Houve o dia em que se soltou de si mesma. Cansada que estava do encobre do que lhe ia dentro, muitas mulheres assim se encontram, homens, alguns, menos por certo, que há coisas que são muito nossas. Não se lembra de ter falhado a condição a que se propôs, naquele dia de Inverno em que envergou um vestido de noiva, e foi levada ao altar pelo seu pai, que a entregou com orgulho ao que foi seu marido, desde ai até agora. Os filhos vieram cedo, primeiro ele, depois ela, um casal, obra portanto concluída, sendo que por ali se ficaram, que a vida nem era de fartura, e o pão para a boca, era uma riqueza conseguida em esforço. Mãe era uma palavra cheia, que lhe acatava a existência, pelo que o recato, a casa, a lida dos dias, a ela chegavam, como se o mundo, fosse local que nem existisse, ou melhor, existia, um pequeno, o seu, lá da sua casa, da sua aldeia. O seu mundo.
Desde cedo lhe tinham ensinado a cuidar famílias, num zelo extremoso e imprescindível a quem quisesse constituir uma boa Dona de casa, que não julguem cá, não ser tarefa de nobreza, que o rigor necessário é de uma dedicação elevadíssima, embora muitas vezes desdenhado por quem não lhe reconhece o valor. Ela reconhecia, fazendo dele toda a sua existência, ora na cozinha, ora nos bordados, ora nas lidas domésticas, sempre realizadas no preceito, primeiro varre-se o chão, depois limpa-se o o pó, e por aí fora, que o que não falta, são sabedorias destas, hoje, já quase esquecidas.
Porém, surgiu-lhe um cansaço. Não assim, num repente de nada, mas miudinho, lento, um ligeiro incómodo que se foi desenvolvendo periclitante, num corpo que se queria cedido a uma realidade para sempre, por isso lhe ter sido ensinado, por para isso ter sido fadado, por esse destino lhe ter sido dado. A primeira reacção foi a negação efectiva do seu estado de indignação, que Mulher de M grande não se cansa nunca da sua devoção, pelo que o que se lhe acendeu, foi um sentimento de incompreensão por ela mesma, esposa dedicada, mãe extremosa, Mulher. Porém, e ainda que na revolta, já não lhe chegam a casa, os filhos adolescentes, o marido. Nem se percebe, nem se encontra, precisa, nem sabe do quê.
E pergunto-me como é possível a ambição por algo que nem se conhece. Respondo-me a mim mesma de imediato, que o que a atormenta, nem é a ambição por algo, mas o cansaço por tudo. Venha o que vier.
O que me faz reflectir... Todos os textos que aqui publico são de minha autoria, e as personagens são fictícias. Excluem-se aqueles em que directamente falo de mim, ou das minhas opiniões, ou onde utilizo especificação directa para o efeito.
domingo, 30 de janeiro de 2011
Ajudas preciosas
Saída das compras, mil sacos, paletes de leite, passa padrinho do rebento.
Cumprimentos, beijinhos às primas, olá tudo bem, e eis que diz o padrinho:
- Então J, não ajudas a mãe?
Ao que J. responde de ar indignadíssimo,
-Não ajudo???? Não vês que eu levo o jornal?!?!
Cumprimentos, beijinhos às primas, olá tudo bem, e eis que diz o padrinho:
- Então J, não ajudas a mãe?
Ao que J. responde de ar indignadíssimo,
-Não ajudo???? Não vês que eu levo o jornal?!?!
Entregas
Há dias, em que o cansaço a assola. Numa potência desenfreada, deixando-a numa inércia descabida, que o que mais lhe apraz nessas horas, curtas ou compridas, nem importa, é deixar-se sucumbir à sua mercê, aligeirar as forças e entregar-se sem limites. É talvez essa entrega que desde sempre lhe falta.
A entrega, é uma extraodinária capacidade humana, de nos deixarmos a nós para nos darmos a alguém, que nos segure, nos ampare as fraquezas, nos acuda em estados de aflição. Esse sossego conseguido, de quando a nossa mente descansa no calor da confiança, dá-nos uma força de alento que nos acompanha, permitindo que a carga dos dias alivie, de quando em vez, quando a fraqueza se insurge, quando a guarda descansa. Acontece a todos. Existe gente que nem bem tem em quem se encoste. Ou que tem, mas devagarinho, com algum cuidado supremo, não vá alguma coisa quebrar para sempre, e mazelar o encosto, que apesar de fraco, está lá, senão num amparo, talvez num consolo. É quanto basta.
Ela porém nada tem. Não há ninguém no mundo que dela se abeire para que lá possa descansar, é uma alma perdida, embora muitos a considerem de todo encontrada. Ironias. Não que o mundo nem lhe gire a envolta, não que as gentes não a circundem de perto, mas no entanto, o mais que lhe fazem, é em seu regaço sossegar, que quase parece, que nos lugares da terra, nem mais sítios existem assim, pela quantidade de almas perdidas que a ela socorrem, clara, ou discretamente, nem importa. O colo, esse, esta lá sempre, ora fraco, ora forte, depende, que ninguém nota mas a ela, pobre de Cristo, a qual julgam suprema, estes colos que dá saem-lhe de dentro da alma, exigindo-lhe uma força atroz e pungente, porque ao senão, incorre o risco de intranquilizar, quem com tanta ânsia a procurou. Não concebe tal coisa. Nem bem percebe porém, porque ninguém a encontra, porque ninguém a percebe frágil ao invés de forte, pequena ao invés de grande, pecadora ao invés de perfeita, carecida, ao invés de cuidadora. Houvesse alguém que lhe lesse nos olhos, a imensa carência, e poderia esse alguém estender-lhe um colo, uma mão que fosse, que lhe permitisse a ela o desleixo do sossego, uns minutos apenas.
Até hoje, nada. Quase se entrega à fraqueza.
A entrega, é uma extraodinária capacidade humana, de nos deixarmos a nós para nos darmos a alguém, que nos segure, nos ampare as fraquezas, nos acuda em estados de aflição. Esse sossego conseguido, de quando a nossa mente descansa no calor da confiança, dá-nos uma força de alento que nos acompanha, permitindo que a carga dos dias alivie, de quando em vez, quando a fraqueza se insurge, quando a guarda descansa. Acontece a todos. Existe gente que nem bem tem em quem se encoste. Ou que tem, mas devagarinho, com algum cuidado supremo, não vá alguma coisa quebrar para sempre, e mazelar o encosto, que apesar de fraco, está lá, senão num amparo, talvez num consolo. É quanto basta.
Ela porém nada tem. Não há ninguém no mundo que dela se abeire para que lá possa descansar, é uma alma perdida, embora muitos a considerem de todo encontrada. Ironias. Não que o mundo nem lhe gire a envolta, não que as gentes não a circundem de perto, mas no entanto, o mais que lhe fazem, é em seu regaço sossegar, que quase parece, que nos lugares da terra, nem mais sítios existem assim, pela quantidade de almas perdidas que a ela socorrem, clara, ou discretamente, nem importa. O colo, esse, esta lá sempre, ora fraco, ora forte, depende, que ninguém nota mas a ela, pobre de Cristo, a qual julgam suprema, estes colos que dá saem-lhe de dentro da alma, exigindo-lhe uma força atroz e pungente, porque ao senão, incorre o risco de intranquilizar, quem com tanta ânsia a procurou. Não concebe tal coisa. Nem bem percebe porém, porque ninguém a encontra, porque ninguém a percebe frágil ao invés de forte, pequena ao invés de grande, pecadora ao invés de perfeita, carecida, ao invés de cuidadora. Houvesse alguém que lhe lesse nos olhos, a imensa carência, e poderia esse alguém estender-lhe um colo, uma mão que fosse, que lhe permitisse a ela o desleixo do sossego, uns minutos apenas.
Até hoje, nada. Quase se entrega à fraqueza.
sábado, 29 de janeiro de 2011
Sophia
A Hora da Partida
A hora da partida soa quando
Escurecem o jardim e o vento passa,
Estala o chão e as portas batem, quando
A noite cada nó em si deslaça.
A hora da partida soa quando
As árvores parecem inspiradas
Como se tudo nelas germinasse.
Soa quando no fundo dos espelhos
Me é estranha e longínqua a minha face
E de mim se desprende a minha vida.
Sophia de Mello Breyner Andresen
Porque também a mim me apraz homenageá-la.
A/normalidade
Escrevi-o há tempos, num agradável convite de Pedro Correia, para o Delito de Opinião. Hoje, fez-me todo o senti-lo trazê-lo cá... Está entre aspas. Apesar de tudo, é pertença do Delito.
"Duvidei ter queda para isto, que desde sempre me testo, nem por encontrar incapacidades severas, mas talvez pela necessidade de sentir internamente, a prova mais do que provada de que as minhas escolhas são as escolhas que eu queria, se não para sempre, expressão traiçoeira e enganadora, como poucas o são, pelo menos no momento exacto da escolha.
Na pequena cidade, nem bem tinha noção do que me aguardava na grande, que ao ter sabido, por certo me teria intimidado, confesso, que nem nunca devemos julgar, que o desconhecimento não é nosso aliado, eu pelo menos, assim devo dizê-lo, que a conhecer previamente determinadas realidades, teria delas fugido a bom fugir, sem escolha efectiva, por assim dizer. Um desperdício. Nos caminhos desta vida, o receio do que se encontrará, em muito já nos castra, quanto mais se nos fosse fornecido previamente, por alguma entidade suprema, fantástica ou não, o enorme segredo, da consequência das nossas escolhas. Aquém estaríamos, nem duvido, que nos deixaríamos prostrar numa inércia descabida e exacerbada, válida apenas e só, para nos restringir a existência ainda mais, a par e passo com outras limitações, já por si determinantes. Seguimos pois na ignorância.
A primeira aula foi de um efeito tremendo, num auditório gigantesco povoado maioritariamente por mulheres, com um professor alucinado ao fundo, que falava de forma dúbia e penetrante, enquanto fumava cigarros acesos em escadinha, uns nos outros, se é que me explico. Após lhes dar o devido préstimo, que lhe aprazia por certo a existência, tal o delírio perceptível a olho nu, e numa ingratidão manifesta por tão profundo gosto, deixava-os morrer devagarinho, virados ao avesso, como se uma tortura lhes infligisse aos nossos olhos, que mais não faziam, do que mirar alternadamente, o seu ar lunático e insano, e os cigarros que se mirravam, em processo longo e penoso, até se esgotarem em cinza. Dentro dos olhares que se trocavam, nos quais incluo os meus, consegui ler incertezas, dúvidas e acima de tudo receio, de termos chegado a um mundo hostil, onde quem supostamente nos ensinaria a ajudar o outro, carecesse por sua vez dessa mesma ajuda, numa frágil teoria naife, como se a nossa mente assim fosse, de leitura fácil e simples de catalogar, sendo que nós constituíamos os alunos certinhos, bem defronte ao professor maluco, que comia cigarros enquanto falava, de olhar vidrado e vazio, como se na sala, apenas ele e eles existissem, numa profunda empatia imperturbável, que quase me causava cobiça.
Estava eu ainda tão longe.
Desse dia em diante aproximei-me, despertei, julgo poder dizer, e de tanto que o ouvi nos seus delírios internos, enquanto queimava cigarros devagarinho, e recitava Sigmund Freud e Melanie Klein, entre outros tão insanos quanto eles, percebi que as mentes, são um mistério sem fundo e sem fim, e que na busca da análise perfeita, ou nos deixamos deleitar por elas, ou ficamos aquém do pleno conhecimento, se é que plenitude, é termo exequível ao Homem. Ao escolher o aquém, ao não nos permitirmos ao devaneio, seguiremos um caminho concreto e conciso, seguro, bem certo que sim, e por isso mesmo por demais limitado, que a segurança, tem destas inerências, consequências, melhor dizendo.
Nem por isso me causa simpatia, esse caminho coeso e recto, sendo que divago constantemente aqui e além, entre experiências de vida coerentes ou não, onde mergulho e emerjo num percurso alucinante e sem fim, que me transporta dentro das gentes, onde me encaixo para num ápice fugir, num dia a dia abrangente, ambicioso e entusiástico, onde não raras vezes, devo apresentar rasgos de loucura, ou não divague eu em mentes alheias, detentoras de recantos obscuros e sombrios, umas vezes meus, outras vezes não.
Por certo, nem todos me entendem, o que nem me aflige, que me encontro aberta a incompreensões. Tal qual eu também não entendi em tempos, os cigarros, virados ao avesso, aquando das divagações do homem que me despertou para a imensidão interna, e ao qual rotulei de louco, numa perfeita ignorância, que felizmente releguei.
Utilizar tais termos, como loucura, anormalidade ou outros de semelhante carácter, e carga sociológica, na catalogação da mente, como se determinados actos isolados nos dessem precisa informação, é um terreno perigoso nos meandros da evolução, por onde nem nos deveríamos permitir entrar. A cada dia, em cada viagem alheia, mais ou menos genial, mais ou menos penetrante, que na reserva, no receio, na segurança da protecção e do conforto, nem me teria chegado, ganho riquezas de vida, tão minhas como mais nada.
Loucura, talvez seja até o aquém. Apenas e só pelo desperdício a que se sujeita, quem não se consegue abrir e seguir."
