segunda-feira, 31 de maio de 2010

Brian Adams, ou de como as coisas mudam

O dia hoje foi acelerado. A secretária ficou atulhada de papéis, coisa que muito me envergonha, que sou arrumada em tudo na minha vida. Pastas, post its soltos, canetas e assim, e até um pastel de Tentugal, trazido por uma funcionária que insiste em me adoçar a boca, vá lá saber-se porquê. Gosto de doçaria portuguesa. Para além dos pasteis, outros acepipes me tiram do sério. Tortas de Azeitão, farófias, que nem sei se não nossas, se roubadas, mas gosto, arroz doce, queijadas de Sintra, enfim. Perco-me ainda por Doçaria Conventual, desde o papo do anjo à barriga da freira, e a tudo quanto seja doce pecado, sou uma pecadora que só vendo, eu. Venho para casa, já em ponto rápido, e apanho, numa qualquer rádio local, daquelas que misturam pimba com boa música, com uma mestria descomunal, o Brian Adams, com Everything i do. Consigo ouvi-la uns 10 segundos, sabendo a letra de cor, claro, que foi música que ouvi em tempos de adolescência mil vezes na mesma tarde, sozinha, acompanhada, e bem acompanhada. Nada me fazia sonhar mais que este Senhor a cantar, ou até talvez houvesse qualquer coisa com idênticos poderes, como o Tom Cruise a fazer Cocktails de nomes e cores estranhas, enquanto lançava doces sorrisos, ao mulherio que o rodeava. Hoje, depois de sonhar descaradamente perante essas situações, de derramar lágrimas de desespero, daquelas que as raparigas parvas soltam, numa lamuria inconsequente e desmedida, quase parecendo que o mundo desaba, se os seus sonhos esmorecerem, não posso com o Tom Cruise, nem com o Brian Adams. Ou será porque me fartei de sonhar com eles, e a malta às vezes também se cansa, ou será porque descobri que o sonho é giro que se farta, mas quando inatingível, pode chegar a limitar, em vez de nos impulsionar.
Mudei de estação, claro, que já não o podia ouvir.

domingo, 30 de maio de 2010

Constância

O J., pequeno ser amaldiçoado por uma oligofrenia de nascença, gosta de chaves. Rouba todas por onde passa, guarda-as no bolso, e dorme com elas na cama. Alterna períodos em que descansa desmesuradamente, com outros, em que o espírito acorda para não mais sossegar, passando épocas de vigília constante, noite e dia, sem excepção. Dá uma terrível ideia de extrema capacidade, que me parece existir, não raras vezes, em doentes mentais. Lembro-me amiúde do Cláudio. Um miúdo de ar desengonçado, com uma cabeça gigantesca e uns pés enormes, que o faziam tropeçar a cada passo. Tinha diagnosticado um atraso de desenvolvimento, e vivia com o pai, um traumatizado de guerra, que não suportava sítios fechados, e que vendia na feira da ladra, terreno amplo e aberto. Descobriu-se nos meandros da sua vida, que tinha uma inteligência de nível superior, um raciocínio rapidíssimo e uma velocidade de execução de tarefas alucinante. Na escola não dava uma para a caixa. Passeava-se por entre os colegas a dizer bababababa, num reflexo pleno de patetice, que fazia com que fosse aceite, não obstante o estranho aspecto. A vida, é uma adaptação constante ao que nos interessa. Os dotados sabem-no e os menos dotados sabem-no também.
Dei de presente umas chaves ao J. Pendurou-as ao pescoço, e passeia-se com elas, como se de um tesouro se tratassem. Gosto do J., e sei que ele gosta de mim. Gostava que um dia, ele pudesse crescer por dentro, e deixasse de sentir esta angústia fria e amargurada, da deambulação constante, ou do descanso sem limites. Se há coisa que eu gostava de conseguir ensinar, não só ao J., mas também a ele, é a constância. Palavra nada bonita, mas tão tranquila como essencial.

Livros


Hoje pediram-me uma relíquia emprestada. Emprestei, claro, não poderia dizer não a quem ma pediu, e apenas por isso. Emprestar livros, principalmente os que me prolongam, agonia-me. Em nada mais acontece. Desfaço-me de roupa, partilho malas, acessórios, o que for, com a tranquilidade suficiente, para não pensar mais no assunto. Chego a desfazer-me de algumas peças que amo, só porque me parece que alguém as ama mais do que eu. Mas os meus livros fazem-me doer. Têm notas, sublinhados, pensamentos, pequenos dizeres aqui e acolá. Meus, muito meus. Ele levou, e sei que me trás. Até porque ele mesmo, está sempre de volta.

...



Para quando me pedires. Em vez do anel.

Cheiros

Quis o fraco jantar, não vá a pele esticar, que às duas da matina morresse de fome. Uma t-shirt vestida, a janela aberta para deixar entrar a brisa da noite, e uma caixa de corn flakes no colo, a fim de aconchegar o estômago, que queria mesmo era gelado Óreo, o esquisitinho. Logo após, consigo adormecer, numa noite embalada por um sonho estranho, interrompida por uma mensagem não menos estranha, e acutilada por um cheiro delicioso, do guisado da vizinha, que mais não faz ao Domingo de manhã, que atormentar-me a alma, com tamanho acepipe, que tresanda a chouriço. Não se faz. Não se tira o sossego a uma pobre alma, às oito horas da matina, que não mais descansou, tal o engodo e a dieta da véspera. Tenho dito.

sábado, 29 de maio de 2010

Belezas


Se visse como eu era bonita... Diz-me alguém já na casa dos sessenta, ainda bonita, por sinal. Incrível o orgulho que se ganha da beleza, como se de um mérito se tratasse.

sexta-feira, 28 de maio de 2010

Código genético

Chegou-me cá um velho novo, que tropeço de palavras vai aqui. Pele morena, Engenheiro Agrónomo, 70 anos, com o Alzheimer já a dar um ar de existência. Mulher muito mais nova, deixa-o, num misto de alivio e pena, estranhos sentimentos se desencadeiam no final de vida. Fuma cigarros SG Light, com uma frequência recorde, bebe nescafé ao pequeno almoço, e tem uns dentes amarelo escuro, feios, por demais feios. Não obstante o rude aspecto, tem um trato fino, uma voz educada, percebe-se alguma pose, uma vida ocupada e abastada. A desvinculação é sempre um processo tremendo. O agora ficas aqui, que eu vou-me embora. Já assisti a muitas, mas não me habituo. Não tenho código genético para isto, diz-me a esposa. Tenho pena, mas não consigo passar a minha vida a limpar mijo de velho. Estranho? Não, no fundo não. A única estranheza, acabo por concluir, é ser a Mulher a proferir tais palavras, quando na maioria das vezes, acontece o contrário. Eu, na minha vertente popular, condenei-a internamente, quando as proferiu, mas perdoei-a logo a seguir, claro. Concluo ainda, ao olhar o ar frágil do Sr. J, que os Homens, quando dependem, dependem mais. Dependem muito, na verdadeira acepção da palavra. A Mulher, e num elogio, merecido, admitam, é um ser muito mais forte. Tenho a minha teoria, claro. Lidamos convosco, habituamos-nos à solidão, à vossa personalidade desprendida, e sobrevivemos, ganhamos self. Vós, lidam connosco, que estamos quase todas, quase sempre lá. Ficam a perder em termos de crescimento. São, muitas das vezes, um prolongamento de nós.
A Mulher do Sr. J, acabou de chegar em visita. Ela tem um ar aparentemente calmo. Para ele, esta, é a Hora do dia.

Acasos

Peguei nele, ao acaso, que às vezes, nesta vida os acasos funcionam. Começo a devorá-lo, uma outra vez, numa paixão que reacende a cada letra, a cada frase, e se intensifica ao limite, à medida que avanço. Há obras que me dizem muito. Porque me ensinam, porque me transportam, porque dão sabedoria, que digam o que disserem, mas a experiência também se vive nos livros, que se transformam em representações mentais, e nos conduzem ao local e hora exacta da história. O Velho que lia Romances de Amor, é uma paixão antiga. Como a história do Gato e da Gaivota, e o Mundo do Fim do Mundo. Chego a cortar relações com ele, o escritor, por tempos indeterminados, e sem razão aparente. A culpa não é dele, é minha, que sou inconstante. Até hoje, volto sempre lá. Abençoo a minha existência, por não ser assim em tudo o que me fez feliz.

quinta-feira, 27 de maio de 2010

Momentos

Hoje jantamos as duas. Falamos disto e daquilo e de algumas coisas que nem devíamos ter falado, coisas de amigas, pronto. Combinamos ir ver Xutos, nós, que já os vimos em pleno Vilar de Mouros, quando esse ainda era O Festival, para além das outras mil vezes, por aí. Foi contigo que andei à boleia a única vez na minha vida, e ainda bem que a minha mãe desconhece a existência deste estaminé, onde me escarrapacho toda assim, senão estava tramada com esta da boleia, coisa mais descabida, para uma menina da Família Baptista. Há amizades de um raio, e a nossa é uma delas. Passam tempos, passam gentes, passam Homens, e sei lá mais o quê, mas nós estamos sempre cá. Puxa S, és amigona, pá. A propósito, bora passar uma noite nos confortáveis bancos da estação de Campanhã? O colo do rodas, fica para mim, boa???

