sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Outono

Há dias em que gostava muito de acordar em outro lugar. Outro lugar que não aquelas quatro paredes, salpicadas de pingos de bolor preto e frestas acentuadas. Pela janela, gostaria de ver outra coisa senão umas oliveiras sem folhas e sem frutos, mirradas pelo sol de Outono, quase tanto como ela mesma. O sol de Outono tem na natureza, mais ou menos o mesmo efeito que o Outono da vida trás aos corpos, um ressequimento acentuado e interno, que pode até passar despercebido por muito tempo, mas que quando aparece, quando verdadeiramente se deixa transparecer, ganha um fulgor forte, impossível de negar ou de esconder. Ali já houve vida. Ainda se lembra, tal e qual como se fosse hoje, das oliveiras onde colhia azeitonas verdes e pretas, que subiam uma encosta em escadinha, seguidas umas nas outras, respeitando o preceito da distância considerada indicada para que o crescimento se desse de feição. Era pequena, e dona de um balde preto e deformado pelo sol, que lhe era entregue em mão, com a responsabilidade de o fazer cheio, por aquelas que encontrasse caídas no chão, mas ainda na sua devida saúde. Os panos verdes guardavam a lida das mulheres, que com umas varas grandes sacudiam a oliveira, e deixavam cair por terra muito daquele precioso fruto, que depois de moído, nos tempera o pão e o bacalhau. Se ao menos fosse uma dessas, a que da janela se vê, e poderia até gostar de ali acordar, que era de imediato transportada para as tardes já frias de Novembro, vividas em tempos, mas não. A sua avó, já há muito lhe disse, que não se pode nunca voltar atrás.

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