sabem, que já por cá trouxe, o que sinto da justiça, da liberdade, e de outras grandezas humanas que extremistas tendem a aniquilar, como se um poder absoluto detivessem, e lhes fosse possível decidir vidas alheias, numa subjugação doentia a interesses que se dizem sagrados. Ainda ontem, me perco no National Geographic, e encontro uma cadeia de mulheres, com número considerável de penas perpétuas, por crimes de homicídio. Penso nas disparidades exacerbadas do mundo, e em como também aqui, o local onde se nasce, poderá ditar sortes e destinos, com uma determinação implacável. Em terras lusas, tirar vidas pode passar em dez, quinze anos. Sítios há, em que com a vida se paga, em vida, ou em morte. No Irão, basta um amor lutado e sentido, em detrimento da solidão, ou da subjugação doentia a um Marido castrador, para se correr risco de lapidação. Aqui pode-se, ali não. O caminho da uniformização é utópico, bem sei, que nos encontramos inseridos em culturas, credos, convicções. Mas parece-me a mim, haver braços cruzados que se deveriam abrir, contra estas e outras violências desumanas. Desta forma inerte, o poder quase me perde o sentido. Todos os dias as leio, todos os dias as lamento. Todos os dias lamento ainda a ignorância humana, que me parece detentora de grande responsabilidade. Só verdadeiros ignorantes desperdiçam vidas em causas tão sinistras, ao invés de perseguirem caminhos superiores, e tão ao alcance. E só uma sociedade excessivamente permissiva, as possibilita como se ninguém visse.
Há quem veja, claro que sim. Quem pouco pode, mas quem muito quer. Um bem hajam a eles, quanto mais não seja porque lutam em causas nobres, que ainda espero não perdidas.
A quem as desdenha, sob o pretexto da ineficácia, o silêncio, parecer-me-ia melhor.
Caminhos

Amanhã volto ao trabalho, nem sei se me apetece se não. Num ano que se antevê de mudança, fico sempre com umas borboletas na barriga que me acompanham desde sempre, e que confesso, julguei que me passariam com a idade. Não passou, nem isso, nem outras coisas que me perseguem há muito, algumas até mais banais, como o facto de gostar de pastilhas gorila e de chapéus de chocolate Regina. O mix feelings surge sem que me apeteça muito, alojando em mim sensações antagónicas, do querer seguir, mas com algum receio das consequências. Bem sei que o incerto nos acompanha de perto, já quando nascemos, ninguém sabe o fado, o destino, ou a sorte, que se pode indiciar boa e mudar de rumo com uma rigidez fatídica, fossemos nós assim tão eficazes, e nada neste mundo poderia parar-nos, essa é que é essa.
Até simpatizo com ele, o incerto, o fado, e encaro-o de frente, assim como quem pega um toiro pelos cornos, num a mano a mano legítimo e frontal, sem artimanhas ou capinhas de retaguarda. Venha o que vier. A propósito, gosto de ver pegas de caras, transporta-me assim num ápice, para a coragem, para a valentia, para a supremacia do homem, que de força física reduzida, enfrenta a fera sozinho na arena, também aí, obviamente, de futuro incerto, e com considerável hipótese de perca, quem sabe até, do bem mais precioso.
As minhas apostas nem vão tão alto, nada disso, que tratam apenas caminhos a percorrer, objectivos a traçar, mas que ainda assim, e embora de riscos menores, levam a minha vida dependurada, e ela vale-me que se farta.
Às vezes, nestas paragens, sinto que mudo de caminhos vezes de mais. Aqui e ali, nisto e naquilo, como se cá dentro, apenas e só cá dentro, um ser nómada brota-se, um ser que não atina em terreno seguro, onde atraque e sossegue para sempre. Depois, levo mais longe o pensamento acerca de mim, e vejo-me como se de uma estranha raça tivesse emanado, e que até talvez, a segurança de um determinado porto, não me constituísse um sossego, mas sim um inquietamento. O inquietamento da estagnação, se é que isso existe.
E então continuamos assim. E eu que me avenha com as borboletas.
Até simpatizo com ele, o incerto, o fado, e encaro-o de frente, assim como quem pega um toiro pelos cornos, num a mano a mano legítimo e frontal, sem artimanhas ou capinhas de retaguarda. Venha o que vier. A propósito, gosto de ver pegas de caras, transporta-me assim num ápice, para a coragem, para a valentia, para a supremacia do homem, que de força física reduzida, enfrenta a fera sozinho na arena, também aí, obviamente, de futuro incerto, e com considerável hipótese de perca, quem sabe até, do bem mais precioso.
As minhas apostas nem vão tão alto, nada disso, que tratam apenas caminhos a percorrer, objectivos a traçar, mas que ainda assim, e embora de riscos menores, levam a minha vida dependurada, e ela vale-me que se farta.
Às vezes, nestas paragens, sinto que mudo de caminhos vezes de mais. Aqui e ali, nisto e naquilo, como se cá dentro, apenas e só cá dentro, um ser nómada brota-se, um ser que não atina em terreno seguro, onde atraque e sossegue para sempre. Depois, levo mais longe o pensamento acerca de mim, e vejo-me como se de uma estranha raça tivesse emanado, e que até talvez, a segurança de um determinado porto, não me constituísse um sossego, mas sim um inquietamento. O inquietamento da estagnação, se é que isso existe.
E então continuamos assim. E eu que me avenha com as borboletas.
sábado, 28 de agosto de 2010
Às terças
Falo por ora no Morrie, um doente com Esclerose Lateral Amniotrófica (ELA), que me acompanhou em férias. Um livro escrito por um colonista, antigo aluno do professor Morrie, banal em termos de escrita. No entanto, transporta-nos com uma simplicidade certeira, ao mundo de alguém com pouco tempo de vida, totalmente consciente do fim que se aproxima, e que atinge, internamente, um patamar supremo da existência humana.
Já tinha dito que o levaria, e após lê-lo, tenho de aconselha-lo. Diz o título, às terças, com Morrie. Mas comecem já, se vos for possível. Ninguém se importará em ser Sábado.
Já tinha dito que o levaria, e após lê-lo, tenho de aconselha-lo. Diz o título, às terças, com Morrie. Mas comecem já, se vos for possível. Ninguém se importará em ser Sábado.
Cara metade
A Fátima Lopes baptizou assim um dos seus livros que nunca li, mas ao qual aprecio o nome. Amar depois de ama-lo será sempre algo de estranho. Sabe o suficiente para sentir com clareza, e para perceber, que aquele amor, para além disso, é só isso mesmo, e como tal pode passar, o tempo pode curar, o vento pode levar, e ela continuará cá. Esse tempo, o da espera que passe, é um tempo inglório pelo qual quase todos passamos, nem que seja uma vez na vida, na tentativa de arrumar num canto da alma, o que mais queríamos manter para sempre, numa luta constante e que mói, pela incongruente e ignóbil tarefa de mandar para longe o que tanto se quer perto. Adiante. Ainda assim, e antevendo a chegada desse tempo, sente possível ser, amar de novo, outro alguém que possa surgir, e preencher aquele espaço que todos ou quase temos, que em épocas de amor julgamos preenchível apenas e só com aquele que amamos, enorme disparate de quem assim se dedica. Não deixa porém a lamentação que lhe acarta a possível perca. Não pela impossibilidade de um novo amor, que como disse, sabe possível, mas pela improbabilidade quase absoluta de encontrar de novo quem queira o mesmo destino, à mesma velocidade, sobre um mesmo chão, e ainda por cima que se ame. É a perca da cara metade, se é que ela existe. Entendo-a.