Perseguições

Trago de boleia a Dona C., que deixou o carro na oficina a mudar uma qualquer peça que custa 75 euros. A Dona C., é uma Senhora que trabalha de sol a sol e que tem dois filhos, em guarda partilhada com o ex marido. Pelo caminho até ao estaminé, florido de umas flores murchas e sem cor, dada a ausência de sol, explica-me que o mecânico quer que ela vá viver com ele. Mandou até recado, pela Senhora da mercearia. Ela responde que não, que ainda tem a sua dignidade, e o recado foi levado de volta. Pode não ter que comer, mas assim prefere, a partilhar a vida com quem não quer, uma outra vez. Irá pagar os 75 euros, embora ainda não saiba como, mas logo se verá, que isto nesta vida tudo se resolve. Diz-me ainda em confidência, que tem uma paixão platónica, por um Homem lindo de olhos azuis. E que por ele, ia até ao fim do mundo, se é que o fim do mundo é local que exista. Após o caminho, deixo-a entregue à sua tarefa, que inicia logo após bebericar um café e fumar um cigarro.
Entendo-a mais ou menos. Na recusa de partilhar vidas só porque sim, entendo-a na perfeição. Naquela parte de ir atrás de um Homem até ao fim do mundo é que a porca torce o rabo, que isto quando mete Homens, é tramado. Até porque o fim do mundo, é muito longe para se ir atrás de alguém, que não sejamos nós. Digo eu, que sou muito importante para mim, e que me perseguia até à lua, se preciso.
Fico no entanto realmente feliz pela ingenuidade dos quarenta. Quando os fizer, acho que também quero voltar a ser ingénua outra vez, que deve ser bom. Principalmente esta parte, de se julgar que se pode ir atrás de alguém, "só" por paixão, até ao fim do mundo. Se o fim do mundo for local que exista, claro.

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Às vezes minto

Li os resumos, diz-me. Uns pretos e amarelos da Europa América. Rio-me para dentro, claro, eu que também os devorei, aos invés dos Maias, do Amor de Perdição, ou de Eurico o Presbítero.

Os resumos da Europa América, querida? Que é isso? Nunca ouvi falar meu anjo. Ao que prossigo, com um discurso o mais moralista que consegui, apliquei-me, juro.

Sinto-me por ora, dicotomicamente, orgulhosa e mentirosa. Orgulhosa, porque fiz a vontade à mãe, numa tentativa de aplicar a filha considerada rebelde. Mentirosa porque menti, óbvio, e ainda porque a minha costela adolescente está com ela. Principalmente no caso do Presbítero, que os outros, com olhos de ler, valem a pena. E a pobre, que diz querer ser Psicóloga, ainda não descobriu que na Faculdade vai ter de por os olhos no Labirinto da Saudade de Eduardo Lourenço, ao qual ainda não foi atribuído livro preto e amarelo da Europa América. Uma pena.

Soltar

O meu rebento hoje foi para o Oceanário. Deixei-o bem cedo, com uma mochila cheia de gulodices, entre as quais pão com Nutella, e muita boa disposição. Vejo mães, muitas mães, que deixam os seus, e quase que sinto uma sensação estranha. Sou do apego, do aconchego, claro. Mas estes caminhos, de quando o sinto crescer, dão-me tranquilidade, e muito pouca apreensão, coisa que verifico ser diferente, pelo que observo. Claro que sai sempre um tem cuidado, ou um não te afastes do grupo, mas não mais do que isso, no campo das recomendações. Apetece-me muito mais dizer que se divirta, que aprenda, que descubra, e que brinque até se fartar. Nem sequer levo o dia a pensar que algo de menos bom possa acontecer. Oiço muitas mães que vociferavam coisas como são os nossos filhos, temos de ficar preocupadas. Só sossego quando chegar. Serei estranha, por não sentir esta extrema preocupação? Talvez, admito que sim, mas não a sinto de facto. Não me ocorrem coisas como ligar para a professora, para saber se chegaram bem, pois parto do princípio que sim, e que caso contrário, eu saberia. A sensação que predomina é, volto a dizê-lo, de satisfação por o ver crescer, seguir, descobrir. A preocupação está cá, como está todos os dias. Como quando vai para a escola, como quando brinca no parque, ou como quando passeia com os avós. Nem será bem uma preocupação, mas mais um cuidado, um querer saber se está bem.
Conseguir solta-lo, e ele a mim, numa presença importante, mas não dependente, é a minha mais nobre tarefa. Não sei se certa, se errada, mas é a minha, que isto neste mundo cada um tem a sua.

terça-feira, 25 de maio de 2010

Coerências


Gosto de tâmaras enroladas em bacon quase tanto como de ti. Deve ser o agridoce que me fascina, deve ser isso. Em deambulações internas, sempre presentes, já sabem, concluí isso mesmo. O agridoce dá-me conta da cabeça. E o corpo acompanha, claro que quem manda aqui sou eu. A propósito do post anterior, não comprei a ilha. Uma ilha tenho eu, aqui, bem dentro de mim. Para quê outra, desperdício.

Quase me esquecia que também gosto de ananás na pizza. E dos iogurtes spicy da adagio. Afinal até sou coerente, e nem sabia.

Hum, bora lá comprar uma???

http://www.ionline.pt/conteudo/61498-ilhas-sonho--venda-35-mil-euros

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Maquilhagens


Uma das coisas pelas quais para a próxima vou nascer Homem, é a dispensa de maquilhagem. Acabei de me desmaquilhar, de por os cremes da ordem, de tirar uma pestana que nos meandros me entrou no olho, e de amaldiçoar esta treta toda.

Globos e tal

Eu até podia falar dos Globos de Ouro, se não tivesse adormecido, que tédio que sou. Nos entretantos, deu só para reparar que a Bárbara Guimarães está com umas piadas estranhas, um cabelo estranho, em suma, está toda ela muito estranha.

Utilidades

Hoje pelo caminho do estaminé, questiono a minha utilidade. Acontece, às vezes, muitas delas à segunda feira. Não que não me sinta útil, mas porque talvez já me tenha sentido mais, ou então mais retribuída. Vem-me ainda à cabeça, e nesta linha da utilidade, uma família que acompanhei, em tempos de Casa Pia. O Rúben era uma criança de olhar pálido e vidrado, do mais estranho que já vi. Tinha um Pai de nome Ostílio, e uma mãe chamada Belizanda. Não me esqueci dos nomes, não pela estranheza dos ditos, conforme possam pensar, mas porque tenho boa memória para eles, sempre, sem excepção, coisa que não se verifica nada com os números. Chego a esquecer-me da idade que tenho, sendo necessário fazer umas contas simples na minha cabeça para lá chegar. Também sou assim com datas de aniversários, ou com números de telefone, mas isso agora não interessa nada, perante a história do Rúben. O Rúben estava perdido. Frequentava o internato, e aos fins de semana ia para casa da mãe, separada do pai. A dita Senhora residia com o anterior patrão, a quem tinha tomado conta da esposa, que nos entretantos faleceu. Uma história de amor, julgo que sem amor nenhum, um tanto ou quanto mórbida, mas real. Dessa união, já longa, nasceram duas pequenas, que vi uma vez, em visita domiciliaria, nuas, só com uma fralda no rabo, uma delas já com cerca de quatro anos. O companheiro deambulava-se por lá, com um cheiro pestilento, e a vociferar impropérios contra o Rúben. Percebi de imediato, o porque do olhar do jovem vir pior às segundas, dia tramado este, pior quando não se está feliz. A mãe, um ser franzino e fraco, não tinha qualquer poder sobre aquele ser medonho, que mandava lá em casa, e que detestava a cria do anterior casamento. A custo, muito custo, e com as ajudas várias, claro, mudou-se o rumo da história, e a vida do Rúben. Hoje, continuo a entender mãos, necessárias é um facto. Mas numa análise interna, egoísta, sei que sim, sinto amiúde necessidade de ver diferenças, resultados palpáveis. É um mal do Homem, a necessidade de retribuição. Às vezes sinto que nunca me vou libertar dele, mas gostava.