"Duvidei ter queda para isto, que desde sempre me testo, nem por encontrar incapacidades severas, mas talvez pela necessidade de sentir internamente, a prova mais do que provada de que as minhas escolhas são as escolhas que eu queria, se não para sempre, expressão traiçoeira e enganadora, como poucas o são, pelo menos no momento exacto da escolha.
Na pequena cidade, nem bem tinha noção do que me aguardava na grande, que ao ter sabido, por certo me teria intimidado, confesso, que nem nunca devemos julgar, que o desconhecimento não é nosso aliado, eu pelo menos, assim devo dizê-lo, que a conhecer previamente determinadas realidades, teria delas fugido a bom fugir, sem escolha efectiva, por assim dizer. Um desperdício. Nos caminhos desta vida, o receio do que se encontrará, em muito já nos castra, quanto mais se nos fosse fornecido previamente, por alguma entidade suprema, fantástica ou não, o enorme segredo, da consequência das nossas escolhas. Aquém estaríamos, nem duvido, que nos deixaríamos prostrar numa inércia descabida e exacerbada, válida apenas e só, para nos restringir a existência ainda mais, a par e passo com outras limitações, já por si determinantes. Seguimos pois na ignorância.
A primeira aula foi de um efeito tremendo, num auditório gigantesco povoado maioritariamente por mulheres, com um professor alucinado ao fundo, que falava de forma dúbia e penetrante, enquanto fumava cigarros acesos em escadinha, uns nos outros, se é que me explico. Após lhes dar o devido préstimo, que lhe aprazia por certo a existência, tal o delírio perceptível a olho nu, e numa ingratidão manifesta por tão profundo gosto, deixava-os morrer devagarinho, virados ao avesso, como se uma tortura lhes infligisse aos nossos olhos, que mais não faziam, do que mirar alternadamente, o seu ar lunático e insano, e os cigarros que se mirravam, em processo longo e penoso, até se esgotarem em cinza. Dentro dos olhares que se trocavam, nos quais incluo os meus, consegui ler incertezas, dúvidas e acima de tudo receio, de termos chegado a um mundo hostil, onde quem supostamente nos ensinaria a ajudar o outro, carecesse por sua vez dessa mesma ajuda, numa frágil teoria naife, como se a nossa mente assim fosse, de leitura fácil e simples de catalogar, sendo que nós constituíamos os alunos certinhos, bem defronte ao professor maluco, que comia cigarros enquanto falava, de olhar vidrado e vazio, como se na sala, apenas ele e eles existissem, numa profunda empatia imperturbável, que quase me causava cobiça.
Estava eu ainda tão longe.
Desse dia em diante aproximei-me, despertei, julgo poder dizer, e de tanto que o ouvi nos seus delírios internos, enquanto queimava cigarros devagarinho, e recitava Sigmund Freud e Melanie Klein, entre outros tão insanos quanto eles, percebi que as mentes, são um mistério sem fundo e sem fim, e que na busca da análise perfeita, ou nos deixamos deleitar por elas, ou ficamos aquém do pleno conhecimento, se é que plenitude, é termo exequível ao Homem. Ao escolher o aquém, ao não nos permitirmos ao devaneio, seguiremos um caminho concreto e conciso, seguro, bem certo que sim, e por isso mesmo por demais limitado, que a segurança, tem destas inerências, consequências, melhor dizendo.
Nem por isso me causa simpatia, esse caminho coeso e recto, sendo que divago constantemente aqui e além, entre experiências de vida coerentes ou não, onde mergulho e emerjo num percurso alucinante e sem fim, que me transporta dentro das gentes, onde me encaixo para num ápice fugir, num dia a dia abrangente, ambicioso e entusiástico, onde não raras vezes, devo apresentar rasgos de loucura, ou não divague eu em mentes alheias, detentoras de recantos obscuros e sombrios, umas vezes meus, outras vezes não.
Por certo, nem todos me entendem, o que nem me aflige, que me encontro aberta a incompreensões. Tal qual eu também não entendi em tempos, os cigarros, virados ao avesso, aquando das divagações do homem que me despertou para a imensidão interna, e ao qual rotulei de louco, numa perfeita ignorância, que felizmente releguei.
Utilizar tais termos, como loucura, anormalidade ou outros de semelhante carácter, e carga sociológica, na catalogação da mente, como se determinados actos isolados nos dessem precisa informação, é um terreno perigoso nos meandros da evolução, por onde nem nos deveríamos permitir entrar. A cada dia, em cada viagem alheia, mais ou menos genial, mais ou menos penetrante, que na reserva, no receio, na segurança da protecção e do conforto, nem me teria chegado, ganho riquezas de vida, tão minhas como mais nada.
Loucura, talvez seja até o aquém. Apenas e só pelo desperdício a que se sujeita, quem não se consegue abrir e seguir."
sexta-feira, 28 de janeiro de 2011
Do que somos
E dizia-me em tempos alguém que muito prezo, numa analogia em tudo certeira, que mais não somos do que um saco de sentimentos, com uma abertura no topo, de onde sai o que lá dentro excede. E digo que foi alguém, porque nem me parece prudente usar palavras de outros como se fossem minhas, atitude que conoto com uma tremenda falta de carácter, embora tenha de confessar que me apropriei, ainda que dignamente, de palavras que o ouvi dizer. Era já um tanto ou quanto velho, ar de cansaço crónico, cigarro dependurado no canto da boca, quase parecendo, que dele dependia todo o seu raciocínio, que era raro, muito raro, divagar sem aquela preciosa ajuda, que muitas das vezes, lá se detinha apenas e só por enfeite e habituação, que o puxo surgia espaçado, quase inexistente, um desperdício dizia ele, sem o qual não conseguia viver. Havia quem não o gostasse, quem lhe criticasse a calma, quem lhe desdenhasse a sapiência, que muitas gentes, necessitam do concreto para evoluir, da exposição exaustiva e descritiva, do esquema exacto, e quase julgam, que quem assim divaga, pouco tem a ensinar.
Mas adiante, que o que me trás cá hoje, é o saco que constituímos, e que transborda em redor o que lhe enche as estranhas, que é verdade absoluta, admitida por todos, que o que quer que nos exista em excesso, há-de verter, fenómeno este aplicável ao corpo e à mente.
E por a mim tanta lógica fazer, confesso que sinto tristeza, quando encontro em alguém atitudes nefastas, pois de imediato concluo, que o que lhe enche a alma são amarguras e desgraças, que de tantas serem, necessitam de espaço, e emanam-se assim, sem destino marcado, a quem passa, a quem está mais perto.
Mas adiante, que o que me trás cá hoje, é o saco que constituímos, e que transborda em redor o que lhe enche as estranhas, que é verdade absoluta, admitida por todos, que o que quer que nos exista em excesso, há-de verter, fenómeno este aplicável ao corpo e à mente.
E por a mim tanta lógica fazer, confesso que sinto tristeza, quando encontro em alguém atitudes nefastas, pois de imediato concluo, que o que lhe enche a alma são amarguras e desgraças, que de tantas serem, necessitam de espaço, e emanam-se assim, sem destino marcado, a quem passa, a quem está mais perto.
quinta-feira, 27 de janeiro de 2011
Da relatividade dos dias...
Há dias em que somos leves, outros em que pesamos, sem que isso tenha qualquer ligação ao tamanho do corpo. Ocorre por norma esta diferenciação, logo pela manhã, podendo o dia dar-lhe contornos suficientes para uma qualquer alteração, ou seja, passarmos de pesados a leves ou vice versa, ou não nos dar nada disso, e deixar-nos à mercê do estado matutino, que se prolonga até nova noite, novo sossego, hora em que o corpo desliga até novo despertar, que pode ou não estar condizente com a véspera. Nos dias em que estou leve, não peso nada, e embalo numa fluência que me sustenta, e que me torna os dias num doce deambular, deambular esse, que nem me suga qualquer tipo de energia, dado que o estado de espírito é de tal forma ligeiro, que a decorrência surge por si, sem qualquer preocupação, sendo que tudo acontece na hora exacta, no momento devido, no segundo esperado. E mesmo que tal concordância de tempo nem exista, que nos encontramos num mundo real, e perfeição é coisa que nem por cá tem cabimento, a leveza é tal, que o encaixe surge perfeito, e na falha do tempo perante nós, sucumbimos-nos nós a ele, numa doce entrega que em nada nos amargura. Nos dias em que peso, peso muito. Peso logo pela manhã, que insiste em tirar-me a cama que tanto me falta, para me atirar ao dia que parece engolir-me, ainda mal começou. A cada passo, pareço pesar mais ainda , para no final, já noite, acartar em mim um peso tremendo, admitindo aqui, como devem depreender, a ausência de um volte face misericordioso, capaz de me livrar da carga, e me deixar leve outra vez. Pesa-me tudo. Pesam-me os olhos que se querem fechar, pesa-me a boca que nem quer abrir, pesam-me as pernas que querem parar, pesa-me o intimo, que num apogeu da força me comanda o corpo, fraca coisa esta que nos encerra, que nos parece guardar, para no fundo, no fundo, não mais fazer do que o que lá de dentro se desmanda, numa supremacia interna tremenda, que tantas vezes negamos. Deveríamos ser complementares. Uma qualquer fusão corpo e mente, que nos possibilitasse uma coerência efectiva, e não nos deixasse subjugados ora aos desígnios de um, ora aos desígnios de outro, que pode também o corpo, pobre de si, quando em enfermidade mortal, emanar então de seu poder, para nos deixar num âmago de tristeza, e numa falência da mente. Divaguei entretanto, perdoem-me. Hoje peso que me farto. Pode ser que amanhã já não.
quarta-feira, 26 de janeiro de 2011
Sinais dos tempos
Chegada a casa, frio, pressa de subir...
- Não desligues o rádio mãe!
- Não? Porquê?
- Porque eu estou a ouvir esta música.
Olho para trás, e o pequeno abana a cabeça. Resolvo perguntar-lhe quem é, sem eu própria saber.
- É o Justin Bieber. É muito fixe.
- Como sabes isso?
- Sei, ora. Todos ouvimos lá na escola. Há amigos, que já têm no Magalhães.
Ouvi até ao fim. Era efectivamente o tal do Bieber. Eu, aos sete, ouvia Ana Faria, ou a Loja do Mestre André. Ai olé, ai olé... Em dias de avó, provavelmente, o Jardim da Celeste, onde alguém buscava uma rosa para me dar. Hoje, os miúdos ouvem músicas com danças hip hop, cantadas por alguém cheio de estilo, de calça larga e boné à malandro.
Sem nos debruçarmos muito, descobrimos um motivo para a escassez do romantismo.
Estou desolada.
- Não desligues o rádio mãe!
- Não? Porquê?
- Porque eu estou a ouvir esta música.
Olho para trás, e o pequeno abana a cabeça. Resolvo perguntar-lhe quem é, sem eu própria saber.
- É o Justin Bieber. É muito fixe.
- Como sabes isso?
- Sei, ora. Todos ouvimos lá na escola. Há amigos, que já têm no Magalhães.
Ouvi até ao fim. Era efectivamente o tal do Bieber. Eu, aos sete, ouvia Ana Faria, ou a Loja do Mestre André. Ai olé, ai olé... Em dias de avó, provavelmente, o Jardim da Celeste, onde alguém buscava uma rosa para me dar. Hoje, os miúdos ouvem músicas com danças hip hop, cantadas por alguém cheio de estilo, de calça larga e boné à malandro.
Sem nos debruçarmos muito, descobrimos um motivo para a escassez do romantismo.
Estou desolada.
terça-feira, 25 de janeiro de 2011
...
Os usos e costumes são coisas nossas. Presas a nós como uma segunda pele, um prolongamento externo, uma vida à margem do corpo. Estranho-lhe alterações profundas, de quando me falta alguém que é meu. E com meu não falo em pertença, falo em partilha dos dias, em vivências comuns, em sítios iguais.
Que nunca se confunda, porque não existe gente minha.
Que nunca se confunda, porque não existe gente minha.
segunda-feira, 24 de janeiro de 2011
Padre
E eis que casou, constituindo uma perca significativa para a igreja, um ganho declarado para a mulher que lhe roubou o coração, desde sempre devoto ao Senhor. A vida tem destas inerências em todo e qualquer lugar, sendo frequente a perca de uns para o ganho de outros, julgo ser assim desde o inicio dos tempos, o que nos obriga a depreender, que há coisas que não mudarão nunca.
Desde cedo que era devoto, crente e praticante, ou não fora ele nascido e criado em aldeia de gente que rezava a cada passo, ora num agradecimento, ora numa solicitação, ora apenas e só porque sim, que qualquer hora e pretexto é bom para louvar a Deus. A missa, todos os Santos Domingos, nunca foi para si obrigação, era parte integrante da sua vida, nem bem percebia, o carácter laico de alguns, pobres desconhecedores da grandiosidade divina, gentes essas, que necessitavam diariamente da sua venerada oração. Não pensem cá que se tratava de um beato enganoso e cruel, embora seja até desculpável se em tal erro incorrerem, tal a quantidade que envolve a igreja, o padre e o sacristão. Pobres figuras estas, podemos dizer, sempre circundadas de gente de falsa crença e pouca ou nenhuma solidariedade. Gente que chega até a pedir perdão ajoelhada, se por obra do diabo, algum pecado cometeu, para logo após se renderem às teias do mal, por demais poderosas na arte da cativação. Nem parece daqui surgir preocupação desmedida, que no próximo dia, semana ou quando for, há-de surgir novo perdão, no acto da confissão.