Pecados
sexta-feira, 27 de agosto de 2010
Regressos
Fico preocupada com certos fenómenos. Ainda me lembro de em pequena, passar férias no meio de espaço, como se o mundo se distribuísse de forma coerente, numa harmonia perfeita e orientada. Hoje nada assim é, e penso especialmente no assunto, logo após ter sido esperada por uma velhinha senhora, que aguardava em ânsias o meu lugar na praia para estender a toalha. Habituada que estou, a esperas de lugares para estacionamento, talvez o fenómeno nem devesse causar-me estranheza, mas que se faça, causou. Fosse o País um pêndulo, e estaria agora pendente a sul. Felizmente já estou no centro. Sim, regressei.
Aliado aos mares de gente, junta-se uma costa estreita, com marés cheias ao entardecer, mero pormenor, mas de extrema importância, que a maré vaza é por de mais proveitosa no que toca a dar espaço às gentes, ao invés da preia-mar, que nos eleva com jeitinho para cima das arribas perigosas, das quais teimo em fugir, com dificuldade declarada.
As bolas de Berlim invadiram o espaço, como se as praias fossem delas, numa perfeita injúria ao descanso. De creme amarelo feito agora de pó instantâneo, sei-o de fonte segura, ou sem creme nenhum, passam com uma frequência alucinante, como que numa feroz tentativa de me tirar do sério mesmo à séria. Não se faz, e tenho para mim, que o negócio deveria ser extinto, tal a afronta continuada, à minha capacidade de resistência, já por demais gasta e fraquejada.
Ainda assim, a época está em força no que toca a clima e à temperatura do mar. Tempo quente sem exageros, águas quase a roçar o morno ao ponto de me apetecer mais fresca, coisa estranha esta.
Um bocadinho menos de gente, e teriam sido quase perfeitas.
Aliado aos mares de gente, junta-se uma costa estreita, com marés cheias ao entardecer, mero pormenor, mas de extrema importância, que a maré vaza é por de mais proveitosa no que toca a dar espaço às gentes, ao invés da preia-mar, que nos eleva com jeitinho para cima das arribas perigosas, das quais teimo em fugir, com dificuldade declarada.
As bolas de Berlim invadiram o espaço, como se as praias fossem delas, numa perfeita injúria ao descanso. De creme amarelo feito agora de pó instantâneo, sei-o de fonte segura, ou sem creme nenhum, passam com uma frequência alucinante, como que numa feroz tentativa de me tirar do sério mesmo à séria. Não se faz, e tenho para mim, que o negócio deveria ser extinto, tal a afronta continuada, à minha capacidade de resistência, já por demais gasta e fraquejada.
Ainda assim, a época está em força no que toca a clima e à temperatura do mar. Tempo quente sem exageros, águas quase a roçar o morno ao ponto de me apetecer mais fresca, coisa estranha esta.
Um bocadinho menos de gente, e teriam sido quase perfeitas.
domingo, 15 de agosto de 2010
Sossego
Egoismos
Há bocado fui à loja dos Chineses, mais ou menos a meio da tarde, quando já não sabia muito bem o que fazer a fim de matar o tempo, coisa hedionda esta, matar um bem tão precioso. Entrei num armazém enorme e de cheiro a mofo, onde se encontra tudo o que podemos precisar, muito que não precisamos, muito que não sabemos se poderemos vir a precisar ou não, e ainda coisas que nem sabíamos que existiam, e essas, confesso, fazem-me as delícias, e passo tempos consideráveis, a tentar descortinar, qual a estupenda serventia. Percorri todos os corredores, e encontro, entre outras coisas, vernizes encarnados, malas de viagem, alguidares, utensílios de cozinha, lenços, ferramentas e outras ninharias assim. A gente era mais do que muita, quase parecia um supermercado em hora de grande fluxo, alguma dela armada de cesto de compras, já semi cheio daquelas coisas que não fazem falta nem ao menino jesus.
Fiquei a saber hoje mesmo, embora já andasse desconfiada, o porque da afluência aquelas lojas. Em caso de neurose profunda e de planos escassos, ruma-se até lá, trazem-se meia dúzia de quinquilharias por meia dúzia de tostões e saímos de lá muito mais felizes do que quando entramos, ainda que na algibeira, venha algo que muito provavelmente, nunca iremos utilizar. Ninguém quer saber na hora do desanuvio, quem produziu, como e a que custo. Um egoísmo supremo, diria eu.
Fiquei a saber hoje mesmo, embora já andasse desconfiada, o porque da afluência aquelas lojas. Em caso de neurose profunda e de planos escassos, ruma-se até lá, trazem-se meia dúzia de quinquilharias por meia dúzia de tostões e saímos de lá muito mais felizes do que quando entramos, ainda que na algibeira, venha algo que muito provavelmente, nunca iremos utilizar. Ninguém quer saber na hora do desanuvio, quem produziu, como e a que custo. Um egoísmo supremo, diria eu.
Devoluções

Devolveu-me o livro, perguntei-lhe se gostou, e disse-me que sim, com um sim que não me aqueceu nem me arrefeceu. Nem gosto de os emprestar, e quando empresto obras de arte, espero no mínimo alguma emotividade, em quem leu tamanha preciosidade e que a mim tanto me deu. Bem sei que ninguém lê de igual maneira a mesma coisa, bem sei que nos encaixamos, projectamos, e lê-mos cada um o que quisermos ler, é a magia da subjectividade, latente nas palavras, que se julgam objectivas, mas que em nada o são. Ainda assim, existem obras de arte, que a serem lidas, seja por quem for, merecem respeito. Quando empresto livros levo muito menos a mal um franco não gostei, não encaixei, ou desisti a meio, que somos livres de fazê-lo, também eu já o fiz, do que um gostei muito, que não sabe a nada. Aposto que se lhe perguntasse, qual o conto que mais gostou, me olharia de olhar empedernido e encolheria os ombros sem saber que dizer-me. Fiquei irritada, e com a minha pouca vontade em emprestar livros, ainda mais diminuída. Parece que ninguém percebe, que os empresto de coração nas mãos.
sábado, 14 de agosto de 2010
Again...

E diz-me ela que ele partiu, numa das muitas histórias que escuto, daqui e dali. Tenho um fardo tramado, que se faça, que isto de ouvir os outros, dá-lhes a eles o poder da palavra, e a mim o dever da escuta, quase pior que Padre em dias de confissão. Não absolvo ninguém, mas é só que falta, e tenho para mim, que ninguém disso necessita, que de resto, nem pecou, e o que querem mesmo, é despojar a alma cheia, e depois bazar, sem rezas de joelhos e terços cumpridos. Este foi embora para longe, passado uns anos de vida em comum. Porque tinha outros sonhos, outras ambições, longe de cá e longe dela. A vida dele continua agora no outro sítio por ele escolhido, e a dela continua cá, na casa dos dois, na cidade dos dois e com o filho dos dois. Sou a favor da liberdade e da perseguição de sonhos, sou sim senhor, que pela parte que me toca, também persigo uns quantos, mais ou menos ambiciosos. Mas ainda assim, perturba-me esta constatação tardia de que o caminho para si não era aquele, quando o que já se construiu, lhe permite a ele seguir, e a ela, permite pouco mais do que ficar. Ou melhor, permite seguir, mas devagarinho e com cuidadinho.