domingo, 23 de maio de 2010

Unhas


Hoje, numa mesa de esplanada a meu lado estava uma loira vistosa, de cigarro na mão. De decote até ao umbigo, boca deveras pintada, cabelo selvagem, e unhas de gel com umas bandeiras Americanas desenhadas. Falava alto, enquanto gesticulava, exibindo orgulhosa, aquelas obras de arte. Não tenho nada contra quem goste de se exibir. Tenho qualquer coisa contra quem fale muito alto, principalmente quando tento ler calmamente o jornal, e ainda contra quem me deita fumo para cima, coisa desagradável. Tenho muita coisa contra unhas de Gel com bandeiras pintadas, ou outras coisas do género. Chego a vê-las também, qual obras primas maravilhosas, nas mãos de Senhoras, no Super mercado ao Domingo de manhã, conjugadas com um fato de treino, um chinelo de enfiar no dedo e um rabo de cavalo. Fantástico.
Querida S, sei que fazê-las faz parte da tua vida. Descansa meu anjo, contra ti não tenho nada, tu sabes.

Oportunidades, ou então sou eu que digo

Cada vez mais constato, a minha pequenez perante as crianças de hoje. Uma primária feita por detrás do sol posto, no meio dos montes e dos carneiros, a quem se tirava lã. Uma avó que costurava à máquina bordados de flores garridas, enquanto eu brincava com o gato debaixo da mesa. Desenhos animados que davam uma vez por dia, às seis em ponto, durante uma meia hora, que se eu não apanha-se só no dia seguinte, pois mais nada havia. Vídeo não tinha, telefone entretanto chegou. Ganhavam-se coisas, é um facto, mas perdiam-se outras consequentemente. Não fora eu aventureira, e estaria agora numa qualquer casa da aldeia, gorda e airosa, de avental aos folhos, ou do PSD, rodeada de filhos, e com um marido a cheirar a cerveja, coisa que abomino, mas se calhar, com jeitinho, até estaria habituada.
Hoje nada é assim, e as oportunidades surgem a cada esquina. Via net, via real, via assim ou via assado. Os miúdos buscam, deambulam, e crescem debaixo dos nossos olhos, à velocidade da luz, e raciocinam. Isso, raciocinam facilmente, coisa fantástica.
Veste as calças J.
Calças é uma palavra esquisita.
Porque amor?
Porque sim, adapta-se a duas situações. Calças de peça de roupa, e calças o sapato.

Sim querido, tens razão.

De nós adaptáveis


O sonho comanda a vida, já dizia António Gedeão, e dizia muito bem. O que talvez não soubesse, ou então até já sabia, é que o sonho é uma capacidade do nosso inconsciente de se projectar, de forma mais ou menos desperta, e que se tolda, adaptando-se, mudando. A minha filha diz que não, mas eu ainda tenho esperança de que ele recupere qualquer coisinha, que diga uma palavra, que eu o entenda. Sim, que eu o entenda. Este é o sonho actual de alguém, que outrora sonhou uma casa na praia, uma vida desafogada, saúde, e a companhia sempre alegre do marido. Hoje, pouco mais quer do que entende-lo. Ainda não descobri ao certo, sendo um desafio, pois claro, entre outros a que me proponho, se os móbiles dos sonhos básicos, são os mesmos dos outros. E se a satisfação que trazem, é também grandiosa, senão maior. Sim, penso que será maior. Independentemente das vicissitudes individuais, nós, humanos, somos de facto seres fantásticos, embora às vezes, em períodos débeis, julguemos que não. Julgamos mal, Senhores, julgamos mal.

sábado, 22 de maio de 2010

Nadas...

Vive-se a mil, diz-me, como se não soubesse viver de outra forma. O hábito instala-se, o corpo já pede corrida, e não se sabe que se faça com a monotonia. Um mal dos tempos modernos, digo para mim, e para quem comigo partilhou. Faço questão de me manter distante a isto. Corro, claro que sim. Corro que me farto, desde que me levanto até que aterro onde quer que seja, cama, chão ou sofá, que logo quebro, mal vacilo. Mas faço questão de momentos de ócio. Nunca deixei de saber o que fazer com eles, tenho somente dificuldades, em arranjá-los, para depois os ocupar. Pode ser um livro, pode ser um banho, pode ser um passeio, ou pode não ser nada. Sei sempre que faça, e o nada, por dentro e por fora, fazem parte de mim. Treina, vais ver que consegues, e que concluirás breve, que nem imaginavas, a falta que te faziam, digo-lhe. É possível, responde-me. É certo, respondo-lhe eu.

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Dos nomes

Quis o destino, ou a sorte, que a minha bisa tivesse um filho anão. Um ser pequeno e rechonchudo, que cedo deixou as abas da mãe, e não obstante o minguado tamanho, se fez à vida, com sucesso, por terras da Nazaré. O Ferreira, como era chamado. Vícios, esses, existem por aí aos magotes, e nele também pairavam, que ainda por cima era pequeno, insisto, atribuindo à sua pequenez, talvez erradamente, algumas fraquezas internas. Bebia e fumava como ninguém, trabalhava no Bingo e comia camarões ao almoço e ao jantar, quando almoçava e quando jantava. Era um bom vivant de um estilo próprio, que morreu cedo, pela mão dos exageros, que cobraram a seu tempo. Hoje, encontro duas Nazarenas, daquelas de gema. Com sete saias, cordões ao pescoço, brincos de oiro, e bigode farto, que choram e gritam com dor na alma, perante alguém que lhes é querido. Palavras fugidas, surge o Ferreira, amigo das duas, constatou-se, companheiro de paródias, cartadas e bailaricos, ao som do rancho, sob a maresia da praia. O mundo é pequeno. Choraram as velhas do carrapito, julgo que pela saudade, atiçada pela fraqueza que tinham de fronte, e quase que derramo uma lágrima, eu, que nem sou de coisas assim. Ofereceram-me o mundo, que sou sobrinha do Ferreira, grande Senhor por terras de pesca, reitero, apesar de pequeno, e já morto. Em tempos, de adolescência rebelde, cheguei a ambicionar nomes pomposos. Naquelas alturas em que vaidade fala alto, e por quase nada, vendemos a alma em traição. Vasconcelos, Cunha e Sá, nomes sonantes, é que me faziam falta, achava eu, pobre cachopa. Hoje, já no pós trinta, sinto um orgulho imenso no nome que carrego. Nome potente este, que crava mossa, mesmo que em gente pequena, e espalha boa disposição por onde passa. Sinto-me grande, carago.
A propósito, o meu tio anão, era Benfiquista ferrenho. Vendeu-se por dois tostões, contava o meu bisavô, que achou por bem retirar-lo dos lagartos, boa hora o fez. E ele deixou-se ir, no bom caminho, e dois tostões mais enriquecido. Era um Ferreira, claro.

O Amor nos tempo da crise

O amor é um sentimento estranho, do qual já por cá falei. Não falo do amor que sinto ao meu filho, demasiado perfeito para dissertar sobre. Falo do amor a um Homem, ou a uma Mulher, que por casualidade ou não, nos cruzou o caminho. Trocam-se olhares, criam-se empatias, constroem-se sonhos que são outra coisa estranha que nos persegue, dado que aparecem e desaparecem conforme o vento. Posso perfeitamente sonhar uma coisa hoje, e outra amanha, que nada me impede, e o meu inconsciente acompanha. É fantástico o nosso inconsciente, perco-me no meu tantas, mas tantas vezes, que concluo, em momentos de introespecção, que fui por demais ambiciosa, quando me propus entender os inconscientes dos outros. O amor também vagueia um pouco e quem se ama hoje, pode deixar de se amar posteriormente, por diversos factores, externos e internos. Depois existem os amores eternos, se é que isto existe, a quem temos por hábito chamar de cara metade, termo que adoro, talvez por o questionar. Julgo que nem sempre se encontra, se é que se encontra, e julgo ainda que por golpes de azar, se pode encontrar na forma errada. Às vezes, penso que até para amar é preciso sorte, no como, no onde e no quando, que isto de encontrar amores fora do tempo ou de lugar, tem que se lhe diga. Quando se fala de gente, o tempo e o espaço, assumem-se como realidades ambíguas e internas, que só ao próprio dizem respeito, eu pelo menos, assim o penso. Chego a deambular entre se é bom ou mau amar na hora errada, no sitio errado, e chego a julgar, em tempos de crise sentimental, que o melhor, seria até nem amar. Mas repenso, claro. Até porque existem alturas, daquelas, quando os olhares se cruzam, e as razões perdem sentido, em que no nosso intimo concluímos, ingenuamente, ou não, temporariamente, ou nem por isso, que o sentimento de amor quando existe, é para se usar e abusar, assim como quem come e como quem bebe, como se não houvesse amanha, que o amanha existe, mas não se sabe como, nem quando, nem onde. Concluo ainda, já no limiar racional dos meus pensamentos, que mesmo em tempos de crise, é melhor amar fora de horas, do que não se amar nunca.