Na hora de escolher ofício, nada do que se lhe apresentou lhe causou agrado, sendo que apenas e só a devoção, parecia luzir-lhe ao olho, pelo que depressa se decidiu aos caminhos castos do sacerdócio. Era para aquilo que tinha vindo a este mundo.
Independentemente do credo de cada religião, arrisco dizer, com honras de certeza quase absoluta, que qualquer uma ganharia por tê-lo como seu servo, pessoa suserana, de coração puro e dedicado, que se há padre que conheci, que valeu pela pessoa em si, foi este que aqui falo, que disso não se duvide.
Ainda que muito tenha rezado, ainda que muita acção louvada tenha praticado, houve um dia em que o coração se lhe cedeu, aos encantos de uma Mulher. Não podia fugir-lhe, como em tempos não tinha fugido, aos desígnios do grande Senhor, que por ora lhe apresentava aquela provação, de um travo amargo e doce, que nem podem imaginar. Negar aquele amor seria acto insano, que a pureza com que se lhe renderam, era coisa digna de realce, pouco vista nos dias de hoje, isenta de qualquer ambição supérflua, interesse irrisório, ou mera paixão .
Na análise profunda onde se encerrou, renunciou aos votos do sacerdócio. A bem das leis católicas, perdeu-se um padre, ganhou-se um marido.
Se assim era necessário, não me cabe a mim julgar. Hoje já não o chamo de Padre, que já não o é. O que me dava outrora, dá-me por ora igual, que o que lhe procurava, nem eram perdões ou orações. E que por mim já não reze, não o diminuiu a meus olhos.
Desde cedo que era devoto, crente e praticante, ou não fora ele nascido e criado em aldeia de gente que rezava a cada passo, ora num agradecimento, ora numa solicitação, ora apenas e só porque sim, que qualquer hora e pretexto é bom para louvar a Deus. A missa, todos os Santos Domingos, nunca foi para si obrigação, era parte integrante da sua vida, nem bem percebia, o carácter laico de alguns, pobres desconhecedores da grandiosidade divina, gentes essas, que necessitavam diariamente da sua venerada oração. Não pensem cá que se tratava de um beato enganoso e cruel, embora seja até desculpável se em tal erro incorrerem, tal a quantidade que envolve a igreja, o padre e o sacristão. Pobres figuras estas, podemos dizer, sempre circundadas de gente de falsa crença e pouca ou nenhuma solidariedade. Gente que chega até a pedir perdão ajoelhada, se por obra do diabo, algum pecado cometeu, para logo após se renderem às teias do mal, por demais poderosas na arte da cativação. Nem parece daqui surgir preocupação desmedida, que no próximo dia, semana ou quando for, há-de surgir novo perdão, no acto da confissão.
Na hora de escolher ofício, nada do que se lhe apresentou lhe causou agrado, sendo que apenas e só a devoção, parecia luzir-lhe ao olho, pelo que depressa se decidiu aos caminhos castos do sacerdócio. Era para aquilo que tinha vindo a este mundo.
Independentemente do credo de cada religião, arrisco dizer, com honras de certeza quase absoluta, que qualquer uma ganharia por tê-lo como seu servo, pessoa suserana, de coração puro e dedicado, que se há padre que conheci, que valeu pela pessoa em si, foi este que aqui falo, que disso não se duvide.
Ainda que muito tenha rezado, ainda que muita acção louvada tenha praticado, houve um dia em que o coração se lhe cedeu, aos encantos de uma Mulher. Não podia fugir-lhe, como em tempos não tinha fugido, aos desígnios do grande Senhor, que por ora lhe apresentava aquela provação, de um travo amargo e doce, que nem podem imaginar. Negar aquele amor seria acto insano, que a pureza com que se lhe renderam, era coisa digna de realce, pouco vista nos dias de hoje, isenta de qualquer ambição supérflua, interesse irrisório, ou mera paixão .
Na análise profunda onde se encerrou, renunciou aos votos do sacerdócio. A bem das leis católicas, perdeu-se um padre, ganhou-se um marido.
Se assim era necessário, não me cabe a mim julgar. Hoje já não o chamo de Padre, que já não o é. O que me dava outrora, dá-me por ora igual, que o que lhe procurava, nem eram perdões ou orações. E que por mim já não reze, não o diminuiu a meus olhos.
domingo, 23 de janeiro de 2011
...
Cumpri o dever manhã cedo, não fosse fazer-se tarde. Recolhi, que a agrura do Inverno a isso me obrigou. Na noite, acompanham-me livros, revistas, e um aconchego castanho e peludo, de nome manta. Não a trocava por nada. Ou melhor, quase nada.
sábado, 22 de janeiro de 2011
Géneros
Nem sou por aí além, amante de generalizações. Admito determinadas características como mais usuais num género ou no outro, admitindo também, as devidas excepções. Ainda assim, conheço muitos membros da espécie masculina, no preparo que passo a descrever, pelo que quase considero, ser um distintivo inato, genético, natural, enfim, o que queiram chamar-lhe. Dão, com elevada frequência, uma no cravo outra na ferradura, e ali permanecem, expectantes e crentes de que a que deram no cravo, é muito mais poderosa do que a que acertou na ferradura, facto pelo qual, sempre esperam, que o mulherio perdoe o lado lunar, dado que o solar é de uma dimensão muito mais forte e poderosa. Passo a explicar. O lado solar pode até ser um resquício de nada, um pormenor furtivo, uma ninharia entorpecida, mas ainda assim, e porque a força é de tal ordem, espera-se que essa vertente escondida, a surgir, engula tudo o resto que emerge do lado negro, todos os maus humores, todos os acessos de zanga, todas as tardes de cerveja e tremoço, todas as noites de zapping. Irrita-me constatar que estão terrívelmente certos. A culpa, é declaradamente nossa, que ainda hoje, pós revoluções, alforrias, emancipações e afins, continuamos a assemelhar-nos a algo brando e frágil, que após um dia de tumulto, uma semana, o que for, conseguimos sorrir de novo apenas e só com uma rosa, ou qualquer outra causa de valor semelhante. É a vida, somos assim.
Depreende-se, e numa teoria lógica da evolução das espécies, que vocês mais não fizeram do que uma adaptação, tal qual Stephen Jay Gould refere no Polegar do Panda ( que só num aparte, que nem vem ao caso, aconselho vivamente). Ainda assim, ouso dizer-vos, que fica mal esse aproveitamento da fraqueza alheia, esse uso e abuso do vosso charme abençoado, que nos acerta certeiro, exactamente, onde nos encontramos em falso. Nós, pobres de Cristo, somos então transformadas em vítimas de uma atrocidade desmedida, à qual chamamos nomes ténues, mas que não é mais nem menos, do que manipulação.
E escusem-se senhoras, a proferir em alta voz, que não fazem parte desta estirpe, que das duas uma, ou mentem, coisa que me parece completamente ridícula, tendo em conta a dignidade das leitoras que por cá passam, ou são a excepção que confirma a regra, excepção essa que deve ser tão, mas tão escassa, que seria um grande apanágio da sorte, serem exactamente vocês a sê-la.
A vós, caros leitores do género masculino, acredito piamente que fazem parte daquele grupo restrito que não usam e abusam da nossa humilde fraqueza. Que são dignos ao ponto de nos tratarem apenas e só com distinção, e que qualquer semelhança do vosso comportamento, com o que atrás descrevo, é mera coincidência. Fico feliz por isso.
Depreende-se, e numa teoria lógica da evolução das espécies, que vocês mais não fizeram do que uma adaptação, tal qual Stephen Jay Gould refere no Polegar do Panda ( que só num aparte, que nem vem ao caso, aconselho vivamente). Ainda assim, ouso dizer-vos, que fica mal esse aproveitamento da fraqueza alheia, esse uso e abuso do vosso charme abençoado, que nos acerta certeiro, exactamente, onde nos encontramos em falso. Nós, pobres de Cristo, somos então transformadas em vítimas de uma atrocidade desmedida, à qual chamamos nomes ténues, mas que não é mais nem menos, do que manipulação.
E escusem-se senhoras, a proferir em alta voz, que não fazem parte desta estirpe, que das duas uma, ou mentem, coisa que me parece completamente ridícula, tendo em conta a dignidade das leitoras que por cá passam, ou são a excepção que confirma a regra, excepção essa que deve ser tão, mas tão escassa, que seria um grande apanágio da sorte, serem exactamente vocês a sê-la.
A vós, caros leitores do género masculino, acredito piamente que fazem parte daquele grupo restrito que não usam e abusam da nossa humilde fraqueza. Que são dignos ao ponto de nos tratarem apenas e só com distinção, e que qualquer semelhança do vosso comportamento, com o que atrás descrevo, é mera coincidência. Fico feliz por isso.
Desculpas
-Mãããããeeeee!!!
-Diz filho
-Desculpavas se eu entornasse pasta de dentes???
-Desculpava
-Ainda bem. É que eu entornei!!!
-Diz filho
-Desculpavas se eu entornasse pasta de dentes???
-Desculpava
-Ainda bem. É que eu entornei!!!
sexta-feira, 21 de janeiro de 2011
Escolhas
Não posso pagar. Chega para um, não dá para os dois, e é dois que nós somos. Que faço agora? Escolho qual de nós vai morrer, e resolvo o assunto?
Discurso proferido por alguém considerávelmente diminuído nas suas funções vitais, na decorrência de uma enfisema pulmonar. A esposa, vitima de Acidente Vascular Cerebral, perdeu a fala e a mobilidade há dois anos. Eram residêntes de um Lar clandestino, encerrado recentemente pelo Serviço de Segurança Social da área, por denúncia de carências graves, a diversos níveis. Nesse lar, onde pouco se comia, o dinheiro chegava para os dois.
Deixo apenas algumas questões, por me parecerem pertinentes; a quem recorre esta gente, sem família e sem bens? Porque não disponibiliza a Misericórdia e as IPSS, lugares suficientes, para quem delas verdadeiramente necessita? Porque será, que mesmos nestas Instituições, ditas de solidariedade social, entram, muitas das vezes, os que mais podem, em detrimento dos que mais precisam? Porque compactua o estado, com situações clandestinas que teimam em surgir, pela procura efectiva que têm, devido aos preços mais baixos que praticam? Porque se exige em demasia das entidades credenciadas, e se fecham muitas vezes os olhos aos cogumelos que germinam a cada esquina, onde as necessidades básicas são muitas das vezes negligenciadas? Porque não se tenta uma regulamentação mais eficaz e menos burocrática dos serviços, a bem de todos?
Podia continuar, mas fico-me por aqui. Não encontro respostas, pelo que engrossar a lista, nem me parece acto sensato. A quem me souber responder a uma que seja, faça o favor. Gostaria muito.
Discurso proferido por alguém considerávelmente diminuído nas suas funções vitais, na decorrência de uma enfisema pulmonar. A esposa, vitima de Acidente Vascular Cerebral, perdeu a fala e a mobilidade há dois anos. Eram residêntes de um Lar clandestino, encerrado recentemente pelo Serviço de Segurança Social da área, por denúncia de carências graves, a diversos níveis. Nesse lar, onde pouco se comia, o dinheiro chegava para os dois.
Deixo apenas algumas questões, por me parecerem pertinentes; a quem recorre esta gente, sem família e sem bens? Porque não disponibiliza a Misericórdia e as IPSS, lugares suficientes, para quem delas verdadeiramente necessita? Porque será, que mesmos nestas Instituições, ditas de solidariedade social, entram, muitas das vezes, os que mais podem, em detrimento dos que mais precisam? Porque compactua o estado, com situações clandestinas que teimam em surgir, pela procura efectiva que têm, devido aos preços mais baixos que praticam? Porque se exige em demasia das entidades credenciadas, e se fecham muitas vezes os olhos aos cogumelos que germinam a cada esquina, onde as necessidades básicas são muitas das vezes negligenciadas? Porque não se tenta uma regulamentação mais eficaz e menos burocrática dos serviços, a bem de todos?
Podia continuar, mas fico-me por aqui. Não encontro respostas, pelo que engrossar a lista, nem me parece acto sensato. A quem me souber responder a uma que seja, faça o favor. Gostaria muito.
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Artes e preceitos

Todos sonhamos. Uns arriscam mais, outros arriscam menos, sendo que até aí, no mundo interno, pessoal e intransmissível (ou não), existem os que arriscam muito e os que arriscam pouco, talvez pelo receio de que o sonho, seja um prazer sem limites, e a realidade, fique muito aquém do que se queria. Ainda assim, e na parte que me toca, embora o presente texto nem se refira a mim concretamente, quando sonho, ouso sonhar alto. Com a realidade dos dias, miudinha, frequente e usual, aguento-me, que mais remédio tenho, e como tal, quando me permito a mim mesma, uma inclusão profunda no meu imaginário, vou aonde nunca fui, dou-me a mim mesma esse direito, que felizmente, e em conjunto com outras facetas menos boas, que detemos enquanto ser humano, detemos também esta, que nos permite uma alheio à realidade, uma fuga, ainda que transitória e puramente inconsequente, uma vida à parte do exterior, muito nossa, isenta de censura ou qualquer outro tipo de castração, a não ser, a por nós mesmos imposta. A minha nestas coisas adormece. Um bem haja a ela.
