sábado, 15 de setembro de 2012

Acasos

A casualidade da existência é qualquer coisa que sempre me intrigou. Não consigo encará-la de forma natural, aceitá-la sem questões, interiorizar que as coisas nos acontecem de determinada forma, regidas sob determinada ordem, tudo por acaso. Até porque existimos nós, muito embora sejamos considerados por muitos como seres que actuam também em modo casual, nós próprios e sobre nós mesmos. Conseguimos atribuir essa questão a determinadas acções do nosso corpo com relativa facilidade, é certo, sendo até que chego a julgar que nos defende de qualquer coisa que não nos apetece contextualizar. É legítimo, livra explicações, questões e outros aborrecimentos que nos dias que correm devem de ser evitados, andamos cansados, a crise não ajuda, o verão nunca mais acaba, enfim. 
Desde que me debrucei sobre determinadas teorias que abordam o assunto, deixei porém de conseguir encarar-nos nesta ligeireza que me parece forçada, exagerada, eventualmente inexistente. As acções que impelimos ao corpo surgem-nos sempre inseridas em um conjunto significativo de circustâncias físicas ou mentais, que nos impelem a determinada acção que em outra situação seria outra. Poderemos ainda, e no seguimento, considerar que uma mesma ocorrência uns dias depois poderá desencadear impulsos diferentes, uma vez que o factor tempo é presencial, bem como o factor aprendizagem, e ainda todos os outros envolvidos no processo. São factos, concretos, pelo que não pode ser sensato encararmos de outra forma a questão. 
Não consigo porém traduzi-la eficazmente para a ordem externa, confesso. Não há nada até hoje que me tenha conseguido justificar a direcção do mundo, as horas definidas para mortes ou nascimentos, as sortes e os percalços que nos apanham à traição, as laranjas que nos caem na testa, as coisas boas que nos acontecem. A natureza em essência pode fazer-me algum sentido, é quase perfeita, fusional, complementa-se uma com a outra com uma destreza própria de uma realidade muito bem conseguida, mas ainda assim falha-me de facto no destino incerto. 
Não querendo retirar daqui qualquer tipo de conclusão existencial, parece-me que poderemos no entanto considerar que agimos deliberados num mundo que recebe essas deliberações de forma leviana e imprudente. Dependemos dele para que as nossas acções tenham efectivamente o efeito pretendido, o que nos transforma numa espécie de seres subjugados verdadeiramente ao acaso, não ao nosso, mas ao do que nos rodeia.
Dado o cenário, há muito tempo que me comecei a borrifar um pouco para estes assuntos da realidade. Penso sobre eles, disserto um pouco a ver se distraio o espírito em horas mortas, mas pouco mais. Será eventualmente uma estratégia de adaptação da minha parte, uma vez que não encontro explicações credíveis para o assunto, nem qualquer tipo de manipulação satisfatória. Deixei então de me preocupar seriamente com as existências que fogem à intenção dos corpos, que nos escapam das mãos, que não dependem de todo de nós. Em contrapartida, e uma vez que necessito de ocupar o meu tempo, debruço-me cada vez mais sobre as outras, aquelas onde mandamos, onde escolhemos, onde decidimos e onde caminhamos, as únicas verdadeiramente nossas. Que nunca são por acaso.  

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