terça-feira, 18 de maio de 2010

Mil

Ainda me lembro do meu bisavô Chico dizer que haveria de se descobrir a vida eterna. Eu, pequena, e sentada na sua frente, acomodada numa almofada de trapos, situada no chão de soalho esburacado e de fronte à braseira, olhava-o com os meus olhos cor de azeitona, muito abertos e incrédulos naquelas palavras, sempre sábias, que liam o Almanaque Borda d'Água, com uma fidelidade perfeita. A minha bisavó, a quem eu chamava Chica, mas que se chamava Rosalina, olhava-me de soslaio, numa pausa das suas costuras nos tapetes de corda que fazia, percebia o meu olhar de espanto e dizia, não lhe ligues minha querida, isso é tolice. Nos entretantos, levantava-se, dirigia-se ao oratório que tinha nos quartos do fundo, em cima de uma arca de madeira carunchosa, destrancava-o, sacava a cortina para o lado, e rezava pela saúde de todos, e pela minha também. Sinto falta das rezas dela, que espreitava, por entre a nesga da porta, em silêncio absoluto. Hoje, um Cientista diz por páginas de jornais, que se encontra em vias de descobrir a cura para o envelhecimento, e que dentro de pouco, viveremos até aos 1000. Não tenho nada a opor, até porque por ora, as dissertações profundas, como já devem ter percebido, encontram-se em mim adormecidas. Apetece-me apenas e só dizer, que não me parece nada que aguente isto até aos 1000. Mas sou aberta a tudo, claro.

2 comentários:

  1. Até aos mil? Se o Sócrates sabe disso, obriga-nos a trabalhar até aos 995, e a descontar, claro ...

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  2. credo!não imagino ninguém a chegar aos mil fresco que nem uma alface, a cuidar de si, cheio de energia e saúde, feliz, sem problemas de maior, sem cansaço de estar cá há anos sem fim, sem ser num lar ou num hospital qualquer, sem um bilião de limitações, a trabalhar....os velhinhos são incríveis, mas ser velho 900 anos ou mais?medo muito medo:P

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