Eis que ela sonha em ter um restaurante. Um sonho patético, poderão dizer, e até talvez, com alguma razão, que os tempos são de crise, os créditos vão mal, enfim, somos actualmente detentores de uma conjuntura capaz de nos toldar até os sonhos. Não tolda os dela, que ainda que conhecedora da impossibilidade prática de avançar com a sua vontade, vai com ela vivendo, limando umas arestas, estudando possibilidades. O que ela quer, não pensem cá ser coisa banal, que não se dá cá a essas coisas, até porque, os seus dotes culinários a isso não permitem, que de suas mãos, apenas saem acepipes divinos, daqueles dignos de repasto de rei, herdou de sua avó o predicado, que a dita, foi senhora de servir na Capital do País, em tempos idos, e aprendeu tudo o que há a aprender na arte da culinária, espólio valiosíssimo deixado a quem o quis aprender, que nestas coisas dos saberes antigos, a vontade e a crença, são o sal da continuidade.
Julgo que talvez por sentir esvaída a tradição, por julgar esquecidos os segredos de outrora, pretende dar seguimento a algo que para si constitui nobre arte, sendo que de resto, e embora frequentemente relegada pelas moças casadoiras de agora, considera ser tarefa fundamental de uma esposa dedicada, que se há papel que é da Mulher para todo o sempre é a boa mesa, entre outros, como sabem, mas falemos por ora neste.
Não concebe, por exemplo, a perda no tempo do seu borrego no forno, prato amado por todos os que já o provaram, que nunca viu igual em lado de nenhum, e cujo segredo, é de uma simplicidade difícil de se acreditar. Não o revela por ora. Talvez um dia, no restaurante, o cozinhe, para que todos o possam provar, e quiçá, descobrir-lhe o preceito.
quinta-feira, 20 de janeiro de 2011
Almanaque

Hoje numa revista, ofertaram-me um Almanaque. Não me perco a tecer considerações sobre o dito, que de resto, ainda nem bem o desfolhei. Não se assemelha, numa primeira análise, ao antigo Borda d'água, do qual já cá falei, e que era leitura assídua do meu biso.
Ainda assim, fez-me sorrir. Gosto de tê-lo por cá.
Apreensão
O meu blog nem se debruça na política. Não é por nada, é apenas porque não aprecio falar nela, embora a oiça, ou a leia, diariamente. Sinto-me porém com um problema, digno de realce, sendo que a cada dia mais se agudiza, pela proximidade da ocasião.
Domingo vamos às urnas. Uso ser tão decidida nestas coisas.
Domingo vamos às urnas. Uso ser tão decidida nestas coisas.
quarta-feira, 19 de janeiro de 2011
Varela
Olhá-lo hoje, é quase um sentimento de engano, como se o homem que foi em tempos, tivesse abandonado o corpo, que só isso parece justificar, a tamanha mudança. Era forte, alto e espadaúdo, barba comprida, bigode revirado, daqueles que se rufiavam na ponta de quando em vez, como um sinal de supremacia e intelectualidade. Era ainda dono e senhor da loja da aldeia, um digno posto para a época, local onde se vendia tudo o que possam imaginar, desde o bacalhau seco, dependurado por detrás do balcão, aos pacotes de detergente Omo, passando pelo leito Molico, e pela cevada Pensal.
Em dias de compras, a ausência verificava-se desde manhã cedo até ao sol já posto, sendo que o rumo era, invariavelmente, Santarém, capital de Distrito, onde muitas coisas se compravam, outras ainda, se catrapiscavam, que homem que é homem, não se faz cá rogado a determinadas situações, não vá até ficar mal visto, na sua condição de masculinidade. Foi num desses dias, em que um desaire forte se insurgiu, que Varela se arranjou com a sua segunda, que a primeira, Dona Maria, ficou esposa para sempre, era condição que perante Deus lhe destinou, pelo que nunca ousou sequer pensar, em tal posição lhe retirar. Ainda hoje, e para bem de todos lá em casa, longe dos tempos áureos, das compras, da loja e afins, é Dona Maria que se ocupa dele, que da outra, já nem sabemos o poiso.
Ousou viver um dia, talvez seja isso, deixando de se resignar à mercê daquele que lhe tinha um amor faseado, dispensado apenas e só em dias estipulados, dias esses, em que era a mais feliz das mulheres, que Deus ao mundo deitou. Nos restantes, todos os outros, que se constatavam muitos, era uma infeliz despedaçada, dona de um coração que palpitava no vazio, que a ousar enchê-lo, o que lhe vinha à ideia, não lhe deixava sossego, pelo que o melhor, era isso mesmo, picá-lo em força, e vazá-lo de tudo. Ousou tarde, tenho a dizer.
Mas no seguimento da história, e falando de quem interessa, que não é de todo esta pobre alma envergonhada, centramos-nos de novo em Varela, homem outrora robusto e imponente, que se mirra agora, devagarinho, sobre o olhar atento e cuidado de Dona Maria, criatura sempre sabedora da sua condição de primeira, e totalmente consciente da existência da segunda. Não deixa porém de salientar à boca cheia, que o seu digno marido, a ela, nunca faltou com coisa alguma, sendo que a única queixa de sempre, foram os longos dias de ausência, destinados a compras muitas vezes dispensáveis, com regressos de carro vazio, mas com dinheiro mais do que gasto.
De toda a envergadura, restam-lhe uns olhos azuis lindos de morrer, e uma Maria dedicada, que de tudo já o perdoou.
Foi a primeira, e a isso se sente obrigada. Este texto, merecia ter o nome dela.
Em dias de compras, a ausência verificava-se desde manhã cedo até ao sol já posto, sendo que o rumo era, invariavelmente, Santarém, capital de Distrito, onde muitas coisas se compravam, outras ainda, se catrapiscavam, que homem que é homem, não se faz cá rogado a determinadas situações, não vá até ficar mal visto, na sua condição de masculinidade. Foi num desses dias, em que um desaire forte se insurgiu, que Varela se arranjou com a sua segunda, que a primeira, Dona Maria, ficou esposa para sempre, era condição que perante Deus lhe destinou, pelo que nunca ousou sequer pensar, em tal posição lhe retirar. Ainda hoje, e para bem de todos lá em casa, longe dos tempos áureos, das compras, da loja e afins, é Dona Maria que se ocupa dele, que da outra, já nem sabemos o poiso.
Ousou viver um dia, talvez seja isso, deixando de se resignar à mercê daquele que lhe tinha um amor faseado, dispensado apenas e só em dias estipulados, dias esses, em que era a mais feliz das mulheres, que Deus ao mundo deitou. Nos restantes, todos os outros, que se constatavam muitos, era uma infeliz despedaçada, dona de um coração que palpitava no vazio, que a ousar enchê-lo, o que lhe vinha à ideia, não lhe deixava sossego, pelo que o melhor, era isso mesmo, picá-lo em força, e vazá-lo de tudo. Ousou tarde, tenho a dizer.
Mas no seguimento da história, e falando de quem interessa, que não é de todo esta pobre alma envergonhada, centramos-nos de novo em Varela, homem outrora robusto e imponente, que se mirra agora, devagarinho, sobre o olhar atento e cuidado de Dona Maria, criatura sempre sabedora da sua condição de primeira, e totalmente consciente da existência da segunda. Não deixa porém de salientar à boca cheia, que o seu digno marido, a ela, nunca faltou com coisa alguma, sendo que a única queixa de sempre, foram os longos dias de ausência, destinados a compras muitas vezes dispensáveis, com regressos de carro vazio, mas com dinheiro mais do que gasto.
De toda a envergadura, restam-lhe uns olhos azuis lindos de morrer, e uma Maria dedicada, que de tudo já o perdoou.
Foi a primeira, e a isso se sente obrigada. Este texto, merecia ter o nome dela.
Incongruências de palmo e meio
Ainda agora...
-Anda querido, vais para casa da avó.
-Porquê?
-Porque ainda não estás bom e ainda não podes ir á escola.
-Fico aqui.
-Não pode ser, a mãe tem de ir trabalhar.
-Fico sozinho.
-Não ficas nada, já sabes que não.
-Não tenho medo, sou crescido.
-Claro que és, mas não podes ficar aqui sozinho tanto tempo.
-Porquê? Não tenho medo...
-Porque não e pronto. Vá, vai ao quarto do fundo buscar os ténis.
-Anda comigo.
-Fazer?
-É escuro. Tenho medo de ir sozinho.
-Anda querido, vais para casa da avó.
-Porquê?
-Porque ainda não estás bom e ainda não podes ir á escola.
-Fico aqui.
-Não pode ser, a mãe tem de ir trabalhar.
-Fico sozinho.
-Não ficas nada, já sabes que não.
-Não tenho medo, sou crescido.
-Claro que és, mas não podes ficar aqui sozinho tanto tempo.
-Porquê? Não tenho medo...
-Porque não e pronto. Vá, vai ao quarto do fundo buscar os ténis.
-Anda comigo.
-Fazer?
-É escuro. Tenho medo de ir sozinho.
terça-feira, 18 de janeiro de 2011
Ouvi dizer
Não percebe o que o deixa assim, pobre diabo se julga. Olhá-la nem por isso o sossega, julgou em tempos, ser possível esquecer o amor que os uniu, e que num dia, após muitos outros, fraquejou. Nesse dia, julgou-se liberto para sempre, num sentimento de espírito livre há muito desejado e nunca conseguido, que antes dela, nem bem sabia o que ambicionava, e depois dela, a prisão a alguém que muito queria, em luta tremenda contra o seu ser indómito e livre, assaltaram-no forte. Temos destas coisas estranhas, que desejamos o desconhecido com uma força atroz, para depois, quando lhe damos alma e corpo, nos assaltar um vazio sem fim, porque a sensação imaginada está longe da que se experimentou realmente, e que se traduz num amargo estranho, por vezes fraco, por vezes forte, num misto de terror e perca, de solidão e desespero.
Talvez por isso, mas sem certezas, recolheu ao conhecido. Eu já antes sabia, que o Mundo todo, não é para qualquer alma. Reviveu, ainda que ao longe, todas as sensações sentidas, todos os beijos já dados, todos os sonhos sonhados, e quis tudo outra vez, num desejo aguçado pela distância, maldita, que o acende como mais nada, pela ausência, pela solidão. Ali ficou.
Não mais a pode ter ao perto, pelo que o que por ora experimenta, é uma amalgama de sensações opostas, que intercala num corpo fraco e amargurado, a uma velocidade alucinante. Ora amor, ora ódio, que indiferença, é coisa que não lhe consegue ter.
"A cidade está deserta,
E alguém escreveu o teu nome em toda a parte:
Nas casas, nos carros, nas pontes, nas ruas.
Em todo o lado essa palavra
Repetida ao expoente da loucura!
Ora amarga! Ora doce!
Pra nos lembrar que o amor é uma doença,
Quando nele julgamos ver a nossa cura!"
Ornatos violeta
Talvez por isso, mas sem certezas, recolheu ao conhecido. Eu já antes sabia, que o Mundo todo, não é para qualquer alma. Reviveu, ainda que ao longe, todas as sensações sentidas, todos os beijos já dados, todos os sonhos sonhados, e quis tudo outra vez, num desejo aguçado pela distância, maldita, que o acende como mais nada, pela ausência, pela solidão. Ali ficou.
Não mais a pode ter ao perto, pelo que o que por ora experimenta, é uma amalgama de sensações opostas, que intercala num corpo fraco e amargurado, a uma velocidade alucinante. Ora amor, ora ódio, que indiferença, é coisa que não lhe consegue ter.
"A cidade está deserta,
E alguém escreveu o teu nome em toda a parte:
Nas casas, nos carros, nas pontes, nas ruas.
Em todo o lado essa palavra
Repetida ao expoente da loucura!
Ora amarga! Ora doce!
Pra nos lembrar que o amor é uma doença,
Quando nele julgamos ver a nossa cura!"
Ornatos violeta
...
O mar estava de um azul escuro e opaco, quase parecia, de uma densidade total, deixando a ilusão de que nada albergava dentro, pela impossibilidade de algo ali sobreviver, naquela força, naquele breu. As rochas escarpadas da envolta, levavam com a sua fúria, sem no entanto sofrerem qualquer tipo de alteração, sendo que se mantinham iguais a elas mesmas. Assemelham-se a gente, por assim dizer, se não toda, alguma, daquela que necessita de constante martírio a fim de minguar, pela força do tempo e da insistência.
Conheci alguém bem perto, entre outros não tão próximos, exactamente assim, que numa perfeita fusão com a natureza mais cruel, levou com a agrura da vida anos a fio, revelando uma força bruta, indestrutível, julgávamos nós. Erro crasso, concluímos, que se há coisa que se desgasta com o tempo, é a nossa rijeza, que por muito que pareça evoluir, mais não faz do que causar-nos um sério engano, uma pura ilusão na qual adormecemos em sossego, por nos julgarmos detentores de um interior sólido, que por nunca antes ter quebrado, jamais o fará.
