sexta-feira, 13 de julho de 2012

Bolo de nozes e passas de uva

Não te canto os parabéns a sair de um bolo porque não sou a Marilyn e ainda por cima não sou loira. Deus quis que eu fosse morena, sabes, encaixou-me na normalidade terrena e deixou-me assim, solta aos lobos num mundo onde os espertos, as loiras e os políticos, se safam às mil maravilhas. Nada tenho contra nenhum deles, atenção. Mas é que como eu não sou nada disso a coisa complica-se sinificativamente para o meu lado, mas olha, vai-se andando. Não simpatizo muito com esta expressão, muito embora numa incongruência daquelas tamanhas a use muitas vezes. Nem que me importe de assumir que estou mal se o estiver, ou bem se for caso disso, acho que é mais por hábito do que outra coisa, e quiçá também por cansaço, dado que cabe lá tudo quanto te possa passar pela cabeça. Se estou triste vou andando, que mais remédio, se estou contente também, só que um bocadinho melhor. Se andar adoentada, mal há-de ser se me estorvar seriamente o andar, e se vender saúde ando que me farto. Vou sempre andando, pronto, e é por isso que a expressão me dá tanto jeito. Neste mundo de correria são uma maravilha estas expressões onde cabe tudo e mais alguma coisa, nas quais nunca nos comprometemos mas respondemos sempre, não falhando por conseguinte as regras da boa educação que é uma coisa primordial na nossa espécie. Eu, por exemplo, não suporto gente deselegante, deseducada, que faz barulho excessivo ou que não me responde a um cumprimento. Ainda outro dia um homem escuro de mãos encardidas e ásperas falava comigo enquanto roía um palito, e no meio da conversa teve a bela ousadia de cuspir para o chão. Passei-me. Não suporto gente que cospe para o chão enquanto fala, e que por causa disso coloca fora do corpo partes que não interessam nem ao menino jesus. Bem sei, somos assim, não podemos atafulhar cá dentro a imensa mescla que nos povoa, todo o  enchimento que nos nasce das vísceras que teimamos em entupir com tudo e mais alguma coisa que nos saiba bem ao paladar e ao espírito. Mas a verdade verdadinha é que há coisas que são para expulsar em prudência. Em sítios onde não sejamos vistos, olhados, cheirados, que o interior de cada um é um terreno muito pessoal, seja ele de que ordem for. É interno, pertença do nosso self, logo, e pelo menos na essência, deve permanecer escondido, recatado, apenas exposto de forma criteriosa e delicada. Não muda nada, eu sei. De nada nos vale o esconderijo das ânsias que nos povoam a mente, o abafamento das sofreguidões da carne e o recalcamento das malvadezas que nos espicaçam a alma. Tal como de nada nos vale fingir que não somos gente inundada de matéria orgânica e consequentemente sujeita ao apodrecimento e à decomposição. Continuamos a ser exactamente iguais ao que seríamos se manifestássemos tudo a céu aberto e não resguardássemos minimamente as cavidades que possuímos no corpo. Mas agora só terminando e para que conste hoje, eu, pessoa educada e recatada, se fosse loira e muito bela cantava-te os parabéns saída de um bolo de nozes e passas de uva, num sítio onde ninguém nos visse.

( Isto foi escrito há muito mas ficou guardado. É que depois, para além do sítio, também há aquela coisa do momento. Bhá, tanta merdice.)

3 comentários:

  1. Com que então, as loiras (juntamente com os espertos e os políticos) safam-se... Quem to disse, hm...? Olha que as morenas (juntamente com os lobos) sempre levaram a melhor - e por último... :)

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  2. Paulo, nunca vi isso :)

    Antígona, estás boa? Já andava a sentir-te a falta :):)

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