sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Sôfrega

E ainda é tempo de pensamento, como se nesta vida, veloz como só ela, nos pudéssemos dar ao luxo de muito pensar sobre uma mesma coisa, que não anda nem desanda. É normalmente pela manhã, ao contrário da maioria das gentes, que usa e abusa do travesseiro como embalo e depósito de decisões importantes, que se debruça seriamente, porque se dá melhor com a fresquidão matutina do que com o calor da noite, de um abafado incómodo que em nada vale às conclusões que quer ter. A varanda é um sítio privilegiado, de boa vista, onde as árvores e o canto dos pássaros a despertam o suficiente, para se entregar aos mais recônditos lugares da sua alma. Logo em seguida, e porque o quase que tem é um quase menos mau, pega em si e no que se permite levar consigo, e segue para a vida de sempre, quase esquecendo a divagação matinal, já parte do seu dia, como se, o que o pensamento lhe dá, constitua já um enchimento, ainda que apenas e só em dimensão interior. Vivemos tanto nela. Entra então no corrupio do dia, que a embala numa roda viva sem fim, quase suficiente para a distrair, que não fosse um ou outro pormenor, e nem se lembraria do que lhe inquieta a existência, todas as manhãs. Até na noite, aquando da sossega, se consegue dissuadir dos pensamentos, porque a novela ainda a acompanha com histórias de amor que nem são dela, muito mais fáceis de viver. Entre um chá e um sconne, pergunta-me, num raro momento de lucidez às cinco, que faça ela, que nem está plena, porque algo lhe falta, quando o que já tem, ainda que não suficiente, já se pode chamar de tanto. E pergunto também eu, que fazer, quando não se atinge a tranquilidade da existência, e quando o equilíbrio do que se tem e do que se quer, parece não chegar nunca? Depois desta ainda há pouco, leio na Sandra, quase agora, algo do género, e penso para mim, sem encontrar resposta que me satisfaça. Sou sôfrega, uma eterna insatisfeita também eu, neste lugar onde o muito e o nada, o tanto e o tampouco, o sempre e o nunca, se misturam lânguidamente e nos deixam a nós, pobres mortais, na sua completa mercê, não raras vezes, em estado de perca. Ai, se me encontro.

2 comentários:

  1. Pois esses pensamentos a mim aparecem à noite, quando entrego a cabeça ao travesseiro. E é então que faço planos, revejo comportamentos, conjumino pensamentos. Felizmente ou infelizmente quando o sono ganha vai-se tudo, e no dia seguinte começa tudo de novo. Beijo!

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  2. Tem graça - não saio de casa sem beber o meu café sentada na varanda a gozar o fresco; a calmaria e o horizonte :)

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