Esquecemos, ignorantes, que tal como a rocha, que aguenta anos a fio as investidas do mar, um dia, num sopro de vento, ou num mísero pingo de chuva, caímos para não mais levantar. Não me julguem cá de mau agoiro. Nem que digo estas palavras, para abanar os fortes que por cá andam, que muito os louvo e admiro. Digo-as talvez num aviso, quiçá, a mim mesma destinado.
Lá dentro, e num contraste tremendo com a crueza da envolta, encontram-se. Nem bem percebem, o que ali os leva, mas temem que seja algo sério. Os dois. Num primeiro abraço à janela, baptizado a maresia forte, que deixa o sal na pele e a alegria na alma, descobrem.
Conheci alguém bem perto, entre outros não tão próximos, exactamente assim, que numa perfeita fusão com a natureza mais cruel, levou com a agrura da vida anos a fio, revelando uma força bruta, indestrutível, julgávamos nós. Erro crasso, concluímos, que se há coisa que se desgasta com o tempo, é a nossa rijeza, que por muito que pareça evoluir, mais não faz do que causar-nos um sério engano, uma pura ilusão na qual adormecemos em sossego, por nos julgarmos detentores de um interior sólido, que por nunca antes ter quebrado, jamais o fará.
Esquecemos, ignorantes, que tal como a rocha, que aguenta anos a fio as investidas do mar, um dia, num sopro de vento, ou num mísero pingo de chuva, caímos para não mais levantar. Não me julguem cá de mau agoiro. Nem que digo estas palavras, para abanar os fortes que por cá andam, que muito os louvo e admiro. Digo-as talvez num aviso, quiçá, a mim mesma destinado.
Lá dentro, e num contraste tremendo com a crueza da envolta, encontram-se. Nem bem percebem, o que ali os leva, mas temem que seja algo sério. Os dois. Num primeiro abraço à janela, baptizado a maresia forte, que deixa o sal na pele e a alegria na alma, descobrem.
segunda-feira, 17 de janeiro de 2011
Intuições
Não sei se o aprecio. Chamam-lhe sexto sentido, intuição, o que quer que seja, e encaixa-me como uma luva feita à medida. Chega a haver vezes, em que tento encobrir, fazer crer a mim mesma que a minha preocupação, apreensão, ou qualquer um outro sentimento, mais não é do que um receio exacerbado, que me transporta a mente para uma previsão quase certa, uma antecipação precisa, uma pré consciencialização, por assim dizer. Também se verifica o contrário, o que de imediato atira por terra alguma teoria acusatória de queda para a fatalidade, sendo que muitas vezes me ocorre exactamente o oposto ao que atrás refiro, ou seja, antecipo algum agrado, alguma doce ocorrência, alguma chegada inesperada.
Talvez esta suposta premonição, e transportando o sexto sentido para a mais concreta realidade, esteja de mão dada com a análise aprofundada que deito ao redor, o que me permite conhecê-lo a um ponto tal, que qualquer situação que traga de acarto um indicio, por ténue que seja, é por mim de imediato detectado.
E se existem dias que por tal facto, se traduzem num agradável suspiro por algo de certo que sei vir a chegar, existem os outros, onde a espera se torna amarga de tão prevista, sendo que a única coisa que não sei precisar, é o exacto momento em que a ocorrência se dará. A poder escolher, usaria de um sexto sentido selectivo, eficiente nas boas novas, adormecido nas más premonições. Na ingenuidade suprema que sei deter, tento ignorá-lo nestas últimas, chamando-lhe nomes depreciativos, chegando até, a colocá-lo em causa, como se sensato isso fosse. É uma das poucas coisas da vida, que raramente me falha.
Talvez esta suposta premonição, e transportando o sexto sentido para a mais concreta realidade, esteja de mão dada com a análise aprofundada que deito ao redor, o que me permite conhecê-lo a um ponto tal, que qualquer situação que traga de acarto um indicio, por ténue que seja, é por mim de imediato detectado.
E se existem dias que por tal facto, se traduzem num agradável suspiro por algo de certo que sei vir a chegar, existem os outros, onde a espera se torna amarga de tão prevista, sendo que a única coisa que não sei precisar, é o exacto momento em que a ocorrência se dará. A poder escolher, usaria de um sexto sentido selectivo, eficiente nas boas novas, adormecido nas más premonições. Na ingenuidade suprema que sei deter, tento ignorá-lo nestas últimas, chamando-lhe nomes depreciativos, chegando até, a colocá-lo em causa, como se sensato isso fosse. É uma das poucas coisas da vida, que raramente me falha.
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Os que sorriem, fazem-nos falta. Provavelmente, do outro lado, faltam também, tal a intensidade com que nos fogem, fora de sítio, fora de tempo.
domingo, 16 de janeiro de 2011
Indignações
Nem sempre as funções se cumprem. Quem recorre a um serviço, espera o devido préstimo, a conclusão efectiva do que requer, seja que tipo de requerimento for, cabendo aqui uma larga escala de situações, como, e apenas a título de exemplo, para que sigam o meu raciocínio, esperamos a cura quando vamos ao médico, o pão quando vamos à padaria, o perdão quando nos confessamos ao padre, um determinado papel, quando vamos ao serviço de repartição de finanças, e enfim, por aí fora, que serviços é o que não falta, e necessidades nossas, também não. Por vezes existe o defraude, que poderá surgir de diversos factores, imputáveis ou não a quem prestou o serviço, sendo que existem situações incontroláveis até para quem pretende cumprir, podendo aqui deixar um exemplo, a mero título elucidativo, pode o Médico não nos curar, por cura não haver. Ou pode a não efectivação do serviço, surgir por outra espécie de motivos, muitas das vezes, imputáveis directamente a quem o não prestou devidamente, a quem por mor de uma qualquer razão, resolveu não tomar as devidas providências, a fim de dar cumprimento à tarefa a que se propõe. Nunca me parece bem. Parece-me ainda pior, no caso do prestador de serviços, ser uma Instituição de suposto apoio, que por obrigar a uma regra não cumprida, ousa deixar ao relento alguém debilitado, ao ponto desse alguém vir a falecer durante a noite. Não me cabe a mim analisar métodos de punição alheios. Mas cabe-me, enquanto ser social, indignar-me com tamanha atrocidade. Não concebo o relento, como um castigo imposto, por quem está lá para acolher. Mau, muito mau.
sábado, 15 de janeiro de 2011
Constructos
Seriam, seguramente, para lá de uns vinte. Entre pequenos e grandes, homens e mulheres. Enquanto eles falavam, fumavam e esbracejavam, elas tomavam conta da criançada, parte considerável do número que atrás refiro. Os pobres, tiritando com o frio da noite, bebericavam leite, brincavam, ou aninhavam-se no colo quente, entre saias compridas e negras, único refúgio permitido. Nem bem percebi, o porquê de não mudarem o poiso, coisa que não fizeram enquanto lá estive. Era um deles que lá estava dentro. Nem sequer cheguei a constatar devidamente, se o assunto era sério, embora isso tenha depreendido, pela amargura da cara de uns, pelas lágrimas nos olhos de outras. Sempre me lembro de assim serem, sendo que este, já nem foi o primeiro episódio do género, ao qual assisto. Já os tive bem perto, com tendas montadas nas traseiras da minha casa, embora não vá perder tempo a falar disso por ora, que já o fiz por cá de outras vezes.
Ficou-me uma sensação que tenho desde há muito. Numa tentativa rebuscada de um povo perfeito, por certo a selecção seria apertada, difícil, que começaríamos logo, nas diferenças de perspectivas, e nos vários conceitos de perfeição, completamente subjugados a cada cabeça, capaz, como se diz desde sempre, de dar a sua sentença. Ainda assim, e na luz dos meus olhos, que me parecem dignos de seleccionar, pelo menos, para mim mesma, tenho já definidas meias dúzia de particularides que sacaria amavelmente a alguns povos ou civilizações, deixando-lhes a eles os desperdícios, que terão tantos. Como todos. Um crime ímpar, por mim cometido, catalogado na lei, e bem, de roubo declarado.
Não tenho dúvidas, de que aos ciganos, roubaria a união.
Vim e eles ficaram. Os mesmos, pequenos, grandes, homens e mulheres. O outro continuava lá dentro.
Ficou-me uma sensação que tenho desde há muito. Numa tentativa rebuscada de um povo perfeito, por certo a selecção seria apertada, difícil, que começaríamos logo, nas diferenças de perspectivas, e nos vários conceitos de perfeição, completamente subjugados a cada cabeça, capaz, como se diz desde sempre, de dar a sua sentença. Ainda assim, e na luz dos meus olhos, que me parecem dignos de seleccionar, pelo menos, para mim mesma, tenho já definidas meias dúzia de particularides que sacaria amavelmente a alguns povos ou civilizações, deixando-lhes a eles os desperdícios, que terão tantos. Como todos. Um crime ímpar, por mim cometido, catalogado na lei, e bem, de roubo declarado.
Não tenho dúvidas, de que aos ciganos, roubaria a união.
Vim e eles ficaram. Os mesmos, pequenos, grandes, homens e mulheres. O outro continuava lá dentro.
quinta-feira, 13 de janeiro de 2011
Praia

O dia aqui está cinza claro. Apetecia-me a minha praia, linda em dias assim. Tinha de ser a minha, não poderia de todo, ser qualquer uma outra.
A minha praia tem areia grossa, que mistura ainda grandes calhaus que nos marcam os pés a cada onda. Tem um mar revolto e selvagem, daquele que nos dias de Inverno reclama em ruído aceso, quase parecendo, que de algo terrível se queixa, nem bem sei, como consegue albergar em sossego, os pobres peixes que por lá moram. Houve uma vez, entre tantas outras que embora não vendo, sei que existiram, em que galgou a rua até às casas, numa implacabilidade sem limites, que deixou a quem passava o caminho da fuga e pouco mais, que vencê-lo, era coisa impossível, e o ajuntamento a ele, também não constituía acto de prudência. As mulheres usam gritar bem alto nestas afrontas do mar, talvez seja, quiçá, para ver se o assustam, e se ele recolhe ao seu real sítio, vã tentativa, que ele apenas volta, quando o seu juízo assim o entende, que antes disso, entre gritos, fugas, arremessos, o que queiram lançar-lhe, continua a sua tarefa sem dó nem piedade, venha quem vier, grite o que gritar.
De épocas deveras idas, que ainda consigo trazer à memória, numa precisão de imagem clara, embora já um tanto ou quanto perdida no tempo, relembro o choro amargurado das mulheres, aquando da saída dos barcos em marés vivas, onde os pescadores, encabeçados por algum mais corajoso, remavam com toda a força de braços, a fim de se livrarem daquela fúria danada, capaz de os devorar num segundo. As ondas, tal e qual pessoas zangadas, espumavam uma espuma branca e grossa, que galgava os pobres barquitos recheados de gente e de peixe. Que se vá o peixe, gritavam elas, que nos venha a gente.
Está longe de mim há tempo demais. Ainda assim, e numa fabulosa capacidade humana conseguimos sentir nosso, o que há tanto não vemos. É a minha praia portanto.
Estabilidades
Nem bem percebe o que se passa consigo. Anda fraco, mortiço. Nunca se lembra de tal coisa, nem em tempos idos, recheados de coisa ruim, que se há vidas que por cá andam, detentoras de mágoa e agrura, a sua, poderá constar no cabeço da lista, se não em primeiro, segundo ou terceiro, pelo menos num posto imediatamente a seguir, disso, não tem qualquer dúvida. A cabeça porém sempre se ergueu. Numa coragem vinda de dentro e vinda de fora, que o seu intelecto, é suficientemente grande para perceber, que a estrutura adquirida não provem só da sua autoria, para também advir, de quem com tanto sacrifício o educou. Por isso, nem nunca ousa valorizar-se, seja em que coisa for, realçando aqui que tal valorização nem constitui hábito seu, sem a ela anexar o esforço, de quem assim o construiu. Um bem haja a ele, tenho de aqui deixar.
Por isso estranha. Estranha as noites em claro, recheadas a livros, que por muito que aprecie, já dispensava, que chega a haver alturas, em que as letras se confundem entre si, numa amálgama quase indecifrável, tal é o sono que lhe assalta a vista. De nada lhe vale o sossego que tenta depois. Num ápice, e mal a luz se desliga, os olhos reabrem e a mente desperta, quase parece, que alguma força suprema da qual desconhece a origem, resolveu em si baixar, causando-lhe este estado de confusão estranho e incontrolável, estado esse, até hoje desconhecido.
Foi muito, acaba a dizer-me. Desde a morte do pai, à doença da mãe, ao nascimento do filho, entre outras coisas, de menor carga, mais ainda assim, de carácter forte. Todas elas, detentoras de força suficiente para lhe sugar a energia, sumida que só visto, que por ora procura, temente que seja em vão.
Chega a dizer-me, já no fim das palavras, e numa clareza de ideias difícil de encontrar, que o que mais pede agora é calma, sem emoções fortes, sejam elas boas, sejam elas más, que nenhuma delas, parece conseguir aguentar. Aguenta a estabilidade, apenas e só.