Nestas alturas penso sempre o mesmo, coisa monótona esta, que se me instala por vezes. Que Deus, só pode mesmo ter sido Homem. E que se a próxima não for Mulher, nem aceito voltar cá.
Crime, disse ela?
Esta coisa de criminosos a monte, é quase criminoso também. A sociedade, estranha abrangência onde nos inserimos, a medo ou não que estamos sempre lá na mesma, nem adianta não querer, é uma coisa estranhamente permissiva aos que lhe fazem mal. E cruelmente ameaçadora aos que a zelam e tentam manter a ordem e a coerência, debilidade tamanha esta. Vi-o ontem, ao fim do dia. Lá estava ele, dentro do seu Mercedes, de cigarro enfiado no canto da boca, com o aspecto ordinário de sempre, o ar de sempre e a vida de sempre. Ela mantém-se ausente, e quando regressar, que deverá ser breve, vai ter de conviver com a presença dele, como convivemos diariamente com a presença de corruptos, de incendiários, de outra gente violenta, e gentes assim, que a tal da sociedade permite com uma facilidade aflitiva. Ao fim e ao cabo, a vida de quem coagiu, de quem infligiu, de quem praticou os actos da chamada violência, que nem se sabe muito bem se é digna de nome, porque é a tal da delicada, que envolve esposos pelo que nos devemos abster, continua impune, continua a viver a sua vida doentia, mas permitida por quem de direito, e continua até, quem sabe, na busca de alguém mais a quem possa exercer os seus instintos de malvadez, de forma continuada.
Azar, tem quem está do outro lado, que decerto não mais terá sossego, na iminência de cruzar caminho com tal pessoa, que já tanto mal fez, mas que poderá ainda fazer mais, que nestas personalidades limite, o verdadeiro limite, está muito além do que se imagina. Até porque, nesta gente que nem isso é, a perca, por perca que seja, é pequena de mais para limitar actos. E a humilhação da denuncia, por demais grande para se tolerar.
E assim continuam as notícias que dão que falar.
Azar, tem quem está do outro lado, que decerto não mais terá sossego, na iminência de cruzar caminho com tal pessoa, que já tanto mal fez, mas que poderá ainda fazer mais, que nestas personalidades limite, o verdadeiro limite, está muito além do que se imagina. Até porque, nesta gente que nem isso é, a perca, por perca que seja, é pequena de mais para limitar actos. E a humilhação da denuncia, por demais grande para se tolerar.
E assim continuam as notícias que dão que falar.
sexta-feira, 13 de agosto de 2010
...
"Josefa, 21 anos, a viver com a mãe. Estudante de Engenharia Biomédica, trabalhadora de supermercado em part-time e bombeira voluntária. Acumulava trabalhos e não cargos - e essa pode ser uma primeira explicação para a não conhecermos. Afinal, um jovem daqueles que frequentamos nas revistas de consultório, arranja forma de chamar os holofotes. Se é futebolista, pinta o cabelo de cores impossíveis; se é cantora, mostra o futebolista com quem namora; e se quer ser mesmo importante, é mandatário de juventude. Não entra é na cabeça de uma jovem dispersar-se em ninharias acumuladas: um curso no Porto, caixeirinha em Santa Maria da Feira e bombeira de Verão. Daí não a conhecermos, à Josefa. Chegava-lhe, talvez, que um colega mais experiente dissesse dela: "Ela era das poucas pessoas com que um gajo sabia que podia contar nas piores alturas." Enfim, 15 minutos de fama só se ocorresse um azar... Aconteceu: anteontem, Josefa morreu em Monte Mêda, Gondomar, cercada das chamas dos outros que foi apagar de graça. A morte de uma jovem é sempre uma coisa tão enorme para os seus que, evidentemente, nem trato aqui. Interessa-me, na Josefa, relevar o que ela nos disse: que há miúdos de 21 anos que são estudantes e trabalhadores e bombeiros, sem nós sabermos. Como é possível, nos dias comuns e não de tragédia, não ouvirmos falar das Josefas que são o sal da nossa terra?"
Ferreira Fernandes no DN de ontem
Ferreira Fernandes no DN de ontem
Sôfrega
E ainda é tempo de pensamento, como se nesta vida, veloz como só ela, nos pudéssemos dar ao luxo de muito pensar sobre uma mesma coisa, que não anda nem desanda. É normalmente pela manhã, ao contrário da maioria das gentes, que usa e abusa do travesseiro como embalo e depósito de decisões importantes, que se debruça seriamente, porque se dá melhor com a fresquidão matutina do que com o calor da noite, de um abafado incómodo que em nada vale às conclusões que quer ter. A varanda é um sítio privilegiado, de boa vista, onde as árvores e o canto dos pássaros a despertam o suficiente, para se entregar aos mais recônditos lugares da sua alma. Logo em seguida, e porque o quase que tem é um quase menos mau, pega em si e no que se permite levar consigo, e segue para a vida de sempre, quase esquecendo a divagação matinal, já parte do seu dia, como se, o que o pensamento lhe dá, constitua já um enchimento, ainda que apenas e só em dimensão interior. Vivemos tanto nela. Entra então no corrupio do dia, que a embala numa roda viva sem fim, quase suficiente para a distrair, que não fosse um ou outro pormenor, e nem se lembraria do que lhe inquieta a existência, todas as manhãs. Até na noite, aquando da sossega, se consegue dissuadir dos pensamentos, porque a novela ainda a acompanha com histórias de amor que nem são dela, muito mais fáceis de viver. Entre um chá e um sconne, pergunta-me, num raro momento de lucidez às cinco, que faça ela, que nem está plena, porque algo lhe falta, quando o que já tem, ainda que não suficiente, já se pode chamar de tanto. E pergunto também eu, que fazer, quando não se atinge a tranquilidade da existência, e quando o equilíbrio do que se tem e do que se quer, parece não chegar nunca? Depois desta ainda há pouco, leio na Sandra, quase agora, algo do género, e penso para mim, sem encontrar resposta que me satisfaça. Sou sôfrega, uma eterna insatisfeita também eu, neste lugar onde o muito e o nada, o tanto e o tampouco, o sempre e o nunca, se misturam lânguidamente e nos deixam a nós, pobres mortais, na sua completa mercê, não raras vezes, em estado de perca. Ai, se me encontro.
quinta-feira, 12 de agosto de 2010
Meter o nariz

Não simpatizo propriamente com a ideia de roubar o sal ao pão. A saúde alimentar, é uma responsabilidade do próprio. Na padaria que frequento, de padeiro simpático, como já por cá referi, havia pão com sal, meio e sem. Eu gosto de pão com sal, e gostaria de continuar a comê-lo. Quem não gosta, comeria sem, como já podia comer antes. Quem gosta de sal, não come no pão, come no que lá põe dentro, que pode ir do chouriço Alentejano, ao Queijo de Nisa, bem puxadinho por sinal, ou em qualquer outro sítio. A isto chamo, meter o nariz onde não são chamados. Se há coisa que gosto, é de comer o que me apetece, como, onde, e quando me apetece, com os limites que eu própria me imponho, e chego bem.
Já agora, cuidadinho Pastéis de Belém. Qualquer dia, roubam-lhes o açúcar a prevenir a diabetes.
Percas, ou o que se queira chamar...