Porque eu também tinha de falar nisto...


É já dia 3 que estreia o supra sumo do reino fútil feminino. Eu, que nem me dou em demasia a essas lides, estou em ânsias, pela nova história das 4 parolas, lindas de morrer, como nos filmes. Anseio pela estreia, na qual vou vestida com uma saia de folhos e uma t-shirt Dolce & Gabbana, qual Carrie. Se entretanto tropeçar e esbarrar num Árabe, também não faz mal, que tenho uma espécie de fetiche, vindo não sei de onde.

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Da gaiola

Descobri hoje que um vizinho meu tem um pássaro numa gaiola. Deve ser recente, que nunca ouvi o bicho cantar, ou então é ele que não canta, dado o cativeiro, pode bem ser. Não gosto de pássaros em gaiolas, embora goste de pássaros. Gosto de os ver voar, onde bem lhes apetece, gosto de os ficar a mirar, enquanto rumam para longe, e gosto de os ver regressar, que os regressos do que se gosta, é do melhor que pode haver. Em pequena tive um corvo chamado Jacob, que uma vez, enquanto eu me baloiçava no meu baloiço de corda e pau, resolveu fazer um bonito serviço bem em cima da minha cabeça. Era lindo o meu corvo, e andava à solta por onde queria, coisa que irava deveras os cães das redondezas, demasiado burros para a sua perspicácia. Coisa de corvo. Tive ainda um professor na Escola Secundária, que se chamava Josué, e que lia livros eróticos enquanto nós fazíamos testes, e riamos em surdina. Vivia sozinho, tinha ar de alucinado, e dizia que vivia com pássaros à solta dentro de casa. Sempre tive a ideia de que as pessoas loucas são mais livres do que as outras. Fazem o que lhes apetece, incluindo viver com pássaros em casa, permitindo-lhes voar, sem gaiola. Todos loucos, mas todos livres, num apogeu de insanidade, utópico, mas fascinante. Sobre o assunto, aconselho a quem nunca leu, o Elogio da Loucura, de Erasmo, que numa estrondosa viagem à Mitologia Grega, diz mais ou menos isto, numa história contada pela Loucura, na primeira pessoa. A propósito, o meu vizinho não simpatiza comigo, e espreita-me quando chego tarde, não vá vir acompanhada de algum mancebo, para um prédio de família. Até lhe achava piada, que eu nestas coisas sou do pagode. Até descobrir que ele tem um pássaro numa gaiola.

Tardes assim


À tardinha, calcurriei a pé uma cidade de calçada, tenho queda para elas, que se faça. Pouca coisa me liberta tanto, como calcorrear ruas calcetadas ladeadas de lojas, para onde deito os olhos, a isto ou àquilo. Não preciso fazer compras, e as montras não têm de ser roupa. Uma rua que me delicia, fica dentro da linda Vila de Óbidos, pertinho de onde estive ontem. O castelo fica à volta, e bem no meio, entre restaurantes de aconchego, com toalhas de pano enroladas, e bares de ginginha doce, encontramos umas ruas estreitas, enfeitadas com sardinheiras coloridas, e cheinhas de lojas de artesanato. Com malas de retalhos e bonecas de trapos, daquelas que não compro, mas para as quais gosto de olhar, coisa gira esta, de regalarmos os olhos com coisas que nem queremos. A vila dispõe ainda de igrejas recatadas, com os seus átrios tradicionais e as suas árvores centenárias, onde o Pároco se passeia com uma calma como não há, por entre as escadas sombrias, e as fontes de água, que estão por todo o lado. Já lá passei algumas noites e dias memoráveis, já lá vi casar, já lá namorei.
Um dia, ainda gostava de voltar a namorar lá. A minha alma de menina que empurro para dentro, mas que teima em saltitar para fora, mal lhe dou uma aberta, precisa de romantismo, daquele, que nem sei bem, se ainda existe por aí.
Relendo o texto, descubro nuances de doçura. Não tem nada a ver comigo, foi só hoje, e passa num instante.

quarta-feira, 19 de maio de 2010

Conclusões

Cheguei a julgar em tempos, numa ingenuidade suprema, ser simples. Simples, no trato, fácil de contentar. Para nos entretantos descobrir que sou complicada, como não há por aí. E concluo isso não propriamente pelo que exijo, mas pelo que me dão, sempre aquém, ténue, frágil, mas dado com uma pose de magnitude, de como se tudo estivesse ali, quando eu acho que ali, não está nada.

Pareceres

A liberdade é uma coisa bonita, claro que sim. Parece-me, no entanto, e correndo o risco de afrontar os mais extremistas, que a palavra bom senso, deve caminhar a par e passo com ela. O ramo profissional é um, e o pessoal é outro, óbvio. Mas praticados, no entanto, por uma mesma pessoa. Talvez o ser mãe influencie, mas parece-me que nem é só por aí. Não imagino, porque não imagino e pronto, a professora do meu filho despida na Playboy. Ela que se dispa onde quiser e muito bem lhe apetecer, desde que não seja perante os olhos dos meninos a quem é suposto ensinar qualquer coisa. O que leio por aí, são opiniões totalmente contrárias à minha, fundamentadas nos princípios de cada um, claro que sim, que respeito, obviamente. Não sou conservadora, nem nada que se pareça com isso, simplesmente acho que existem coisas que não ligam bem, e pronto. Por uma questão de postura. Eu sei, eu sei que o politicamente correcto, seria eu dizer, em prol da liberdade, que cada um faz o que quer. Mas eu também acho que faz. Arrisca-se é às consequências, que isto de se fazer o que se quer, é giro que se farta, mas tem os seus custos, há pois tem.

terça-feira, 18 de maio de 2010

PM

Acabo de ver a entrevista ao nosso Primeiro Ministro, e acabo de confirmar algumas das minhas teorias. Depois de um Miguel Sousa Tavares, um tanto ou quanto aniquilado, eis que juntam a Guru Judite de Sousa e o José Alberto Carvalho. Como sempre, o nosso Primeiro Ministro dá baile com as palavras. O dom da palavra é uma coisa fantástica, pena, que não implique a existência directa de outros tipos de dons, por demais necessários, onde até podia permanecer calado. Já conheci mais gente assim, mas não muita, com tanta perfeição de retórica. Falam, falam, falam, falam... E até falam bem, venha quem diga o contrário.

Mil

Ainda me lembro do meu bisavô Chico dizer que haveria de se descobrir a vida eterna. Eu, pequena, e sentada na sua frente, acomodada numa almofada de trapos, situada no chão de soalho esburacado e de fronte à braseira, olhava-o com os meus olhos cor de azeitona, muito abertos e incrédulos naquelas palavras, sempre sábias, que liam o Almanaque Borda d'Água, com uma fidelidade perfeita. A minha bisavó, a quem eu chamava Chica, mas que se chamava Rosalina, olhava-me de soslaio, numa pausa das suas costuras nos tapetes de corda que fazia, percebia o meu olhar de espanto e dizia, não lhe ligues minha querida, isso é tolice. Nos entretantos, levantava-se, dirigia-se ao oratório que tinha nos quartos do fundo, em cima de uma arca de madeira carunchosa, destrancava-o, sacava a cortina para o lado, e rezava pela saúde de todos, e pela minha também. Sinto falta das rezas dela, que espreitava, por entre a nesga da porta, em silêncio absoluto. Hoje, um Cientista diz por páginas de jornais, que se encontra em vias de descobrir a cura para o envelhecimento, e que dentro de pouco, viveremos até aos 1000. Não tenho nada a opor, até porque por ora, as dissertações profundas, como já devem ter percebido, encontram-se em mim adormecidas. Apetece-me apenas e só dizer, que não me parece nada que aguente isto até aos 1000. Mas sou aberta a tudo, claro.