Nem sei a que veio. Sabe tão bem o que lhe vai dentro, como poucos que tenho visto. À parte da história, encantam-me mentes assim.
Por isso estranha. Estranha as noites em claro, recheadas a livros, que por muito que aprecie, já dispensava, que chega a haver alturas, em que as letras se confundem entre si, numa amálgama quase indecifrável, tal é o sono que lhe assalta a vista. De nada lhe vale o sossego que tenta depois. Num ápice, e mal a luz se desliga, os olhos reabrem e a mente desperta, quase parece, que alguma força suprema da qual desconhece a origem, resolveu em si baixar, causando-lhe este estado de confusão estranho e incontrolável, estado esse, até hoje desconhecido.
Foi muito, acaba a dizer-me. Desde a morte do pai, à doença da mãe, ao nascimento do filho, entre outras coisas, de menor carga, mais ainda assim, de carácter forte. Todas elas, detentoras de força suficiente para lhe sugar a energia, sumida que só visto, que por ora procura, temente que seja em vão.
Chega a dizer-me, já no fim das palavras, e numa clareza de ideias difícil de encontrar, que o que mais pede agora é calma, sem emoções fortes, sejam elas boas, sejam elas más, que nenhuma delas, parece conseguir aguentar. Aguenta a estabilidade, apenas e só.
Nem sei a que veio. Sabe tão bem o que lhe vai dentro, como poucos que tenho visto. À parte da história, encantam-me mentes assim.
quarta-feira, 12 de janeiro de 2011
Sinais dos tempos
Assaltaram o centro. Não o centro da cidade, nada disso, que esse, com a sua rotunda recheada a montinhos de sal, e o seu café, central, claro está, que como qualquer cidade ou aldeia que se preze, também detemos um, encontra-se de boa saúde. Teve até direito, e num aparte, que nem vindo propriamente ao caso, me apetece por ora salientar, a um acontecimento inédito este ano. Ou melhor, este ano, e o outro que se findou, que o evento foi pertença dos dois, que em noite de ano novo, e num adorno apetecido ao tradicional fogo de artificio, que costumava acontecer fraco e sem graça, surgiu este ano um festejo de arromba, diz quem viu. Segundo consta, juntaram-se as gentes em volta de um palco, onde uma banda actuou a gosto, e onde a animação reinou até às altas horas da madrugada. Ficou já dada promessa de repetição para o próximo ano, coisa que deixou a população, deveras agradada. Mas indo agora directa ao assunto sobre o qual escrevo, que já se vão por cá esgotando, palavras em ninharias, assaltaram o centro. O centro de apoio a gente, que tanto dele necessita, e que dá pelo nome de ninho, num acordo totalmente condizente com o que faz realmente. E que trata aninhar e acolher pessoas, que por um qualquer motivo, algum desígnio mal dado, algum erro de projectação divino, por cá nasceu diminuído, de físico, ou de intelecto, quando não dos dois, e que necessita de apoio de terceiros, muitas das vezes, toda a sua vida, seja ela curta, seja ela longa. Essa longa vida, e num chorrilho de emoções contraditórias, é um dos piores pesadelos que encontro nos pais, tementes que estão da partida eterna, que seguindo a ordem natural da existência, ocorrerá primeiramente, o que faz com que prossigam em desassossego, por nem bem saberem quem acudirá aos seus filhos, que a mais ninguém doem, como a eles. Nem consigo, assim de rompante, catalogar estas ocorrências, que me revelam uma instabilidade social suprema, que permite a desordem entrar em campos de completo descontrolo, e que possibilitam o assalto de pequenos nadas, que pouco valem a quem leva, para tanta falta fazerem, a quem os perdeu. Um horror.
terça-feira, 11 de janeiro de 2011
Assincronias
Nem bem conhece o que são médicos, uns senhores de bata branca, afirma, dignos de respeito pela sapiência que acartam em si, que podem curar maleitas do corpo, ou até da alma, que também as há, com as mãos que Deus lhe deu. A ela nunca foi preciso, que sempre foi mulher de saúde, talvez porque sempre trabalhou de sol a sol, e às vezes, noite dentro, que a costura era o seu ofício, e houve alturas, de marchas populares, ou outras festas tradicionais de Alfama, em que a solicitação era tal, que o dia não lhe chegava para dar vazão ao trabalho, pelo que se valia da noite, como sua preciosa aliada nessas horas que não tinham fim. Não conhece o que são diabetes, hipertensões ou outras complicações, que com ela nunca nada quiseram, chegou a dizer-se, sua mãe em tempos, seus filhos agora, que é por mor do seu feitio empedernido, que as doenças não lhe assaltam o corpo, demasiado rijo, até para elas. Ela prefere a outra explicação. Como história de vida, entre outras que agora nem salienta, deixa o fogo em Santo Condestável, principal responsável para o desaparecimento do seu assento de nascimento, que decorreu exactamente no ano de 1022, mas que sua mãe, perdida no meio de tanta descendência, e aquando da recuperação dos registos, ousou dar-lhe a vinda a este mundo, pelos anos 20, ou seja, dois anos antes. O seu bilhete reza pois 90, quando na realidade conta 88, com muito orgulho.
Nem bem percebe o que agora se passa, que nunca nos dias da sua vida, tal como já foi dito, necessitou de remédios, de corpo ou de alma, pelo que de repente, contrariando todas as teorias justificativas, ao seu estado de saúde pleno, surge-lhe agora, aos 88, legalmente 90, algo que a atraiçoou, e a atirou a uma cama, que apenas conhecia nas horas tardias da noite, fora algumas, como expliquei, onde nem sequer a tocava. Não gosta dela, assim, para a aguentar tanto tempo. Sente-se por ora numa luta tamanha, entre um corpo que lhe quer descanso, e uma mente, que ainda quer vida. Assustam-me estas assincronias.
Nem bem percebe o que agora se passa, que nunca nos dias da sua vida, tal como já foi dito, necessitou de remédios, de corpo ou de alma, pelo que de repente, contrariando todas as teorias justificativas, ao seu estado de saúde pleno, surge-lhe agora, aos 88, legalmente 90, algo que a atraiçoou, e a atirou a uma cama, que apenas conhecia nas horas tardias da noite, fora algumas, como expliquei, onde nem sequer a tocava. Não gosta dela, assim, para a aguentar tanto tempo. Sente-se por ora numa luta tamanha, entre um corpo que lhe quer descanso, e uma mente, que ainda quer vida. Assustam-me estas assincronias.
E ainda pra mais, é cá dos nossos
segunda-feira, 10 de janeiro de 2011
Devaneio a modos que...
Nem bem entendo a expressão dia de cão. Chego, e o meu dorme no sofá, onde se refastelou o dia inteiro, intervalando, quiçá, pelo passeio, o almoço, a ladradela à caniche vizinha. Quanto ao meu, nem falo. Provavelmente, e com muito mais precisão, os canídeos dirão uns aos outros, em dias negros, tive um dia de Homem. E aí sim, a coisa faz sentido.
Concluindo, não tive um dia de cão. Mas queria muito tê-lo tido.
Concluindo, não tive um dia de cão. Mas queria muito tê-lo tido.
Imprevisibilidade
A imprevisibilidade da vida é coisa para me deixar agradada. Nem sempre, como será óbvio de concluírem, que o inesperado imprevisto, que nos restringe a contragosto, em nada me agrada, sendo que, ainda para mais, se assume com uma frequência tamanha, nisto e naquilo, aqui e acolá, podendo eu deixar por cá inúmeros exemplos elucidativos, coisa que nem me parece necessária, dado ser facto de conhecimento e sentimento de tudo quanto é gente. Mas temos os outros, que, como em tudo, detemos opostos fortes e declarados na nossa existência, como o amor e o desamor, a alegria e a tristeza, a energia e a inércia, e por aí fora, que a querer continuar, por certo não mais pararia, que o que não falta para aí são sentimentos antagónicos, já experimentados por todos. E os outros imprevistos, os bons que se entenda, podem constituir qualquer coisa de positivo, que por vezes, de onde pouco ou nada esperamos, inesperadamente, pode surgir-nos gente com G maior, sentimentos com um S grande, bem como outros nomes, carregadinhos de carga positiva, vindos de onde menos se espera. E o que menos se espera pode ser uma caminhada no meio do nada, um passeio, um café numa esquina, onde o previsto, era encontrar a gente de sempre, as caras dos dias. Mas onde por obra do acaso, da tal imprevisibilidade, ocorre algo que nos dá qualquer coisa grande. Fico tão satisfeita quando me ocorre o sentimento. Folgaria tê-lo mais vezes.
domingo, 9 de janeiro de 2011
Do dia
Era hoje. Mais coisa menos coisa, que poderia ser uns dias antes, ou uns dias depois, dependendo do calendário, festa que é festa, necessita de aproveitar os dias de descanso, a fim de ser possível a folia das gentes, que em tempos idos, usava delas para vestir o vestido de seda, colocar o chapéu de aba, e rumar com a família, a fim de ouvir a alvorada matutina, a banda da aldeia, ver a procissão pela tardinha, e o bailarico noite dentro. O bailarico era local privilegiado da mocidade da época, onde os homens catrapiscavam as moças casadoiras, e as levavam a um pé de dança, por vezes válido por si só, noutras, simples pretexto para uma proximidade ansiada, quem sabe já de há muito. Recusa de moça a moço, nem sequer era bem vista, que os pobres, pagavam entrada, a fim de poderem dar azo aos sonhos e ambições, coisa que às moças, nem era exigido, que podiam entrar sem qualquer tipo de contribuição, pedia-se-lhes apenas isso, dois passos de aconchego rotativo, nariz nos cabelos, e pronto, que por norma, os olhares paternos andavam perto, e se não fossem os paternos seriam os maternos, o certo, era que alguns eram, que disso, não haja dúvida.
Eu, vivi-a de perto em várias idades, desde a bebé vestida de anjo, com asas e todo o apanágio digno da procissão, à pequenez ingénua, onde tirava rifas da quermesse e comia fios de pinhão, para chegar à adolescência travessa, onde o objectivo supremo, era, e já numa era mais recente da que atrás refiro, a dança da música lenta, de nome slow, com o moço de olho azul, que tocava na banda e era lindo como só ele. Talvez até o tenha conseguido, não importa agora, nem vem ao caso.
Na casa que acolhia os festejos, existia uma escada directa a um piso superior, um tanto ou quanto mais recatado, predilecto de moços e moças, embora, e antes que se percam em devaneios descabidos e totalmente infundados, pela impossibilidade de o serem, o acesso fosse livre a toda a gente, pelo que com uma assiduidade implacável, o terreno era percorrido por um ou outro pai mais cauteloso, não fosse por lá passar-se algo de índole mais pecaminosa. Era naquele piso, que rapazes e raparigas se refugiavam dos olhos da censura, dura, como só ela sabe ser, e se atreviam a uns passos de dança mais próximos, onde o ritmo se acompanhava de palavras nos ouvidos, e pouco mais, pelos motivos que atrás refiro.
Nesse dia, vinham da capital os primos e os tios, sendo que tudo almoçava na casa de Dona Maria Carmina, borrego no forno e batata assada.
Hoje, não fui. Vozes altas se levantaram. Não que tivesse vontade propriamente dita. Acarta-me apenas uma doce melancolia, com pequenos pontos onde me centro com especial incidência, e que me deixaram saudade. Aqui, na mesa onde me encontro, tenho um elefante mealheiro, saído em rifa, que me acompanha desde uma. Os olhos azuis, também cá ficaram.
Eu, vivi-a de perto em várias idades, desde a bebé vestida de anjo, com asas e todo o apanágio digno da procissão, à pequenez ingénua, onde tirava rifas da quermesse e comia fios de pinhão, para chegar à adolescência travessa, onde o objectivo supremo, era, e já numa era mais recente da que atrás refiro, a dança da música lenta, de nome slow, com o moço de olho azul, que tocava na banda e era lindo como só ele. Talvez até o tenha conseguido, não importa agora, nem vem ao caso.
Na casa que acolhia os festejos, existia uma escada directa a um piso superior, um tanto ou quanto mais recatado, predilecto de moços e moças, embora, e antes que se percam em devaneios descabidos e totalmente infundados, pela impossibilidade de o serem, o acesso fosse livre a toda a gente, pelo que com uma assiduidade implacável, o terreno era percorrido por um ou outro pai mais cauteloso, não fosse por lá passar-se algo de índole mais pecaminosa. Era naquele piso, que rapazes e raparigas se refugiavam dos olhos da censura, dura, como só ela sabe ser, e se atreviam a uns passos de dança mais próximos, onde o ritmo se acompanhava de palavras nos ouvidos, e pouco mais, pelos motivos que atrás refiro.
Nesse dia, vinham da capital os primos e os tios, sendo que tudo almoçava na casa de Dona Maria Carmina, borrego no forno e batata assada.
Hoje, não fui. Vozes altas se levantaram. Não que tivesse vontade propriamente dita. Acarta-me apenas uma doce melancolia, com pequenos pontos onde me centro com especial incidência, e que me deixaram saudade. Aqui, na mesa onde me encontro, tenho um elefante mealheiro, saído em rifa, que me acompanha desde uma. Os olhos azuis, também cá ficaram.