E eis que quando julgamos já tudo ter visto, numa presunção deveras tamanha, pela impossibilidade de o ser, vimos algo que julgaríamos impossível de ver, pela baixeza a que se chega pelo amor ao dinheiro. Já muito assisti quando se chega à hora de dividir bens, em heranças ou outras distribuições. O ser humano, mesquinho que é muitas das vezes, emaranhasse em terrenos ignóbeis pela avareza da posse, do que nem era seu e poderá vir a ser. Zangam-se irmãos, iram-se cunhados, ferem-se sentimentos de formas atrozes, só por míseros palmos de terra, como se esses, nos dessem o bem supremo da felicidade, e como se valessem as quezílias criadas, intransponíveis e eternas, por se ficar com um chão maior, só porque sim. O bom senso, expressão simples de proferir, mas por vezes tão difícil de conseguir, deveria ser obrigatório na nossa natureza. Lembra-me a guerra criada bem perto, por um metro de terra, que um marco que se sumiu marcava, dizem uns aqui, dizem outros ali. Daí, adveio um desassossego tremendo, uma polémica ainda sem fim à vista, por algo que não trará grande proveito nem a um, nem a outro, a não ser o orgulho da vitória e da alheia derrota, como se isso, de algo valesse. Porque perder nem a feijões, há quem diga. Sou demasiado boa a perder, digo eu muitas vezes. E sou assim em tudo, nem sei se com pena se não.
Livros
quarta-feira, 11 de agosto de 2010
Fiel amigo
Dias estranhos
Às vezes, até percebo quem deles foge a bom fugir. Hoje pela manhã, encontro a Dona Etelvina a coçar desmesuradamente a sua pele branca, já vermelha de tanta esfrega, porque as melgas a comeram de noite. Enquanto levanta a saia, o saiote, e puxa as meias para cima, nem dá conta de que a dentadura lhe cai pelos beiços, já alvacentos e relaxados, incapazes de segurar tamanha envergadura. Quando levanta os olhos para me olhar, tem a dita, pertença à parte de cima da sua cavidade bucal, meia de fora e meia de dentro, enquanto nos entremeios se detectam restos de papo seco do pequeno almoço, já semi mastigados. Quis por força que lhe espreitasse as pernas e as malditas borbulhas que lhe atentavam a alma, mesmo enquanto abanava os dentes, bem em cima da minha cabeça, acabada de lavar, e do meu pescoço perfumado com Eternity. De nada me valeu explicar, que não sou Enfermeira, e que em nada lhe valho, no que toca à assanhada fogagem, que teria de ser o Senhor Doutor, a vê-la mais logo, a fim de lhe passar um receituário eficaz, que lhe traga a merecida sossega. Infeliz sorte a minha, que nestas coisas dos males, com ou sem perceber, tenho por obrigação imposta um primeiro contacto, seja o mal onde for, ataque ele pés, pernas, ou regiões mais recônditas e de devido recato.
Há dias que começam de forma estranha.
A eminência de levar com uma dentadura, parece-me ter cabimento neles.
Há dias que começam de forma estranha.
A eminência de levar com uma dentadura, parece-me ter cabimento neles.
terça-feira, 10 de agosto de 2010
Proveitos
É bem certo, que nesta vida, tudo de bom tem um lado contra, e também o inverso, ou seja, quando algo de ruim acontece, bem esmiuçado, encontramos proveito, mesmo que assim não pareça. Ainda me lembro da minha avó, que atribui à amante do meu avô, o facto deste se ter livrado do internamento no Júlio de Matos, na época ainda bem no activo. Senhor Manuel adoecia com frequência deste e daquele mal, que ninguém via senão ele, o pobre coitado, que passava horas a fio defronte ao espelho, a analisar a língua, que houvera de ser rosa, e estava branca, e o branco do olho, que houvera de ser branco e estava raiado, tudo, devido a uma poderosa enfermidade que ninguém diagnosticava. Quiçá, seria até desconhecida do velho Doutor, que na época se deslocava a casa, de ar já gasto e cansado, e que se mostrava muito pouco atento às evoluções das maleitas e das pestes trazidas de fora por este e por aquele, que bem certo seria, que aquelas coisas das emigrações, tão em uso por lá, traziam doenças sem fim, aos pobres povos que ficavam na terra. Nem atingia a dimensão da coisa, dizia o Senhor Manuel, que estava já quase de pé para a cova, ou melhor, de pé para o Júlio, que o Doutor afinal nem era parvo, não fosse a airosa Senhora, que se chegou perto, e lhe lavou a alma. Uma bênção continua a dizer minha avó. Dona Maria, ainda hoje mantém contacto com a dita Senhora, tal a gratidão sentida, sem nunca se ter mostrado sabedora do adultério, fazendo questão de a presentar com almoços dignos de Rainha, aquando das festas da aldeia, ou dos anos do seu Manel.
Esta realidade bem próxima revolta-me o pensamento, de tanto que a quero crer. Preciso de ver lados bons, de coisas menos boas, que parecem ser algumas. Ou pelo menos acreditar que estão lá.
Atenção, e só num aparte, a história parece exagero, mas em nada o é. Ainda assim, só lhe tento aproveitar o ensinamento, que só mesmo Dona Maria, Senhora minha avó, para ver o lado bom desta coisa, que eu, nunca o veria. Para além disso, o Júlio é lindo e cor de rosa. E os Psicólogos de lá precisam de trabalhar.
Esta realidade bem próxima revolta-me o pensamento, de tanto que a quero crer. Preciso de ver lados bons, de coisas menos boas, que parecem ser algumas. Ou pelo menos acreditar que estão lá.
Atenção, e só num aparte, a história parece exagero, mas em nada o é. Ainda assim, só lhe tento aproveitar o ensinamento, que só mesmo Dona Maria, Senhora minha avó, para ver o lado bom desta coisa, que eu, nunca o veria. Para além disso, o Júlio é lindo e cor de rosa. E os Psicólogos de lá precisam de trabalhar.
Porcarias
Às vezes, poucas, felizmente, tenho sentimentos que não cabem em mim. Nem gosto especialmente de assim me sentir, que por norma, e quando tamanhos de mais, são penosos, que os prazerosos, nunca o são em demasia, e assim cabem sempre. Tivéssemos nós limites para o estado de felicidade, e talvez ela esbanjasse um pouco mais por aí, que de resto, e de tão solicitada, escasseia, como tudo o que se deseja muito, como o dinheiro, por exemplo. Ainda assim, e numa tentativa mais ou menos vã, depende, vou arrumando, acalcando, e distribuindo por dentro de mim, entre coração e cabeça, que é onde arrumamos sentimentos, o que de menos bom me acontece. É quando não encontro cabimento que fico assim a modos que perdida, e nem sequer gosto muito disto. O ser humano tem por inerência uma existência fluída, onde tudo deveria acontecer de forma mais ou menos natural, e onde estes encaixes internos, deveriam acontecer sem grandes mazelas. Quando arrumamos muito ao ponto de não caber, é porque andamos a arrumar demais, ou mal ou assim. Um dia tentei arrumar dentro de uma mala tanta coisa que ela rebentou pelas costuras, a pobre. Fui eu que não tive cuidado com a porcaria toda que lá meti dentro.
