sexta-feira, 21 de maio de 2010

Dos nomes

Quis o destino, ou a sorte, que a minha bisa tivesse um filho anão. Um ser pequeno e rechonchudo, que cedo deixou as abas da mãe, e não obstante o minguado tamanho, se fez à vida, com sucesso, por terras da Nazaré. O Ferreira, como era chamado. Vícios, esses, existem por aí aos magotes, e nele também pairavam, que ainda por cima era pequeno, insisto, atribuindo à sua pequenez, talvez erradamente, algumas fraquezas internas. Bebia e fumava como ninguém, trabalhava no Bingo e comia camarões ao almoço e ao jantar, quando almoçava e quando jantava. Era um bom vivant de um estilo próprio, que morreu cedo, pela mão dos exageros, que cobraram a seu tempo. Hoje, encontro duas Nazarenas, daquelas de gema. Com sete saias, cordões ao pescoço, brincos de oiro, e bigode farto, que choram e gritam com dor na alma, perante alguém que lhes é querido. Palavras fugidas, surge o Ferreira, amigo das duas, constatou-se, companheiro de paródias, cartadas e bailaricos, ao som do rancho, sob a maresia da praia. O mundo é pequeno. Choraram as velhas do carrapito, julgo que pela saudade, atiçada pela fraqueza que tinham de fronte, e quase que derramo uma lágrima, eu, que nem sou de coisas assim. Ofereceram-me o mundo, que sou sobrinha do Ferreira, grande Senhor por terras de pesca, reitero, apesar de pequeno, e já morto. Em tempos, de adolescência rebelde, cheguei a ambicionar nomes pomposos. Naquelas alturas em que vaidade fala alto, e por quase nada, vendemos a alma em traição. Vasconcelos, Cunha e Sá, nomes sonantes, é que me faziam falta, achava eu, pobre cachopa. Hoje, já no pós trinta, sinto um orgulho imenso no nome que carrego. Nome potente este, que crava mossa, mesmo que em gente pequena, e espalha boa disposição por onde passa. Sinto-me grande, carago.
A propósito, o meu tio anão, era Benfiquista ferrenho. Vendeu-se por dois tostões, contava o meu bisavô, que achou por bem retirar-lo dos lagartos, boa hora o fez. E ele deixou-se ir, no bom caminho, e dois tostões mais enriquecido. Era um Ferreira, claro.

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