Sítios
Dentro do carro, correram as horas, nem por elas demos, que por norma, o ser humano tem esta capacidade extraordinária de relativizar o tempo, ou seja, conseguir transforma-lo em algo controlável, dependendo apenas das nossas emoções. Quase nos deixa um sentimento, por fátuo que seja, de extrema capacidade, como se as nossas faculdades internas se encontrassem naquele exacto momento numa supremacia total, e se prestassem, só porque sim, a dominar o que mais nos foge, ou não, dependendo do contexto. Pura ilusão. E dizia eu que passaram as horas, num sitio que algo me acarta, nem bem sei, o porquê desse facto só me ter ocorrido no fim, já a noite ia longa, por assim dizer, já as frases escasseavam, fruto do cansaço, quando em paragem súbita de palavras minhas e palavras tuas, olho em redor e descubro a torre para onde se atiravam moedas, o chão onde me sentei horas a fio, a esplanada onde comi tremoços, o toldo onde me abriguei da chuva. Ele também veio de arrasto, só podia, que a impossibilidade, era retira-lo da história, embora tenha surgido sumido, ténue e frágil. Sorri para dentro, faço isso muitas vezes. Entretanto, e na chuva intensa, deixe-te mais perto. És uma boa amiga querida. Gosto de ti.
Esquecimentos
Oiço-te ao longe. Sem te olhar os olhos, pela impossibilidade da distância, sinto-lhe as lágrimas, quase parece, que as vejo escorrer no teu rosto, magro e cansado, fustigado, talvez seja o melhor termo. Por vezes, chego a esquecê-lo. Poderá tal facto nem parecer coerente, poderá até constituir admiração aos caros leitores que por cá passam, mas a verdade, é que me esqueço com facilidade de rostos. Não todos, mas alguns deles, nem me parecendo a mim haver, um critério definido para tal facto, surge a situação, de nada em concreto, podendo emergir ligada a gentes novas, que me cruzam o caminho umas poucas vezes, o que até consigo encaixar na normalidade, ou, em outras situações, em gente que conheço há muito, mas que por motivos diversos, abalam para longe, deixando-me apenas e só uma memória desenhada. Memória essa que pode ser forte, ou pode ser fraca, constituição que adquire, quiçá, aleatoriamente, que já quase esqueci caras importantes, para me lembrar, com grande detalhe, de caras fugitivas, que cruzei em determinado contexto, e que não mais se apagaram. Não que me esqueça por completo. Consigo relembrar pormenores, ou então, contrariamente, por vezes o todo, falhando-me as partes, como a cor dos olhos, a tez da pele. Gostaria de atingir a supremacia da selecção, ou seja, conseguir um qualquer mecanismo interno, que eu adaptasse a esta minha faculdade, e que me permitisse um encaixe perfeito e coerente, extensível até, e porque não, a todas as outras particularidades da minha memória. Lembraria isto, esqueceria aquilo, enfim, um deleite de emoções deliberadas apenas por mim e pela minha vontade, estando certa de que te lembraria até ao mais ínfimo pormenor. Outros que por cá tenho, não tinha.
sexta-feira, 7 de janeiro de 2011
Destinos, acasos, e outros que tais
Chovia. Nas estradas corria águas em fio, quase parecia, que as profecias que rezam o final do tempos, ter-se-iam dado a trabalhos, e resolvido começar sem aviso prévio, algures numa estrada, onde por mero acaso do destino, me encontrava. Tenho inúmeras destas ocorrências na minha existência, de me encontrar em certos e determinados sítios, em horas específicas e concretas, onde coisas fortes acontecem, e que apenas com alguns minutos de antecedência, eu teria evitado sem qualquer dificuldade, mas não, guardo-me a mim mesma para elas, nem sei se a propósito, se a descuido, se a intento, meu, ou de quem por cá mande as existências. Depois ocorre ainda o inverso. Há tempos, e por uns míseros minutos, deixei de ver-te, coisa que a mim me confunde seriamente, ainda para mais, quando a ânsia me tomou, como se eu fosse pertença dela, e me roubou o fôlego e a vontade, que naquele dia, naquela hora, naquele exacto momento, apenas conhecia ver-te, como se mais nada existisse, como se mais nada se passasse, nem me parece prudente tal alucinação, capaz de nos deixar internamente desordenados. Não aprecio o sentimento, que se por um lado nos eleva, em caso de conclusão, por outro, e admitindo aqui a frequência dos desencontros da vida, nos rebaixa a um local estranho, indesejado, difícil de encarar, mas, ironicamente, quase impossível de abandonar.
Nos entretantos, ousou trovejar. Já lhe tive medo, hoje apenas os respeito. Nem bem sei o real motivo, mas chego a pensar, que nos avanços da idade, encaramos a nossa fragilidade como um estado de alma, sendo que nos movimentamos no meio do perigo, sem desassossegos grandes, confiando na sorte, no destino, como se deles dependêssemos apenas e só. Não será tanto assim, mas bem vistas as coisas, e rebuscando os tempos que atrás descrevo, nem sequer estamos muito longe.
Nos entretantos, ousou trovejar. Já lhe tive medo, hoje apenas os respeito. Nem bem sei o real motivo, mas chego a pensar, que nos avanços da idade, encaramos a nossa fragilidade como um estado de alma, sendo que nos movimentamos no meio do perigo, sem desassossegos grandes, confiando na sorte, no destino, como se deles dependêssemos apenas e só. Não será tanto assim, mas bem vistas as coisas, e rebuscando os tempos que atrás descrevo, nem sequer estamos muito longe.
quinta-feira, 6 de janeiro de 2011
Sem palavras
Chegou-me hoje sem proferir palavra. Não fala há anos, fechou-se no mundo dela, que nem bem sabemos se é doce ou amargo, sabemos apenas e só, que de lá não quer sair, deixando-a mergulhada numa paz eterna que julgo ter, para no fundo admitir, que o que lá se encontra, poderá ser um tumulto desmesurado, de emoções duras e frias, ao ponto de ser melhor resguarda-las, não vá a sua libertação para o mundo, causar-lhe algum tipo de dano irreversível, poderá bem ser o caso, terei de o perceber mais tarde.
Os olhos não transpareciam qualquer tipo de emoção, pelo que lhe agarrei na mão, a fim de sentir um aperto ou um desleixo, que me dissesse algo daquela estranha criatura que hoje mudou de lugar, por motivos de força maior. Nada me disseram, sendo que se mantiveram dentro das minhas, sem qualquer tipo de reacção plausível de entendimento, não fugiram, não se deixaram estar com intenção, ficaram apenas ali, como poderiam ter ficado em qualquer outro local onde as tivessem colocado.
Gostaria de lhe entrar na mente. Está-me no sangue a penetração nos pensamentos alheios, não por curiosidade propriamente dita, mas, e neste caso específico, por uma vontade tremenda de perceber, o que faz alguém ausentar-se do mundo, ou melhor, ausentar os outros do mundo dela, como se já cá nem estivesse, como se já nem fizesse falta.
Os olhos não transpareciam qualquer tipo de emoção, pelo que lhe agarrei na mão, a fim de sentir um aperto ou um desleixo, que me dissesse algo daquela estranha criatura que hoje mudou de lugar, por motivos de força maior. Nada me disseram, sendo que se mantiveram dentro das minhas, sem qualquer tipo de reacção plausível de entendimento, não fugiram, não se deixaram estar com intenção, ficaram apenas ali, como poderiam ter ficado em qualquer outro local onde as tivessem colocado.
Gostaria de lhe entrar na mente. Está-me no sangue a penetração nos pensamentos alheios, não por curiosidade propriamente dita, mas, e neste caso específico, por uma vontade tremenda de perceber, o que faz alguém ausentar-se do mundo, ou melhor, ausentar os outros do mundo dela, como se já cá nem estivesse, como se já nem fizesse falta.
quarta-feira, 5 de janeiro de 2011
Do dinheiro
É certo e sabido que o dinheiro é uma das principais máquinas que movimenta o Homem. Acredito porém, que muitas das vezes, movimenta-o mal, sendo que lhe percorre as entranhas e lhe suga a existência, quase fazendo, para não radicalizar e dizer que faz mesmo, com que se esqueça do que importa, e se centre no que menos vale, mas que numa primeira vista, quase parece encher-nos de substância. Talvez encha. Mas efémera, sem dúvida. Esquecemos que o espaço é limitado, permitimos a invasão do que não interessa, e permitimos ainda que se esvaeça em nada o que realmente nos humaniza, nem bem compreendo, o porquê da nossa dificuldade em nos centrarmos no meio termo, extremosa virtude à qual nos alheamos, aqui, como em tantas outras coisas, onde a falta de equilíbrio nos manipula, descaradamente, arrisco dizer.
"Comprar" gente, que aqui se encontra entre aspas, apenas e só porque me soa muito mal o termo, parece-me a mim um tanto ou quanto degradante, julgo haver por cá, outras formas de usar dinheiro, podendo eu até arriscar uma ou duas, deixando de fora imensas outras, como ajudar alguém que precise. Ou ainda, e seguindo a conduta do bom senso, amparar alguma criança perdida neste mundo hostil e perverso, dado que na actualidade, ainda continuam a existir sofrimentos atrozes em pequenos seres, que necessitam de um lar, porque o não têm, e aos quais a sociedade, no geral, nem sabe bem o que faça. Poderia continuar, que argumentos não me faltavam, mas julgo nem ser necessário, que os usados parecem-me mais do que suficientes, para a minha repugna por certos acontecimentos, onde, a meu ver, e tecendo aqui uma consideração, nem sendo hábito meu, ninguém tem razão. Vender ou comprar gente, deveria ser um acto punido por lei. Mesmo que feito disfarçadamente, com jeitinho e alguma (pouca) descrição.
"Comprar" gente, que aqui se encontra entre aspas, apenas e só porque me soa muito mal o termo, parece-me a mim um tanto ou quanto degradante, julgo haver por cá, outras formas de usar dinheiro, podendo eu até arriscar uma ou duas, deixando de fora imensas outras, como ajudar alguém que precise. Ou ainda, e seguindo a conduta do bom senso, amparar alguma criança perdida neste mundo hostil e perverso, dado que na actualidade, ainda continuam a existir sofrimentos atrozes em pequenos seres, que necessitam de um lar, porque o não têm, e aos quais a sociedade, no geral, nem sabe bem o que faça. Poderia continuar, que argumentos não me faltavam, mas julgo nem ser necessário, que os usados parecem-me mais do que suficientes, para a minha repugna por certos acontecimentos, onde, a meu ver, e tecendo aqui uma consideração, nem sendo hábito meu, ninguém tem razão. Vender ou comprar gente, deveria ser um acto punido por lei. Mesmo que feito disfarçadamente, com jeitinho e alguma (pouca) descrição.
Incomodos
As partes do corpo não se sentem. São nossas, pertence-nos, de forma intensa e osmótica, numa fusão perfeita entre elas, formando um todo harmonioso. Sentimos alguma quando ela por algo nos incomoda, sendo que o algo poderá ser uma dor, ou qualquer outra sensação potenciadora de desconforto, capaz de nos fazer lembrar que naquele sítio existe qualquer coisa. Ou poderemos ainda percebê-las, quando nos proporcionam um qualquer sentimento bom, dos quais poderia aqui dar exemplos variados, nos quais por ora não me perco, dado nem ser o caso. Neste preciso momento, sinto com força, o meu coração. Não que me doa, nada disso. Incomoda-me, apenas e só.
terça-feira, 4 de janeiro de 2011
Pela boca morre o peixe
Filho: - Mãe, ata-me o sapato.
Filho: - Mãe, veste-me o casaco.
Filho: - Mãe, leva-me a mochila.
Eu, mãe, vou ouvindo.
Madrinha: - Mas o que é isto? Os homens são todos assim. Já o A., não sabe levantar-se para fazer nada. É traz-me um copo de água, é traz-me o comando, é abre a janela...
Nos entretantos...
Pai, ou seja avô: - Vou lá fora.
Madrinha: - Paaaiii, não te esqueças de me levar as malas.
Filho: - Ààààhhh, agora é leva-me as malas!!!
Filho: - Mãe, veste-me o casaco.
Filho: - Mãe, leva-me a mochila.
Eu, mãe, vou ouvindo.
Madrinha: - Mas o que é isto? Os homens são todos assim. Já o A., não sabe levantar-se para fazer nada. É traz-me um copo de água, é traz-me o comando, é abre a janela...
Nos entretantos...
Pai, ou seja avô: - Vou lá fora.
Madrinha: - Paaaiii, não te esqueças de me levar as malas.
Filho: - Ààààhhh, agora é leva-me as malas!!!