Remedeio

Ainda me lembro do fogo na encosta da serra, mesmo ao lado do lar, onde cerca de trinta jovens viviam. É deixar arder, dizia o comandante, numa prudência que na época, revoltou quem estava por perto, que aquela era a casa deles, que nunca tiveram outra. O envolto era agreste, porque o abandono das terras é uma constante, num Pais onde o remedeio soa bem, o que fez com que os acessos à encosta fossem quase impossíveis, dificultando e muito, o trabalho dos Bombeiros. Esta época do ano, em que ardem terras, bens, casas, e por vezes morre gente, tal como ontem, deixa-me sempre apreensiva, eu, que nem me dou bem com catástrofes naturais, que parecem por ora querer invadir-nos sobre diversas formas, todas elas implacáveis, como de resto, sempre são as catástrofes naturais. Talvez seja a impotência que sinto na sua beira, que me atinge, sim, deve ser isso. Pela manhã, oiço que São Pedro do Sul está controlado. Oiço ainda que na Rússia a situação continua devastadora. Regresso de novo à Quinta, e à evacuação dos miúdos, que pernoitaram no quartel dos bombeiros com uns olhos muito abertos, e que me perguntavam, de minuto a minuto, se podiam regressar a casa. Puderam, e ainda bem que sim. Quem de direito, pressionou os proprietários dos terrenos vizinhos a limparem os mesmos, no tal do remedeio, porque afinal ali, existia um Lar. Há muito, mas parece que só naquele dia se viu.
Hoje, no meu local de trabalho, residem cerca de 40 Idosos, muitos deles acamados. As silvas do terreno ao lado, invadem-me o jardim, e colam-se bem coladas, à parede da casa das caldeiras de gasóleo. O apelo aos donos, ainda que sem resultado, já foi feito à muito, e repetidamente. Já dei seguimento aos trâmites legais, que não sou cá de deixar assuntos a meio, mas a resposta continua ausente, e as silvas continuam cá. Que não seja preciso arder, é o que espero.
segunda-feira, 9 de agosto de 2010
Vidas assim
O Senhor J teve um acidente de trabalho. Coisa séria, de limitação permanente, sendo que a adaptação a uma nova vida sem braço, é algo que lhe está a dar cabo da cabeça, ou não fora Homem de trabalho, desde sempre na sua vida. Daqui decorre uma dupla falência, uma mais séria do que a outra, que o braço, esse não volta, ainda que em forma de fantasma, vá ironicamente, dando um ar de sua graça. A cabeça, por sua vez, ainda que mazelada por uma falta considerável, poderá restabelecer, assim esperamos nós. Isto de se perder um membro assume dimensões importantes a nível psicológico. À volta, logo surge quem diga, que morrer teria sido pior, e que a sorte andou por ali, como se isso, na hora da desgraça, desse algum alento a quem se encontra em desespero, e com um braço a menos para se fazer à malfadada vida. A quem não sabe o que diz, julgo que o melhor, será arrumar a boa vontade dentro de algo, e não dizer nada, e isto, a bem de todos, entenda-se, que não tenho particular interesse, pelos silêncios de ninguém. É que essa visão, a do podia ter sido pior, surge muito depois, se surgir, após a interiorização e aceitação, e não a quente, quando o que ainda apetece, é amaldiçoar o mundo e todos os arredores, e ainda quem verbaliza aquelas coisas, sem saber do que fala.
O difícil para mim, parecendo até menosprezo, perante toda a situação, detectar a mim mesma alguma dificuldade, é trabalhar-se a ilusão/desilusão, que anda intercalada, meio perdida, e pouco fundamentada, sendo que alterna alturas em que se julga capaz de tudo, com outras, em que se acha, capaz de nada. Na passada semana, trazia um sorriso nos lábios, porque poderia ser que a prótese, colocada lá para o final deste mês, ainda lhe permitisse conduzir, e assim seguir em frente. Hoje, trazia a tristeza de não conseguir abrir o pacote de açúcar só com uma mão, que neste café, aqui ao lado, o balcão é alto e não lhe dá a preciosa ajuda que o da terra lhe dá, para segurar o pacote com a barriga. Essa coisa, da ajuda, também o confunde. A mulher, dá a que pode, a pobre coitada, enquanto encaminha o negócio, com forças vindas sabemos lá de onde, e lhe atura as noites sem dormir, por força das dores, na costura, e no malvado que desapareceu, e que às vezes parece estar lá, o patife, tivesse ao menos, desaparecido de vez. Com frequência, também ela já dá de si, ou não fora gente.
No final, volta a falar do açúcar e do café, e acho que só ai percebi a dimensão do problema. Ou talvez esteja pelo menos perto.
O difícil para mim, parecendo até menosprezo, perante toda a situação, detectar a mim mesma alguma dificuldade, é trabalhar-se a ilusão/desilusão, que anda intercalada, meio perdida, e pouco fundamentada, sendo que alterna alturas em que se julga capaz de tudo, com outras, em que se acha, capaz de nada. Na passada semana, trazia um sorriso nos lábios, porque poderia ser que a prótese, colocada lá para o final deste mês, ainda lhe permitisse conduzir, e assim seguir em frente. Hoje, trazia a tristeza de não conseguir abrir o pacote de açúcar só com uma mão, que neste café, aqui ao lado, o balcão é alto e não lhe dá a preciosa ajuda que o da terra lhe dá, para segurar o pacote com a barriga. Essa coisa, da ajuda, também o confunde. A mulher, dá a que pode, a pobre coitada, enquanto encaminha o negócio, com forças vindas sabemos lá de onde, e lhe atura as noites sem dormir, por força das dores, na costura, e no malvado que desapareceu, e que às vezes parece estar lá, o patife, tivesse ao menos, desaparecido de vez. Com frequência, também ela já dá de si, ou não fora gente.
No final, volta a falar do açúcar e do café, e acho que só ai percebi a dimensão do problema. Ou talvez esteja pelo menos perto.
domingo, 8 de agosto de 2010
Companhias, lições e de como a imperfeição também pode ser quase perfeita
Ela tem quarenta e muitos, ele tem trinta e poucos. Ela tem uns olhos azuis lindos de morrer, ele tem uma pele preta, sendo que maior negrura, seria difícil. Encontraram-se, apaixonaram-se, partilham o que esta vida lhes dá e o que já lhes tirou, que não é tão pouco como isso, e essa ausência, a do que a vida nos leva, também é para partilha, ai se não é, que tão bem sabe, ter quem nos conheça as percas. O desafio a quem os circunda foi grande, até porque inúmeras outras diferenças existem, nomeadamente níveis culturais e posições sociais, aquelas coisas que as pessoas tanto gostam de analisar, criticar quando não combina, como se os amores, fossem assim, uma coisa que tem de fazer pendant, como a calça e o casaco ou o sapato e a mala. Os Pais dela, ricos Senhores, por fora, bem que se entenda, rejeitaram, como de resto, ela já esperava. Quem os cruza, às vezes bichana, alguma coisa que anima quem diz, mas que a eles, não aquece nem arrefece, que estão por demais entretidos com a mão na mão do outro, para se atingirem com estas mesquinhices alheias de quem mais não tem que fazer, e que de resto, nem bem abrange a plenitude do que lhes vai na alma.
Por isso, deixam falar, que é a ignorância, e a ela, também tenho por certo, que nunca a conseguiremos calar. O futuro, nem lhes importa muito. Importa-lhes mais o presente, que encaram como isso mesmo, um presente, dado pela vida que já tanto lhes tirou e que agora resolveu dar-lhes. A companhia um do outro.
E tenho para mim, que nenhum outro presente os aprazia tanto.
Por isso, deixam falar, que é a ignorância, e a ela, também tenho por certo, que nunca a conseguiremos calar. O futuro, nem lhes importa muito. Importa-lhes mais o presente, que encaram como isso mesmo, um presente, dado pela vida que já tanto lhes tirou e que agora resolveu dar-lhes. A companhia um do outro.