Estratégias

T., e uns bilhetes de última hora para os Metallica, não?
Não, mas para o Salão Erótico sou capaz de arranjar, boa?
Boa. Não é bem a mesma coisa, mas distracção precisa-se.
( Os factores C, e as posições estratégicas ( ops, posição aqui no contexto nem soa lá muito bem) continuam a ser uma coisa fantástica. Não tão fantástica como eu queria, mas ainda assim, fantástica).

Factos, feitos e coisas que não são nada disso.


Hoje o dia é Grande. Entre Moções de censura, casamentos entre Homossexuais, e o Passeio do meu filho a Évora para receber um prémio, tudo merece ser festejado. No entanto, há por aqui umas coisas que de ontem para hoje mereciam ser banidas, tal o estrago que fizeram. Uma delas é o gelado de Oreo, que eu e o meu filho quase exterminados ontem ao jantar. A outra, és tu.

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Metas

Às vezes, surge-me uma vontade crescente de crescer. De chegar além, de correr, de perseguir. Pesam-se prós e contras, estudam-se caminhos, procuram-se soluções. Fica a sensação de mãos atadas, que se desatarão, à minha mercê, caso eu perca o medo. O medo é um sentimento ignóbil que nos limita com uma pinta de mestre. Há que bani-lo, há que extermina-lo. Ou há que ficar com ele e perder tudo o resto. Opções, claro. A coragem, por sua vez, é a força que nos impele à acção. Intercalo entre um e outro, e não raras vezes, quase que sou corajosa. Mas preciso de mais. Sinto-me assim ao nível de uma Padeira de Aljubarrota, que só enfrenta quem lhe chega perto, e nisso é fugirem, que a pá trabalha que se farta. Mas precisava de mais. Assim uma alma de Robin Hood, ou algo do género. Que procura para agir. Tenho para mim que ainda lá chego.

Sol

Hoje o sol aqueceu um bocadinho. Eu repondo-lhe, claro, ponho umas sandálias, e passeio lado a lado com ele.

domingo, 16 de maio de 2010

Capacidades

Não raras vezes, inquiro-me sobre as minhas estrondosas capacidades. Não sou por demais mestra em certas coisas de extrema importância neste mundo, como são, a título de exemplo, o aproveitar as oportunidades em minha prol, coisa que a minha mãe me aponta à muito e com toda a razão, que não presto mesmo nada para aproveitamentos. Mas tenho outras capacidades levadas da breca, digo eu, que acho, porque no fundo, no fundo, pouco me trazem de frutos, e nos dias de hoje, os frutos colhidos daqui e dacolá são uma fonte fidedigna de sucesso. De qualquer forma, e como eu ia a dizer, sou extremamente capaz de emitir paz, calma, e ondas normais, quando aqui por dentro anda tudo em alvoroço. E faço questão de assim ser, que coisa que mais abomino sentir de alguém é algum tipo de dó, e por conseguinte, não me apraz nada que o sintam de mim. Um orgulho um bocado a dar para o besta, admito, mas que se faça. A dar para o besta, e nada sensato, neste País onde a fraqueza, seja ela de que carácter for, verdadeira ou fictícia, é uma mais valia do tamanho do mundo. Já me apercebi há um tempo, em conjunto com outras pessoas que passaram pela minha vida, que o arcaboiço é um estado árduo, e nada condigno. Até porque, tem ainda inerente, a terrível consequência da responsabilidade, se é que me faço entender. É uma espécie de estado, um tanto ou quanto importante, e que se deve manter. Semelhante, por exemplo, ao falhanço de um penalti. Que se perdoa facilmente a um amador, mas que não se perdoa a um Cristiano Ronaldo. Sim, é mais ou menos isso.

Dias

O dia está de um sol estranho que não me aquece. A vida tem um ritmo esquisito, ora por demais rápido, comigo lenta, ou vice versa, dependendo do contexto. Sinto-me um António Variações, versão feminina, dos tempos modernos. Há dias assim.

sábado, 15 de maio de 2010

walking with dinosaurs


O meu dia hoje teve regresso pré histórico, num espectáculo produzido pela BBC, onde o meu pequeno paleontólogo me enfiou, logo pela matina. À parte de não ser apreciadora de bicharada estranha, vale a pena. A ver, no Pavilhão Atlântico de Lisboa, até amanha.
Podia bem, o meu rebento, se fosse um lindo homenzinho, ter-me permitido uma visita à Zara, menos atribulada, mas não. Entre puxões, e estamos atrasados para os anos da Maria, tudo valeu para me extorquir dali. Começa cedo, o bandido. Para a próxima não vejo Lagartos, pronto.

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Estados de espírito, alma, ou o que for, que precisam remédio...

Jogo à bola com o meu filho, tarefa que me cabe, por vicissitudes da vida, e encontro um antigo colega de escola, que faz o mesmo com o dele. Começo por olha-lo de lado, ver-lhe os cabelos brancos, que estranhamente não lhe dão charme, os óculos na ponta do nariz, a barriga proeminente, e o ar cansado. Os olhares acabam por se trocar e a conversa surge, inevitavelmente. Entre o que é feito, e o trivial de se falar nestas situações, não consigo deixar de o analisar, discretamente, e de o achar velho. Nem tanto pelo aspecto, claro, mas por um conjunto de coisas, que me transmitiu. Assusta-me, não por mim, mas por ele, que lá chegou cedo de mais. Não é a primeira, nem será decerto a última vez que tenho este tipo de encontros desconfortáveis. Encontros com gente, na casa dos trinta por fora, mas velha por dentro, com quem estudei, dancei, cometi disparates e bebi cerveja na parte de trás da escola, escondida dos olhares indiscretos, no tempo em que todos tínhamos a mesma idade. Gente que seguiu percursos diferentes, claro, que a vida é isto mesmo, e ainda bem, que ainda não nos tiraram o livre arbítrio. Mas fico com uma sensação amarga de velhice precoce, dispensável, comodista, resignada. Não gosto do sentimento que me deixa, independentemente de em nada me identificar com o estado em questão. Talvez pelo simples facto do estado existir, sim, deve ser isso.
Nos meandros da conversa, descubro que é casado com uma Mulher de nome Lena, que nos entrentantos chega, e se assemelha a ele, pareceu-me. Se calhar, até são felizes, penso para mim.

Disturbios assim


Encontro num jornal um artigo sobre bulimia, acompanhado de uma reportagem sobre um novo documentário, um caso verídico. Ou não soubera eu do que falo, ou as doenças da mente, contrariamente ao que muitos pensam são devastadoras. Algumas, muitas delas não se deixam ver, e surgem, apenas e só, dentro de quem as sente, do mais interno que há. O estado de espírito altera-se, a vida ganha contornos sombrios aqui e acolá. Nas menos discretas, vêm-se actos da chamada loucura, esquizofrenias, paranóias e essas coisas assim. Nas mais envergonhadas, o individuo vive um tormento profundo, uma luta interna entre frentes diversas que o descontrolam ao limite, e fazem com que obsessões, depressões ou outras, apareçam. Sem feridas, sem sinais visíveis de fora, e por isso, muitas vezes incompreendidas, ou até despercebidas. Temos por aí diversas equipas, mas claramente insuficientes. Nas escolas a procura é muita, o psicólogo divide-se, mas não chega para cobrir as necessidades crescentes. E é maioritariamente na adolescência, como sabeis, que surgem as anorexias, as bulimias e todas as perturbações alimentares que poderão a longo prazo, assumir consequências trágicas, quando não detectadas atempadamente. Não me canso de ler artigos sobre o assunto. Não me canso de acompanhar lutas, algumas bem de perto, de jovens que quase caem, para alguém detectar os sinais de alarme. Não condeno atitudes parentais, numa vida onde se corre mais do que se para, e onde o tempo que sobra, chega para o essencial, ou às vezes, nem para isso. Mas apelo à procura de informação, quando dá, quando há tempo, que esta, nunca é em demasia. Apelo ao esclarecimento sempre que surgem pequenas dúvidas. Apelo à acção, perante a suspeita. Do lado de quem precisa, temos, entre outras, a Grande Equipa constituída no Hospital de Santa Maria, liderada por Dulce Bouça, onde se distribuem brochuras com sinais de alerta, e tudo quanto possa valer em situação de necessidade de informação ou de intervenção.
Fechar os olhos é que não. E abri-los tarde, aqui, como em tanto lado, também me parece que não.

quinta-feira, 13 de maio de 2010

Placebo

O efeito placebo, é fantástico. Por cá, as hermesetas tiram quase tudo quanto de mal se instale. Dores de cabeça, dores de ossos, dores de garganta. Crises de fígado, de visícula, e neuroses profundas. Anseio um dia encontrar algo que assim funcione comigo. Ao que chamarei, cura para todos os males, o equivalente, mais ou menos, ao beijo da minha mãe na infância.