Contágios
Sentada na esplanada, sujeita-se aos ares de inverno em prol de um cigarro, uma coisa que mais não é, do que uma vareta empedernida, que se mirra a cada puxo, poderemos aqui constatar, a fragilidade da espécie, que se rende a nada, como se do nada dependesse, ou melhor, depende mesmo, sejamos verdadeiros e concisos. Nunca me parece prudente, o uso da palavra B, quando a que realmente encaixa é a palavra A, que na nossa língua, podemos gabar-nos desta mais valia, sendo que julgo nem haver, situação, coisa, ou sentimento, que necessitemos de baptizar sem ter com quê. Se há riqueza que possuímos são as nossas palavras, não me parece que possa existir, contestação a este facto. Apesar disso, em tempos, já tive medo. De usar palavras fortes, que se entenda, pelo que amenizava o que podia, num receio infundadíssimo de ferir susceptibilidades. Erro crasso. Se há coisa que se aprende com o crescimento, é que as palavras devem ser usadas na hora certa, no local certo, na descrição certa, pelo que, e só a título de exemplo, poder-vos-ei dizer que parir, é sempre mais preciso do que ter um bebé, e para além disso, poupa-nos palavreado, que também não sou a favor do desperdício infundado. Tudo isto, respeitando as regras linguísticas e de educação, obviamente. Mas eis que já me perdi. Fiz exactamente o que acima digo que nem sequer se deve fazer, ou seja, desperdiço palavras, quando no fundo, o que me ocorre, é dizer uma mísera coisa, que passo já a escrever, não vá perder-me de novo em frases e argumentos. Ela estava sentada, e fumava um cigarro. Ele passou, traduzido num farrapo de miséria, a quem apetecia também, uns puxos na vareta que embala gente. Nem censuro, como nem censuro também, a resposta negativa proferida pela Senhora. Perturbou-me porém o despeito, como se a miséria externa, pudesse de alguma forma pegar-se, contagia-la a ela, digna de si, através daquele pedinte miserável, que não precisou chegar perto, para causar uma repulsa notória, percebeu, o pobre, e saiu depressa. Não concebo ainda, o porquê de não entendermos, que a desgraça interna, leia-se ódios, pretensões, hipocrisias, e afins, se contagia muito mais facilmente. Só essa nossa grande ignorância, justifica a praga.
segunda-feira, 3 de janeiro de 2011
Mudanças
Já tenho pensado, que o mundo é dos grandes, que nem sou muito apologista das teorias que afirmam, que o mundo é de todos um bocadinho, como se verdade fosse, a distribuição das grandezas, sejam elas de que carácter for, em partes iguais. Não é assim, nada disso se verifica, sendo que subjugada a critérios diversos que desconheço, a divisão é feita, segundo me parece, sem qualquer rigor, deixando a César o que é de César, e muitas das vezes, a César o que não é de César, enfim, são as vicissitudes tamanhas que nos toldam a existência, e nos fazem crer que a justiça, é uma grandeza por nós criada e por nós destruída, que nos terrenos supremos, é coisa que nem sequer existe, não se lhe sente o cheiro, não se lhe conhece a importância, nada poderemos fazer quanto a isso.
Mas dizia eu, que este mundo é dos grandes, sendo que daqui poderemos retirar inúmeros significados, e inúmeras grandezas, umas delas mais detentoras de poder do que outras, bem certo que sim. Vou eu apenas centrar-me numa, por agora me ter acontecido algo, que me fez entrar em pensamentos, daqueles sérios, profundos, inconclusivos, bem sei, mas ainda assim, úteis o suficiente, que a utilidade das coisas, é assunto delicado de se catalogar, pelo que me reservo no direito de considerar, que ainda que nada de concreto advenha das minhas divagações, elas são de um interesse supremo, por me sacudirem, por me intrigarem, por me fazerem mover internamente, coisa que muito aprecio. E eis que me debruço sobre os corajosos, os lutadores, os que caminham sem cessar, seja em terreno dócil, seja em chão vil e cruel, por considerarem que a humanidade, deles depende para a sua evolução, e por nada lhes chegar senão os limites inatingíveis, pelo que a busca constante é o único caminho que conhecem, ou seja, são caminhantes eternos. Porém, em momentos ingratos, quase que julgo, e dada a injustiça terrena, que muitas das vezes, a esses, resta a frustração de nunca se atingir. A glória, acaba por vir aos que se resignam, aos que nada lutam, aos que nada querem, porque o pouco lhes sabe a muito. Qualquer dia, ainda não sei quando, mudo de lado.
Mas dizia eu, que este mundo é dos grandes, sendo que daqui poderemos retirar inúmeros significados, e inúmeras grandezas, umas delas mais detentoras de poder do que outras, bem certo que sim. Vou eu apenas centrar-me numa, por agora me ter acontecido algo, que me fez entrar em pensamentos, daqueles sérios, profundos, inconclusivos, bem sei, mas ainda assim, úteis o suficiente, que a utilidade das coisas, é assunto delicado de se catalogar, pelo que me reservo no direito de considerar, que ainda que nada de concreto advenha das minhas divagações, elas são de um interesse supremo, por me sacudirem, por me intrigarem, por me fazerem mover internamente, coisa que muito aprecio. E eis que me debruço sobre os corajosos, os lutadores, os que caminham sem cessar, seja em terreno dócil, seja em chão vil e cruel, por considerarem que a humanidade, deles depende para a sua evolução, e por nada lhes chegar senão os limites inatingíveis, pelo que a busca constante é o único caminho que conhecem, ou seja, são caminhantes eternos. Porém, em momentos ingratos, quase que julgo, e dada a injustiça terrena, que muitas das vezes, a esses, resta a frustração de nunca se atingir. A glória, acaba por vir aos que se resignam, aos que nada lutam, aos que nada querem, porque o pouco lhes sabe a muito. Qualquer dia, ainda não sei quando, mudo de lado.
domingo, 2 de janeiro de 2011
Amores
Leio no telefone o que já li tantas vezes, quase parece, que poderá desta tornar-se verdade.
Está em parte incerta, fugida de um marido também ele incerto, que a natureza humana tem destas coisas, e existe gente assim, incerta, num elogio à loucura suprema, num desafio à coerência e à capacidade de crença alheia, que pobre de si, perante as promessas, admite uma e outra vez o regresso, que vá lá saber-se, o que poderá advir, se efectivar a sua ausência de vez.
Poderá até, quiçá, aparecer um outro alguém mais incerto ainda, capaz de atrocidades maiores, de feitos piores, e que ao invés do prato, lhe atire a cadeira, a mesa, ou até, algum objecto de maior envergadura, capaz de a magoar ainda muito mais profundamente. Assim, as grandes mazelas ninguém as vê, que ficam lá dentro, se é que me faço entender, que por fora, e ressalvando alguma rara excepção, não há marcas que se vejam, valha-nos isso. Secretamente, bem escondidas num qualquer local, que ela insiste em esquecer, como se possível isso fosse, é que se encontram as cicatrizes marcadas, aquelas que o tempo não cura, quase parecendo por vezes, que até as atiça. Nem bem se percebe, o porquê da perfeição humana, não ser detentora de um qualquer balsamo interno, capaz de amenizar a dor de quem sofre, um qualquer sucedâneo do betadine, parecer-me-ia servir perfeitamente. Quando ela passa na rua, ninguém suspeita de tal situação, ela e suas gentes, assumem-se, hoje e sempre, como família de bem, trabalhadora, com nome a manter, pelo que por ora, o que fez, foi ausentar-se, como tantas vezes já se ausentou, para quando ele acalmar, ela voltar, para o seio onde reinará de novo um amor que ela apregoa existir, com toda a certeza do mundo. Já sabes querida, que foi esta a última vez.
Está em parte incerta, fugida de um marido também ele incerto, que a natureza humana tem destas coisas, e existe gente assim, incerta, num elogio à loucura suprema, num desafio à coerência e à capacidade de crença alheia, que pobre de si, perante as promessas, admite uma e outra vez o regresso, que vá lá saber-se, o que poderá advir, se efectivar a sua ausência de vez.
Poderá até, quiçá, aparecer um outro alguém mais incerto ainda, capaz de atrocidades maiores, de feitos piores, e que ao invés do prato, lhe atire a cadeira, a mesa, ou até, algum objecto de maior envergadura, capaz de a magoar ainda muito mais profundamente. Assim, as grandes mazelas ninguém as vê, que ficam lá dentro, se é que me faço entender, que por fora, e ressalvando alguma rara excepção, não há marcas que se vejam, valha-nos isso. Secretamente, bem escondidas num qualquer local, que ela insiste em esquecer, como se possível isso fosse, é que se encontram as cicatrizes marcadas, aquelas que o tempo não cura, quase parecendo por vezes, que até as atiça. Nem bem se percebe, o porquê da perfeição humana, não ser detentora de um qualquer balsamo interno, capaz de amenizar a dor de quem sofre, um qualquer sucedâneo do betadine, parecer-me-ia servir perfeitamente. Quando ela passa na rua, ninguém suspeita de tal situação, ela e suas gentes, assumem-se, hoje e sempre, como família de bem, trabalhadora, com nome a manter, pelo que por ora, o que fez, foi ausentar-se, como tantas vezes já se ausentou, para quando ele acalmar, ela voltar, para o seio onde reinará de novo um amor que ela apregoa existir, com toda a certeza do mundo. Já sabes querida, que foi esta a última vez.
...
O meu primeiro filme do ano, foi o Armageddon. Visto, pela enésima vez. Não, não foi uma boa maneira de começar o ano. Há filmes, que não deveriam existir. Exaltam-me uma fragilidade taciturna, incómoda. Felizmente, na noite, surgiu o rato que cozinha. Gosto dele que me farto.
Objectivos
Surgem-nos sempre pensamentos num inicio de qualquer coisa. Mesmo que os prognósticos se assumam ténues, as perspectivas delicadas, os objectivos meio tremidos, por falta de apoio circunstancial, o vazio é coisa que não existe na nossa mente, nem sei se por bem se por mal, que se há coisa que eu agradecia que houvesse, não sempre que se entenda, mas por vezes, era um vazio existencial, onde o nada me enchesse, apenas e só, para poder purgar, todas as sujidades que me atentam a alma. Não sendo isso possível, por muito que acomode, arrume, despeje ou assim, nunca me consegui libertar de forma eterna e efectiva, de determinados lixos, sendo que existe sempre algo, alguém ou qualquer outra coisa, susceptível de me desencadear emoções, que de novo mos trazem à memória, numa eficácia tremenda do meu inconsciente, que ao invés de me proteger, lavar com sabão clarim, podendo até aqui admitir a ajuda do sol, que poderia corar-me e fazer desaparecer de vez, com qualquer tipo de sujidade anómala, me atenta, como se a mim nem pertencesse. Ingrato.
Mas adiante, e admitindo vazios, poderiam esses períodos constituir lavagens internas, traduzindo com efeito aquelas vãs tentativas que efectuamos por vezes, a fim de nos retirar espiritualmente, como se a nossa mente, fosse coisa passível, de por si só se isentar da realidade, e eliminar o que a atormenta. Há até quem o considere possível, num elogio a teorias várias, que admitem a profunda concentração do homem, e um estado de absoluto vazio, perfeitamente exequível e em todo proveitoso, seguindo aqui a minha linha de pensamento, que apenas difere, pela impossibilidade a que julgo, ser possível chegar-lhe.
Posto isso, e continuando o raciocínio, ambiciono para o novo ano, muitas coisas. A maioria delas, nem me parecem importantes de salientar, uma vez que se tratam de meros objectivos pessoais, uns atingíveis, outros talvez não, mas pelos quais eu luto, da mesma forma que o faço pelos primeiros, que de outra forma, não me parece possível atingi-los de todo. Mas o que aqui deixo, numa brilhante conclusão, à qual já quase cheguei muitas vezes, mas que agora volto a alcançar, com uma outra força, e que quero partilhar, é a de que para amar o próximo, é necessário amá-lo com os seus defeitos, as suas dúvidas, as suas particularidades, as suas limitações. É fácil amar o bom. É fácil querer mudar o outro. A fim da plenitude, deveria ser fácil a aceitação. Ainda não é, mas eu vou tentar que me seja.
Para o ano, dir-vos-ei se lá cheguei. Mas é provável, que esteja algures no caminho.
Mas adiante, e admitindo vazios, poderiam esses períodos constituir lavagens internas, traduzindo com efeito aquelas vãs tentativas que efectuamos por vezes, a fim de nos retirar espiritualmente, como se a nossa mente, fosse coisa passível, de por si só se isentar da realidade, e eliminar o que a atormenta. Há até quem o considere possível, num elogio a teorias várias, que admitem a profunda concentração do homem, e um estado de absoluto vazio, perfeitamente exequível e em todo proveitoso, seguindo aqui a minha linha de pensamento, que apenas difere, pela impossibilidade a que julgo, ser possível chegar-lhe.
Posto isso, e continuando o raciocínio, ambiciono para o novo ano, muitas coisas. A maioria delas, nem me parecem importantes de salientar, uma vez que se tratam de meros objectivos pessoais, uns atingíveis, outros talvez não, mas pelos quais eu luto, da mesma forma que o faço pelos primeiros, que de outra forma, não me parece possível atingi-los de todo. Mas o que aqui deixo, numa brilhante conclusão, à qual já quase cheguei muitas vezes, mas que agora volto a alcançar, com uma outra força, e que quero partilhar, é a de que para amar o próximo, é necessário amá-lo com os seus defeitos, as suas dúvidas, as suas particularidades, as suas limitações. É fácil amar o bom. É fácil querer mudar o outro. A fim da plenitude, deveria ser fácil a aceitação. Ainda não é, mas eu vou tentar que me seja.
Para o ano, dir-vos-ei se lá cheguei. Mas é provável, que esteja algures no caminho.
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