E tenho para mim, que nenhum outro presente os aprazia tanto.
Toy Story
Pela força das circunstâncias, uso e abuso de cinema infantil. Toy Story 3, ficou no pódio, logo a seguir a Up, e a Ratattouille. Recomenda-se. A miúdos e graúdos.
Ao Domingo de tarde é que não é uma boa altura, e esse ensino, parece que ainda não tomei.
Ao Domingo de tarde é que não é uma boa altura, e esse ensino, parece que ainda não tomei.
Borboletas...
A casa estava invadida de borboletas de tamanho reduzido, vindas de uns cereais esquecidos pela pobre Senhora, que em tanto pensa, esqueceu aquilo. Já se tinha desdobrado em encontrar de onde lhe vinha tamanha bicharada, que incluía, para além do bicho de asas, umas pequenas lagartas que lhe subiam ao tecto, numa provocação eminente, que ela já lhes havia tentado o extermínio, mas não estava fácil. A cada dia, pela manhã, dezenas delas, já deambulavam por lá, sendo que já tinha espiolhado o cesto das batatas, das cebolas, da fruta, e quase todos os géneros que tinha em casa. Já tinha ainda dado cabo do pau da esfregona, que desfaleceu de tanta lida, o coitado, que mais não fazia há dias consideráveis, do que martelar no tecto, vezes sem conta, e sem dar conta do recado. A minha entrada foi a medo, que já tinha ouvido falar da praga, e estava deveras perturbada com a eminência de conviver de perto com aquela bicharada que voa, e que me pode atingir, de forma brutal e à minha completa revelia. Pensei que teria de descobrir o ninho de tão valente peste, e com jeito e paciência, encontrei-o, bem repousado dentro de uma cesta de cereais. O rebento olhou-me sempre de perto, percebendo a minha aflição, tais os meus tremelicos, que se viam a olho nu, pronto a saltar em meu socorro, que isto de se ter filho Homem, tem as suas vantagens. O difícil, pela enésima vez, foi a tentativa de lhe explicar o meu pavor aquele insecto, que segundo ele, é inofensivo. Nem percebo como é que ele pode achar isso.
sábado, 7 de agosto de 2010
Hoje quase que sim
Ainda que com um nome estratégico neste meu espaço, sei que minto, como também mentiria se em vez de Mulher usa-se Homem. Confesso-me mais atingida pelas deles, que por norma, nem as soltam assim ao desperdício, ou por alterações hormonais, que nestas coisas das hormonas temos azar, diga-se, a bem da verdade. O choro dos Homens é sério, e este, acertou-me em cheio. Desiludiu-se, que se faça, que neste mundo, o que mais por aí existe, são desilusões, que sempre magoam, e sempre melindram. Piora, muito, quando a desilusão nos chega pelas mãos de alguém que se tem em elevada conta, por circunstâncias da vida, já antigas. Perdeu o filho em tempos, numa morte estranha e sem sentido, se é que isto se pode dizer da morte. Uma morte que chegou cedo, como sempre chegam as mortes que levam filhos antes de pais. Morte chorada, sofrida e negada, que negamos todas, quanto mais as que aparecem precocemente, e que levam daqui para outra parte, alguém que ainda não queremos deixar ir, porque aqui ainda pertencia, ou pelo menos, assim julgamos nós, e a nossa extraordinária ignorância. De perto, ficaram amigos e outros. Nesta coisa das amizades, umas são reais, outras são qualquer coisa, que nem sei que chame, que de tão fátuas, nem me surge nome que as baptize, a não ser impropérios, que não me aprazem usar aqui e agora. São uma proximidade, isso são, uma partilha de vida, de perto, muito de perto, que existe por fora, apenas e só por fora. Mas quem frágil está, sente por dentro, terrível situação esta, que por vezes nos sucede, de diferentes perspectivas numa só dimensão, e que nos acarta por norma sofrimento, venha ele cedo, venha ele tarde. Este veio tarde, poderia ter vindo antes, se a clarividência surgisse. Não surgiu porque a crença era grande, porque ele era o Amigo, e porque existia como um prolongamento diário de alguém que se foi, e que nem deveria ter ido, claro que não deveria.
Numa postura que ainda tento, de encarar factos, ainda que cruéis, inundados de sentido, consigo ainda pensar, que a tal da malfadada desilusão, tenha até talvez chegado na hora certa, quando a estrutura de quem perdeu, ainda que em permanente ruína, já se encontra um nada mais restabelecida. Pior, é que de imediato me surge, que nunca, por nunca ser, se restabelece de uma ruína assim. As lágrimas brotaram-lhe, só podia. Eu ouvi, e quase chorei também.
Numa postura que ainda tento, de encarar factos, ainda que cruéis, inundados de sentido, consigo ainda pensar, que a tal da malfadada desilusão, tenha até talvez chegado na hora certa, quando a estrutura de quem perdeu, ainda que em permanente ruína, já se encontra um nada mais restabelecida. Pior, é que de imediato me surge, que nunca, por nunca ser, se restabelece de uma ruína assim. As lágrimas brotaram-lhe, só podia. Eu ouvi, e quase chorei também.
sexta-feira, 6 de agosto de 2010
Momentos
Chego a casa, finda a semana de cão. Ou melhor, nem finda, que o fim de semana também se quer activo, só porque tem de ser. Quando o que mais me apetece é entregar-me a nada, eis que o rebento dá um ar de sua graça, porque a noite está fresca e a jogar à bola é que estaríamos bem. O negócio rende mais ou menos, que nesta vida de mãe de rebento Homem, a negociata é uma constante, pelo que vou deambulando, de forma mais ou menos airosa, entre Nintendos, Bolas, Gormittis e Cromos do Mundial (a estes bania-os, juro). Vamos lá fora, mas jogas sem mim, boa? Ele acede, e lá vou eu, com um livro debaixo do braço, os óculos no nariz, e um chinelo no pé.
Recosto-me numa árvore, o pequeno chuta na bola, e eu sinto que estou num dia bom. Ainda que em densa conjuntura, naquele momento, não precisava de nada mais para além daquilo.
Recosto-me numa árvore, o pequeno chuta na bola, e eu sinto que estou num dia bom. Ainda que em densa conjuntura, naquele momento, não precisava de nada mais para além daquilo.