Esperas


Acordo à hora do costume, quis Deus e Eu, juntamente com a minha malvada teimosia que não fosse funcionária pública, e não tivesse pois direito a ponte. O duche, o visto o quê, perante este cenário estranho que em nada ajuda, o acorda o rebento para o ir pôr a casa da avó, que felizmente, é funcionária pública, valha-nos isso, eis que o tempo me foge. Pelo caminho, pouca gente se vê, o que me leva a crer que temos muitos funcionários públicos, que estarão por ora a gozar a tolerância de ponte em paz e sossego, e fazem muito bem, que no lugar deles faria o mesmo. Paro na Dona Rosa do quiosque, compro o que tenho a comprar, e recebo o sorriso do costume. Pelo caminho para o estaminé, encontro duas mulheres que apanham papoilas para um regaço, enquanto quem suponho ser marido de uma, aguarda na carroça, presa a uma burra de talas nos olhos. Fazem-me sempre pensar estes cenários de proximidade entre maridos e mulheres de outrora. A espera, é uma partilha que admiro. Um estou aqui, à espera de ti. Cada vez mais sinto, que hoje ninguém se espera. Que vivemos numa época em que os ritmos estão dispares, e consequentemente, as distâncias se acentuam, porque a sintonia perfeita não passou a existir, na ausência da espera. - Vens atrás? Então fica, que sigo eu. Na maioria dos meus dias, esta independência, ainda que fictícia, quase me domina, e quase que a julgo um bem. Para depois, quando vislumbro alguém que espera, sentir, bem nas minha entranhas, que saber esperar é a tal das virtudes, que quase todos esquecemos, e da qual quase todos sentiremos falta um dia.

quarta-feira, 12 de maio de 2010

Pensamentos

Às vezes, em dias de ócio, que também os tenho, passo os olhos em alguns blogues . Admiro mesmo a capacidade de algumas pessoas para expor por palavras o que lhe vai na alma, de forma nua e crua. As coisas limpas, libertas de mascara, sempre me atraíram, e não há muito, talvez por isso as admire tanto.
Há por aí muito boa gente, que devia escrever livros.

Dos bróculos, e das dificuldades da vida


Trabalho um tanto ou quanto em prol da linha, assumo. Mas sou terrivelmente pecadora perante a tentação, logo não costumo ter por casa doces proibidos, que desaparecem num abrir e fechar de olhos, completamente à revelia da minha fraca pessoa. Fujo com particular força de nutella, farófias, mousse de chocolate e doces frescos de verão, como o que fiz ontem à noite.
Ralam-se biscoitos de la reine ( o original leva suspiros, muito mais doces, claro, logo troquei), trabalha-se um pacote de nata fresca com uma pitada ( pequena) de açúcar, lavam-se e cortam-se morangos frequinhos. Dispõe-se em camadas, e termina-se com doce de morango, e alguns morangos inteiros, porque os olhos também comem. Nada mais simples, nada mais delicioso e tentador.
Só ainda não percebi, porque é que nesta vida, o que nos sabe melhor, tem sempre um senão. Eu tento, juro que tento, mas não consigo babar assim por brócolos.

terça-feira, 11 de maio de 2010

Tempo


Nesta altura do ano, Maio, diga-se, era costume fazer-se piqueniques lá na terra. São as histórias de quem cresceu na aldeia, que tenho alma de saloia, embora já não se note muito. A escola era de manhã e de tarde, e saia-se às três, tinha-se um dia pela frente. Alguma criançada das redondezas, que não era muita, não senhor, juntava-se à volta da minha vizinha Nela, uma divorciada que adorava crianças e que não podia ter filhos. Era ela que pegava em nós, enchia uma cesta de gulodices, incluindo tapioca, e rumava aos campos para lanchar connosco. Nunca mais comi tapioca, não sei como se faz, nem onde existe, mas sinto saudades. Os campos já tinham flores, e as sombras das árvores, das quais agora fugimos em busca de réstias de sol, sabiam-nos que nem nozes. Também me lembro de passar largas temporadas na praia da Nazaré, já nos confins do verão, não raras vezes no mês de Setembro, fora da época balnear, e ainda com calor. Apanhava as festas do sítio, os tremoços e as touradas, coisa com a qual simpatizo pela tradição que carrega, embora tenha de encosto aquela história do sofrimento dos toiros, bem fundamentada por acaso. Uma incongruência da minha existência, deve ser isso. Tenho mais dessas. Agora, nada como antigamente, o tempo troca-nos as voltas, e manda por cá, como quer e bem lhe apetece. Já pareço a minha avó a falar, que de há uns tempos a esta parte, uso com frequência estas comparações com o antigamente. Para além disso, falo amiúde do tempo, sinónimo por norma, de que pouco mais terei por dizer. Vida pacata esta, se ao menos um Santo me valesse, aproveitando a visita da ordem. São Pedro ou assim, deixa-me cá escolher, não me acuda Santo António.

segunda-feira, 10 de maio de 2010

Chuva

O Inverno cerca-me, o teimoso, que isto a minha vida tem destas coisas. O que desejo foge de mim, e o que me farta, persegue-me. Ainda me lembro, das festas de São João na terra da minha avó. Das noites de baile, onde as Mulheres gordas e bizarras, largavam os maridos da mão e dançavam umas com as outras, com umas saias esvoaçantes e floridas. Estava sempre calor, e o jantar de sábado era frango assado no meio das barraquinhas mal cheirosas, cobertas de uma napa poeirenta, numa osmose imperfeita de cheiros fortes a óleo de fritura e pele de frango queimada, junto com as chamas da fogueira. Já aí os cheiros me ensombravam, hoje ainda mais. Fujo de determinados cheiros, porque se entranham na minha pessoa, para não mais me libertarem, logo eu que amo cozinha. O meu avô, comprava-me sempre umas bolas de papel prata cheias de serradura, com um elástico que as fazia bater na minha mão, e projectar de novo. Lembro-me de um dia, em que numa chantagem perfeita, com ajuda do meu melhor sorriso, lhe saquei uma flauta, para além da bola. Foi um dia grande esse. Mas só até chegar à escola, na segunda seguinte, e mostrar a flauta à lambisgóia da minha colega de carteira, que logo me disse de ar peremptório, que aquela não era das boas. Das boas, não era ela, mas nem sabia disso a pobre, acho que ainda hoje não sabe. Na altura, eu já era nariz empinado, mas muito menos do que hoje, o que fez com que a minha ilusão caísse por terra, e eu ficasse triste. Lembro-me que esse foi o ano em que fez frio e choveu no São João. Não gosto de frios e chuvas tardias. Ainda falta para o São João, claro. Nem sei se passo na Vila Moreira dos meus tempos de outrora, que já nada me lá leva, coisas da vida. Às vezes, vou pela memória, que é muito mais linda nos dias de sol, da fonte, da festa e dos seus cheiros pestilentos e do olho da Maria Paula.

domingo, 9 de maio de 2010

Vitórias

Festejaria com mais ânimo outras vitórias. Ainda que moderadamente, festejo esta também, que qualquer pretexto é bom para se festejar.

Diálogos

Hoje, pela manhã...
O Avô passa cá por casa, a fim de deixar uma colecção do Era uma vez o corpo humano, oferecida pela minha querida T. (obrigado T.).
Rebento entra em delírio, ou não fora ele fanático por estas coisas. O Avô, folheia alguns, e apanha o do nascimento. Fica feliz, sorri, e vocifera: Olha, o do nascimento. Vamos ver se encontramos a cegonha.
Rebento olha-o de soslaio, e responde: Oh Avô, que disparate. Não me digas que ainda não sabes que a cegonha não faz parte do processo.

Gente esclarecida, temos por cá.