O Bom Inverno
Educação
De facto a crença em algo tem um poder infinito. Ou quase, pronto, que palavras fortes, nem me são aprazíveis. Lembro-me, no decorrer da conversa sobre atitude, da Drª Helena Marujo, da qual já por cá falei. Pioneira da Psicologia Positiva no nosso País, muito tem feito para animar as escolas, e para dotar as nossas crianças de atitudes positivas e proactivas, tão em desuso as temos por cá. O investimento parece quase fácil, mas julgo-o deveras ambicioso. Porque mexe com mentes, e as mentes do nosso País são negativas, admitindo as excepções, com pena minha. Continua fácil, encontrar um professor destrutivo, em detrimento de um construtivo, é mais frequente surgir a crítica do que o elogio, e é mais fácil à criança acreditar no que é mau, do que no que é bom, consequência destes meandros intrínsecos da sociedade, pelo que as mentalidades vão avançando assim. Quebrar, parecer-me-ia palavra de ordem, mas muito tem de ser feito. Nem sequer é um muito difícil, ou impossível em si, mas é um muito que necessita de investimento, empenho e crença em quem temos na frente, e pressupõe mudanças de fundo. O mote da conversa, foi, como não podia deixar de ser, as novas medidas propostas pela nossa Ministra da Educação, que fala da ausência de chumbos como uma possível solução ao insucesso, assunto que me interessa em demasia, ou não fora eu da área, é bem que diga. Já me apercebi de inúmeras críticas, mais ou menos fundamentadas. As medidas são ambiciosas, como têm ser ser, para objectivos ambiciosos também eles. Mas a ambição, se não desmedida, pode ser uma mais valia, constituindo muitas vezes o único caminho. As adaptações a serem feitas são mais do que muitas, mas não impossíveis. O processo é moroso, não sabemos se eficaz, mas as esperadas melhoras seriam benvindas, e parecem-me ideias sustentadas e não descabidas. Como sempre, estamos também aqui, perante a tradicional visão negativa que acarta por norma a mudança, na qual temos poder, mas quase esquecido, como se ele, de nada valesse. Sempre se chumbou, o que é isso de agora deixar de se chumbar? Que fazer aos alunos que não atingem os objectivos e são mestres de indisciplina? Parecia-me prudente inverter o discurso. E pensar, por exemplo, que uma criança investida e pensada na sua problemática particular tem outras pernas para andar, e porque não, outra vontade em fazê-lo. E que o único objectivo, o sucesso, pode incentivar percursos até então desinvestidos, que acreditando nele, temos o tal do meio caminho andado. E que se cresce melhor com o avanço, e com o vamos seguir em frente, admitindo e considerando as devidas ajudas, do que repetindo processos, às vezes já massacrados, porque os objectivos não foram atingidos.
Mas isto são apenas pareceres. Os meus pareceres.
Mas isto são apenas pareceres. Os meus pareceres.
quinta-feira, 5 de agosto de 2010
O Padre Diogo
Fui à minha mãe, que mora envolta em santidades. Mesmo ao lado moram as Freiras, Irmãs Carmelitas, que rezam, cuidam enfermos, e ainda apoiam velhinhos. Bem defronte, surge a igreja, que toca o sino de hora a hora, e onde o Senhor Padre Diogo, reza a missa diariamente. Hoje dei de caras com ele, Homem já de idade, que apesar de me ter casado, e de me ter baptizado o filho, já de mim não lembra, que de resto, nem lhe povoo as missas ou confissões que o justifiquem. O Padre Diogo é um típico Padre. Daqueles de boa índole, que fala pausadamente, nos sorri enquanto prega, e nos transmite uma qualquer paz, independente da fé. Nem falando aqui de religiões particulares, admitindo as diversas que existem, tenho para mim que os Messias, Presbíteros, ou outros que tais, necessários ao bem estar da Humanidade, nem interessa porquê ou porque não, interessa que são, todos o sabemos, deveriam ser sempre pessoas de paz. Tenho conhecido mais Padres do que Freiras assim, que pela parte que me toca, e se me debruçar sobre o assunto, nem entendo muito bem o que leva determinadas personalidades, para absolutas Servas do Senhor. Como percebeis, vivias de perto. Vi de todas e mais algumas, que a mando de minha mãe, presenteava-as com frequência, com frascos de mel, bolinhos secos, e outros acepipes, levados especialmente por mim, nem sei bem o porquê. Sei que as há de bom coração, boa vontade e dedicação, como as há de espírito revolto, digo eu, sem saber se será isso. Poderá também ser ou um qualquer outro mal, que as tenha assolado, e levado para aquele caminho, por ausência de outro, mais prometedor. A Irmã Rosa, por exemplo, que me leccionou Religião e Moral, e que despejava páginas inteiras de matérias que teríamos de decorar, sem perceber o porquê ou o para quê, que nada disso importava, é um desses casos. Enchia-nos a cabeça de sapiência que nunca utilizaríamos, porque rapidamente esquecíamos, que o que assim se aprende, depressa se esvai, e sem qualquer proveito. Diziam as mais pacíficas, que com ela privavam, que ela tinha uma personalidade conturbada, que manipulava a irmandade, ao sabor das suas vontades. E que ao pé dela, ninguém tinha paz, tamanha incongruência esta, de alguém que diz acartá-la consigo, na reza e na vida. Já tenho pensado, que levará pessoas a tentar pregar o bem, quando nem é o bem que lhes povoa a alma.
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Acabei de desejar boa viagem à minha amiga S. Vai até Frankfurt, e vai muito bem, que vai de boa companhia. Tive vontade, e cedi em lhe dizer o quanto gosto dela. Em tempos, chegava a ter dificuldade em manifestar algum tipo de sentimentos. Nem sequer sei muito bem explicar o porquê, que sempre fui de afectos, dados e recebidos, não encontrando pois aqui cabimento, para as minhas mais estapafúrdias teorias da psicologia. Certo, é que me acanhava numa vergonha sem qualquer sentido, em vez de expressar o que me ia na alma. Com o tempo, a idade, vá, que já cá canta, surgiu o oposto. Um não perder a oportunidade de lembrar a quem gosto que gosto, sem julgar uma lamechice.
quarta-feira, 4 de agosto de 2010
Infidelidades
Nem sequer me parece que ele a mereça, que nestas coisas dos amores, deveria existir mais justiça. Assim como que uma divisão mais perfeita, em que bons ficassem com bons e maus ficassem com maus, e quem diz isto, diz outros emparelhamentos, que muito sofrimento se aboliria, muita felicidade surgia. Não temos perfeições, bem certo, e como tal, sujeitamos-nos também aqui às vicissitudes mundanas, onde o calhar o fado e a sorte, têm um papel tão estranho, como determinante. Mas adiante. Ela até lhe perdoa os pecados. Ama-o com força, a ele mesmo, não ao que o circunda, que amores destes são os verdadeiros. Tem-lhe uma dedicação de morte, como de resto, faz parte dos amores femininos, facto que ainda me transcende. Julgo vir de cedo, desde o nascimento, à educação, passando pela maternidade, e pelo envolvimento do afago, que sempre nos tolda. Continuamos a educar de forma diferente homens e mulheres, que não me venham com tretas, o que, juntamente com a a vertente genética, nos deixa a nós neste estado, como se dele não nos fosse possível escapar. A dedicação que ele lhe dá, é já uma dedicação menor. Uma dedicação típica dos homens, que salvando as devidas excepções, dedicam-se de outra forma. A dedicação primeira é a si, e só depois surge a dedicação ao outro, o que de resto, bem que se entenda, nem é uma crítica, mas uma constatação, que certos são eles, e as erradas somos nós. Para além disso, e aqui me debruço sobre a situação com outro afinco, tem outros pecados intrínsecos que não consegue fugir. Destacam-se os rabos de saia, se é que me explico, que ele diz que nem é amor, mas sim algo que nasceu com ele, inerente à sua existência, e que em nada influencia sentimentos. Surge assim, raramente, mas quando surge, surge em força, não se controla. As desculpas a ela, quando sabedora, surgem sempre depois. Ela, na sua dedicação vai desculpando, num estado mais ou menos limite, com um amor supremo e um fardo tamanho, do hoje estas comigo e amanha estás com outra, que te passe ao lado e te sacuda as entranhas, como se uma relação de cumplicidade assim pudesse fazer-se. Porque ele diz que a ama, a ela, e quase parece real, e se calhar, nem culpa tem, mau agoiro da luxúria que lhe atravessa o caminho.
E será, por certo real. Até consigo achar que ele lhe julgue amor, quando lho profere. É tão, mas tão fácil julgar amor.