Ainda do Papa e da sua vinda, e de como nada temos para nos debruçar


Penso na visita do Papa, em vários prismas. Depois do meu habitual passeio pelos blogs do costume, e de ler o que por aí se diz, incluindo uma magnífica casa de banho Papal, da autoria de J. M.Teixeira, no Aventar, volto a pensar no assunto. Até tenho coisas mais interessantes sobre as quais me debruçar, tenho sim senhor, que a minha vidinha, amorosa e não só, dá-me água para barba e matéria para pensamento, de dia e de noite, coisa fantástica esta. Mas porque a situação já quase roça o caricato, de tão badalada. Esta coisa que já me constou, de vendas de artefactos alusivos a Sua Santidade, parece-me patética. Ou então, vendo de uma outra perspectiva, poder-se-á tratar também de uma tentativa desesperada dos Portugueses se safarem da crise, e desatarem na venda de tudo e mais alguma coisa. Poderá ser um acto nobre, sim senhora, que a minha maldosa pessoa nem atinge, pobre de mim. A parte dos luxos de Sua Santidade, que profeta a pobreza e a humildade, também me parece bem, para além, de já habitual. Calçar sapataria de luxo, é perdoável, eu própria gosto dela, logo, não aponto dedos ao Excelentíssimo. Não prego sobre altares de luxo, nem falo em microfones especiais, porque não prego em lado nenhum, e ninguém me ouviria se pregasse, que só prego despropósitos e coisas que não interessam nem ao menino Jesus. Se pregasse, pregaria em grande, claro. Qual Papa em terreno Português, que existem Países que não fazem tamanhos sacrifícios por sua Santidade. Concluo nos entretantos, por aqui nos meus pensamentos, que se calhar o cerne do problema, está no facto do people cá do burgo, Portugueses, diga-se, necessitarem de ser perdoado de algo, e vá de engraxar o Papa. Nada mais luso, meus caros, nada mais luso. Isso, e o pouco com que se entreterem, coisa também habitual, que dá origem à transformação da vinda de um líder religioso ao País, no acontecimento do ano. A quem o preza, realmente, pouco tempo lhe restará para a oração, tal a panóplia, o que é pena. À parte da sátira que atrás ponho nas palavras, nada tenho contra religião, fiéis, ou mesmo contra o Papa. É a sociedade que contrói, sempre. A César o que é de César. Por ora, numa de precaução, levem lá o Senhor no Papa Móvel, trazido pela nossa Força Aérea, não vá algum alucinado tratar-lhe da saúde em terreno Português. Não precisamos disso, meus caros, não precisamos.

sábado, 8 de maio de 2010

Dos excessos e da juventude

"Não me embebedei, não me droguei... não fui Jim Morrison. Fui sempre velho, se calhar."

Jorge Silva Melo, no I de hoje, a ler na íntegra, que vale a pena.

Fimes assim

Na insónia da noite apanho o filme Infidelidade. Uma história de um casal de vida estável, pais de um filho, onde a mulher embarca numa aventura com um homem mais novo, inconsequente, e capaz de lhe dar sensações hilariantes. A vida tem destas coisa, e o hilariante às vezes chama por nós. Para depois, na maioria das vezes, o refúgio do sossego falar mais alto. Foi só um filme, claro.

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Capacidades

As manhãs não deveriam existir, ou então deveriam, mas de forma mais calma. Invariavelmente, na hora da saída para a escola, o meu rebento tem mil coisas para fazer, das quais se destacam, escolher uma coisa para levar, procurar o boné, que não sabe onde ficou, encontrar aquele brinquedo que faz mesmo falta naquela hora, calçar os ténis, que já mandei calçar 10 vezes, mas ainda não houve tempo, assoar o nariz, porque espirrou, entre outras. Às vezes, perco uns segundos do meu pensamento, a encarnar a vizinha da frente que tem isto tudo multiplicado por três, e fico perplexa com a sua capacidade. Ou é isso, ou sou eu que sou fraca, hipótese a considerar, obviamente.

quinta-feira, 6 de maio de 2010

Facilidades

O meu avô sempre teve uma vida fácil. O trabalho era livre, o aspecto de galã, mais valia, claro, e o dinheiro não sobrava, mas chegava. As mulheres cercavam, e a minha avó, Dona Maria Carmina, linda como poucas, venerava-o. Em pequena ficava aos cuidados dela, e ele, o meu avô, saia de casa todos os dias de manhã, envergando fato, gravata e boina a condizer. Tenho para mim, que foi dele que herdei a vaidade, que já aí o admirava com preceito. Ouvia fado corrido na sua carrinha Bedford, e num gira discos antigo, que tinha no quarto, e palmilhava o País em busca de resina e de outros bens subservientes que lhe interessassem ao ego e ao espírito. Não o critico, claro que não, que era um bom vivant, e fez bem, coisa que não lhe herdei, com pena minha. A minha avó, pobre serva, foi feliz na mesma só pela sua presença, por lhe dobrar a roupa, lhe passar as camisas, lhe ajeitar o nó da gravata, e lhe cortar as unhas dos pés. Ele, sabedor que era da importância dela na sua vida, sempre a mimou qualquer coisa. Não em carinhos ou estimas, mas em bens supérfluos, como caixas de pó de arroz, perfumes, vestidos de flores e cremes da Stendhal, coisas que a deliciavam, e lhe davam algum alento para aturar o que Deus sabe, e que ela, fingindo que não, sempre soube também. Hoje o meu avô está doente, chato e rabugento. Os oitenta e muitos e uma vida de facilidades, não lhe dão estrutura para enfrentar as dificuldades da vida, que teimaram mas surgiram. Nas minhas análises, que faço amiúde, facilmente concluo que a fragilidade mor, nem está na idade, mas na vida fácil que teve. O queres toma, o sim Manel. Eu, aos oitenta e muitos vou ser muito mais resistente. Eu e a minha querida T, acabada de ressuscitar e muito, muito bem vinda por cá. A propósito, a mais nova também já tarda. Anda fugida a malvada.

Sardas

Cheguei a embirrar com elas solenemente. Cheguei a amaldiçoa-las, porque me inibiam o rosto, me mascaravam a perfeição da pele, me incluíam na classe das sarapintadas, muitas delas de cabelo cenoura e ar deslavado, que felizmente nunca tive. Tenho até uma na ponta do nariz, que se assemelha a uma mancha de café, tal a dimensão. Hoje amo-as de paixão, achando mesmo que são as principais responsáveis pela graça que ainda me resta, porque me dão um ar de malandrice tardia. A minha irmã também tem, e o meu pequeno, escuro até mais não, também. Somos uma geração estranha de morenos sardentos. Temos outras coisas estranhas, como sinais azuis, semelhantes a pintas de caneta, azul celeste. Dizem por aí, que se Deus te assinalou algum defeito te achou. Está tudo dito, portanto.
Espreitem o http://sardasdelas.blogspot.com/. Não estou por lá, mas podia.

Pés


Ontem a minha amiga S., arranjou-me os pés. Tem umas mãos fantásticas a minha amiga S, tem uma sorte da treta, mas tem gente que a ama e sabe disso, o que já não é nada mau. Em casa não janto. Bebo um copo de leite com chocolate, enrolo-me numa manta aos quadrados e vejo televisão. Gosto de ver a clínica privada, onde todos se enrolam uns com uns outros e onde são todos muito felizes. Ou então se calhar, parecem. Sim, deve ser isso, se aquilo fosse mesmo a sério se calhar só pareciam. Enrolo-me com mais força na manta de pelo, e esfrego com os meus pés um no outro. Estão macios os meus pés, e continuo a esfrega-los um no outro. O pequeno já dorme e entretanto chama por mim, porque tinha sonhos maus. Deixo a manta na sala, apago as luzes e deito-me ao seu lado até que adormeça de novo. Depois do embalo, sempre doce como só ele, vou para a minha cama. Está gelada, com os lençóis de cetim cor de rosa às flores, quase tão macios como os meus pés. Gosto dos meus pés assim. Tivesse eu paciência, e não me desse a exaustão de estar com eles de molho e arranjava-os mais vezes. Assim, raramente lá vou. Talvez por isso ame tanto a maciez com que ficam. A rotina e a frequência matam muita coisa. A escassez acentua, a minha avó já dizia isto.

quarta-feira, 5 de maio de 2010

Porquês

Às vezes as nossas lutas perdem o tal do sentido. Porque luta pressupõe esforço, esforço, implica desgaste, e desgaste leva ao cansaço. Resilientes que somos, adaptamos-nos, que mais fazer? Habituamos a nossa vida a viver longe, a passar sem, a girar incólumes. Eis que perguntam porque fomos. Eis que respondo porque sim e chega, que no cimo do cúmulo as explicações nem deveriam ser pedidas de tão claras que são.

Manhãs...