E será, por certo real. Até consigo achar que ele lhe julgue amor, quando lho profere. É tão, mas tão fácil julgar amor.
terça-feira, 3 de agosto de 2010
Casamentos
Assim de repente, apetece-me falar disto. Porque já gosto da onda da paixonite, porque leio nas Antagoníces o Amor, no Público os vestidos de noiva, e é verão, está calor e ainda há gente que casa, um bem haja a ela. No dia do meu a coisa foi gira que se farta. O vestido era monumental, e se me casasse agora, conseguiria casar-me com ele de novo, que me parece assim qualquer coisa de intemporal. Foi escolhido a dedo, e tinha tudo a ver comigo. As teorias dos casamentos em desuso, só porque existem divórcios, de facto não me parecem muito bem. Cheira-me aquelas conversas da treta, em que não se deve fazer o que se vai desmanchar em seguida, como a cama, e essas coisas. Ora eu não partilho nada com essas boas práticas, pelo menos no que toca às emoções, do certinho e direitinho e do vamos lá poupar tempo, dinheiro e assim, e então há que não fazer, para depois não desmanchar. Mas há lá coisa mais linda que um casamento, quando duas pessoas se amam? Haverá no mundo dia mais feliz (superado apenas por nascimentos de rebentos), do que aquele em que dizemos sim, olhos nos olhos, mão na mão, de sorriso parvo e de crença perfeita naquele sentimento intimo e fulminante, que nos sustenta no ar com se de algodão fossemos feitos? Existirá maior satisfação para a vida de uma Mulher, do que receber no dedo a aliança que diz que sim, que já casamos e que a partir de agora temos marido? É pá, não há. Perdoem-me lá quem se ache da era do moderno, do ajuntamento, que me teria sido benéfico, claro que sim, na altura do apartheid, que me levou uns bons trocos para ficar consumado, é um facto. Mas ainda assim, e apesar da chatice do divórcio, de ter div escrito no BI (vale-me para o futuro o cartão de cidadão), e de ter ficado com sogra, sogro, cunhados e outros apêndices, foi um dia lindo, inigualável e inundado de um amor e de uma paixão enorme. Naquele dia, naquela data. Fui tão feliz ali. Quanto ao vestido, está num armário perdido. Não tenho filhas a quem o deixar, mas isso também não importa nada. Importa-me sim, o dia que passei com ele no corpo. Não foi para sempre, é certo. Mas na altura, eu nem sabia disso.
H
O Homem, com H grande é de facto incompreensível. Percebi isso, quando num limite de loucura, comecei a tentar entendê-lo, julguei-me por demais poderosa, eu sei. Fascina-me no entanto a magia, que nos cerca bem de perto, e nos torna únicos, e consequentemente, tão especiais. Lemos, relemos, analisamos e julgamos concluir interiores, para num instante percebermos, que nos encontramos muitas vezes, redondamente enganados. Às vezes, até mesmo com a nossa pessoa, e aqui sim, chego a assustar-me.
Aviadores
segunda-feira, 2 de agosto de 2010
Dádivas

O Senhor Manuel, nome fictício, diz-me então que já não se zanga, que apenas se desilude. Nem sei bem como aqui se chega, nem consigo a real percepção, de se constituirá eventualmente um benefício. Por este Mundo, parece-me por vezes sensato, ou pelo menos causador de alívio, bramar meia dúzia de impropérios, dizer isto ou aquilo, a fim de se esclarecer o que tem de ser esclarecido, quando a zanga nos invade a alma. Diz-me ele, que nada assim é, e que as ditas mais não faziam, do que tirar-lhe o sossego a si, sendo que ao outro, pouco atingiam, que quando a consciência é pequena, é pequena e pronto, e não aumenta, com o praguejo alheio. E quem diz praguejo, diz indiferença, ou outra manifestação. Vai-se então, que serenou, e consegue proteger-se, ainda que com alguns percalços, que como bem sabeis, perfeições nem existem, e há sempre quem lhe falte, quando ele esperava amparo. Em tal acontecimento, resta-lhe alguma desilusão, que de resto, já nem é muita, força do hábito. Mas à zanga, à verdadeira, recusa-se, que a sua serenidade interior ganhou com o assunto, livrando-se em muito de picos de tensão, apertos no coração, e males assim, que decorriam do estado de alteração a que se sujeitou em tempos de moço, que anos de vida lhe tiraram, e pouco lhe trouxeram. Podia até nem ter diagnosticado a maleita, poderia ainda não lhe dar vencimento, que não raras vezes, nos caminhos desta vida, sabemos o mal, sabemos a cura, e nem por isso conseguimos remedeio, por isto ou por aquilo, que a causa nem importa muito. Diz-se feliz por ter conseguido, que assim como assim, a desilusão nem o mazela tanto como a zanga, até porque, mesmo quando se zangava, a desilusão também aparecia, a omnipresente. Livrou-se de uma, portanto.
domingo, 1 de agosto de 2010
Vizinhanças
Na noite, que nem foi de insónia, as séries do costume, mais coisa menos coisa, que não varia muito. Entre umas de hospitais onde nasce e morre gente, numa provocação extrema à minha capacidade de resistência à emoção fácil, e as de investigação, mais ligeiras e menos lamechas, vai-se a noite, devagarinho, que é como se quer. No amontoado de prédios onde vivo, entre gentes que nem se dão a conhecer, tenho cada vez mais a sensação de gaveta, como se o facto de viverem mesmo acima ou abaixo da minha cabeça, e de eu lhes ouvir a torneira, quando o corpo vai a banhos, nada fossem. Ouve-se, nada se vê. Uma entrada na vida alheia um tanto ou quanto estranha, apenas e só com o sentido auditivo, que de resto, nem se pormenoriza muito, deixando-nos sempre a dúvida quanto ao concreto do que se ouve, permitindo até a imaginação. Ali numa gaveta mais ao lado, mora ela, uma das vizinhas, mais ou menos conhecida. Que nessa noite, essa em que eu assistia à televisão no calor da minha sala de verão, teve uma noite afligida, e eu que nem dei por isso. Podia até ter sido de valor, podia até ser, que a minha proximidade, ou a de qualquer outro alguém, a livrasse de algo, mas nada disso, que a proximidade física existe, mas com a devida arrumação, por forma a preservar ou quase a intimidade alheia, que também faço questão de resguardar, obviamente. Ambiguidades, por certo. Ainda assim, existem intimidades estranhas, que nem se deveriam dar ao nome, e a essas, nem sei que lhes chame, que não encontro cabimento. Crime público ou não continua a ser um conceito estranho. Como estranhas são as gentes que me circundam de perto. Como estranhas as gavetas onde moramos.
Desculpas
Uma desculpa é uma coisa esfarrapada, que normalmente soa a estranho. Quem gosta de as usar, deveria completar um bom treino em casa, sob pena de ser descoberto. O que a mim me transcende, nem será bem a palermice de quem as tenta usar comigo sem arte para o fazer. Mas sim o atestado de burrice que tentam passar-me, ao tentar tão deplorável coisa, com mau uso, diga-se, em vez da frontalidade. Com uma boa desculpa, terei o atestado na mesma, dirão por certo vocês, e bem. Correcto, mas nem dou por isso, e a coisa até talvez funcione, é a magia da ignorância, que é uma realidade, acreditem. Digamos que o ardil não é para todos. Deixemos então para quem pode, sim? Mas hoje é Domingo, e vou até ali relaxar.
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