Pela manhã, o dia começa árduo. Há que compor o penteado que o rebento e a avó, resolveram fazer no alto da sua testa. Cortar a franja, ao limite, deixando o resto por desbravar. Tudo, porque sua excelência não lhe apetecia ir cortar o cabelo, porque é muito mais giro jogar à bola, do que acampar no cabeleireiro. O final da tarde vai pois ser no dito, claro, e máquina 4, que de outra forma não vamos lá. Restabelecida, posto uma saia rodada, à qual valeu o saiote ( sim, como os das nossas avós, que pensam vós?), pois o vento já me deu de rajada. Passo ainda no sapateiro, meu fiel amigo, a fim de cortar um pouco de salto no sapato novo, que fica aqui a matar, mas quase me desequilibra, coisa que não é fácil, convenhamos, que sou perita em alturas. Rumo entretanto até à Capital de distrito, a fim de recolher documentos tratados há já algum tempo, por lá esquecidos, tal o medo da foto. Medo muito fundamentado, como entretanto constatei. Eu e rebento, assemelhamos-nos a qualquer coisa tipo Bonnie and Clyde, versão mãe e filho, pior ele que eu, nesse aspecto de bandidagem. Já nos estaminé, ressuscito a minha pen da cegoc, com as maravilhosas correcções das provas. A pobre olhou para mim, e deve ter pensado algo como, o dia não está de feição, vou mas é acordar, e ver se salvo a minha pele. Inteligente a sacana. Nem sabe quanto, que o lago do jardim, já lhe acenava de perto.

terça-feira, 4 de maio de 2010

Sensos, bons ou então não

Perco-me por vezes, é um facto. Por momentos, réstias de esperança diria, tento ensinar bom senso a gente grande. Como se possível fosse. Numa esmerada busca, em pequenos sinais, julgo que algo ficou. E até talvez tenha. Não deve encontrar encaixe, e esvai-se, deve ser isso. O bom senso cria-se digo eu. Desde o berço e até sempre. Do nada, só mesmo outras coisas.

Dias

Tenho frio.
A minha pen de correcções da cegoc pifou.
Tenho resultados de provas para analisar, e não sei como.
O vento despenteou-me, e pareço um alien. Não gosto.
O despertador acordou-me.
Tenho uma borbulha no queixo, e ainda assim, insisto no chocolate.
O café estava queimado.
Descobri novos brancos na nuca.
O chocolate outra vez.
Estou num dia não, é isso. E também por outras causas que não interessam para aqui.

Objectivos perfeitos, ou de como nada fazer...


Os princípios, deveriam reger a educação, mas para isso, deveríamos primeiro educar as famílias. Ontem, na chegada a casa, diz-me o rebento, Mãe, alguns dos meus amigos, chamam Bruna ao Bruno, e ele fica zangado. Não chames querido, já sabes que não se deve. Eu sei mãe.
Os miúdos são crúeis, claro, faz parte. Existem vertentes imutáveis, nas quais pouco se pode fazer. Os miúdos baptizam, de forma dura e inconsciente. Mas reproduzem também a falta de regras que lhes é dada. A educação é algo fundamental que muita gente desconhece. É um problema abrangente, claro, de cariz social, onde cabem diversos fenómenos, como o Bullyng, a violência, o desrespeito a desobediência, e este meu pequeno post, não passa de um mero desabafo, porque nada muda. Mas apetecia-me, urgia à nossa sociedade, uma educação de Pais. Um caminho esclarecedor para quem se interessasse, e que não raras vezes, não sabe que fazer. Ou então não quer, ou desconhece a sua importância. Nas escolas, nas políticas, centra-se a intervenção na criança, que é apenas o reflexo do problema. Há caminhos, há discussões que necessitam de emergir. Em tempos de CPL, a minha forma de chegar aos Pais, era convida-los para o lanche, que na maioria das vezes, a fome e a miséria levava-os até mim, e o resto, estava ao meu encargo. Se era 100% eficaz? Não, claro que não, mas os 20 ou 30 que atingia deixavam-me a sorrir.
A postura do não vale a pena, porque não se chega a todos, é que não vale mesmo a pena. Chega-se onde for possível, e é o início do caminho. Ou deveria ser, ou assim. Claro que o Bruno a quem chamam Bruna, poderá não sair lesado, e assim esperamos. Claro que os miúdos fazem sem perceberem que é uma brincadeira de mau gosto. E é exactamente aí, no facto de não perceberem, ou de perceberem e usarem a situação por forma a ofender, que reside o problema.
E é exactamente antes, que se devia trabalhar, mas é sempre mais fácil remediar. É qualquer coisa semelhante ao estado geral do País, portanto.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

A velha G

A velha G, era uma velha chata e feia. Com cheiro peçonhento, meio misturado de bafio e perfume floral, do mais intenso que possa haver. Tinha sempre um carrapito no alto da nuca e vestia uns vestidos de cores garridas, adornados com uns colares de bolas enormes e coloridas. Insistia em dar-me quatro beijos, porque lá era assim, e eu respingava sempre, que já dois custavam, quanto mais quatro. Nos dias de maior irritação, dava dois de fugida, e afastava-me num ápice, a fim de fugir às suas mãos que teimavam em segurar-me perto, para me dar mais dois. O cheiro dela ficava-me nas entranhas do nariz por tempo considerável. Era uma velha lutadora, que isto nesta vida não se tem só defeitos. Coisa que ela quisesse, lá chegava, e o que ela pensasse, era para se fazer. Julgo que às vezes, conseguia os objectivos por exaustão de quem a ouvia, só para surgir descanso, que esse, na revelia de sua Excelência, era impossível. Fez casas aqui, acolá, subiu na vida, mas continuou a apanhar azeitona nos terrenos baldios, de sol a sol, porque o azeite fazia-lhe falta, e a vida é cara. Já não a vejo há tempo considerável, mas ouço notícias dela, de quando em vez, embora não faça questão, que é uma daquelas pessoas que me deixou imagem de bruxa, daquelas construídas na infância, e consequentemente eternas. Não obstante, admiro-lhe a capacidade de conquista, e por isso, me vem com frequência à cabeça, como ainda hoje. Costumo ser orgulhosa das minhas acções, posturas e atitudes respeitadoras, coesas, inteiras. No meio da decência, lembro-me dela, e do seu ardil, e de como chegou longe a sacana. Não abdico dos meus ideais por metas, óbvio. Mas não deixo de pensar, às vezes, em certos dias, que lhe admiro a capacidade de evolução externa, que a interna, enfim, ficou-se por lá, quiçá no meio dos olivais. É quase centenária, bebe vinho com fartura, conservou-se. Nunca aturou ninguém, porque todos a aturaram sempre a ela. Chegou onde queria, independentemente de tudo, e terá falta de muita coisa, mas não de mérito. É uma Mulher grande. Feia, chata, mal cheirosa, manipuladora, e essas coisas, mas ainda assim, grande. Das tais grandezas externas, mas que neste mundo de cão, valem. E valem que se fartam. A propósito, é uma das grandes responsáveis por eu não simpatizar com Francesas, salvando as devidas excepções, claro. Já tive outras experiências posteriores poderosas, mas ela foi a primeira.
Contra Franceses, não tenho nada.

domingo, 2 de maio de 2010

Evoluções, ou então não

Por ora, ainda não sei se a festa será encarnada. Sou dessa cor desde sempre, mas já não lhe ligo nenhuma. Chego a sentir saudades de quando vibrava com estas coisas. Hoje sou exigente com tudo e mais alguma coisa, e um título no campeonato diz-me tanto como nada. Era tão mais fácil quando me sentia cheia com pormenores destes, e quando a euforia me subia, só porque marcávamos um golo aos lagartos ou aos dragões, coisa efémera, e em nada dependente de mim.

Do dia...


Desenhou uma mãe, um pouco a dar para o cabeluda, não sei o que me quis dizer... Depois escreveu algo lindo que não transcrevo porque é muito meu. Deu-me um abraço, daqueles do tamanho do mundo e disse que me amava. Deu-me uma pregadeira, um coração gigante, feito por ele, que tenho obviamente na lapela. E fiquei de olhos molhados, claro que sim, só podia. Às vezes, sinto-me pequena, perante a imensidão do que sinto. A minha cara Antígona, sempre de palavras sábias, diz para os deixarmos crescer, e tem toda a razão do mundo, que o caminho é mesmo esse. Talvez a nossa maior tarefa, seja acompanhar esse crescimento de forma protectora, mas livre e impulsionadora, quando o que queremos mesmo, é tê-los debaixo da asa. Que todas o consigamos, ou que fiquemos muito perto. A minha, esteve quase, quase lá. É grande ela. O meu filho também, e eu, tento sê-lo todos os dias.

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