sábado, 11 de fevereiro de 2012

Rocha

Existem alguns sítios do mundo que me pertencem. Não por direito, mas por vontade, até porque os terrenos públicos podem ter mais do que um dono, mais do que um proprietário, mais do que um guardião. A Nazaré, por exemplo, pertence-me. Mesmo que outras gentes lhe pisem o chão todos os dias, se alberguem no vento que lá sopra, se salpiquem da água que salta do mar, e eu, apenas seja bafejada por esses seus predicados quando lá me desloco para o efeito, ou seja, apenas quando posso e quando os meus dias me permitem devaneios, coisa rara, convenhamos. De qualquer forma, também não sei se a quereria sempre. Faz parte daqueles sentimentos que se constróem envoltos em alguma mística inexplicável, dos quais a falta e a saudade são parte integrante, e sem os quais a coisa perderia por certo a graça. Pelo menos esta graça de encanto. Ganharia com certeza um outro cheiro, um outro sabor, muito mais vulgar e enjoativo, entre a pevide salgada e o pastel de nata doce, os restos de peixe assado as bolas de Berlim com creme, que assim me cheiram sempre a maravilha. Um dia tive um sonho com o mar da Nazaré. Nele, o dito encolhia-se para dentro do oceano, deixando a descoberto inúmeras rochas cravejadas de caranguejos minúsculos e mexilhão de casca grossa. E eu podia palmilhar a pé a distância que me separava da rocha grande, uma rocha robusta e resistente à envolta, cansada de levar com ondas gigantescas de espuma branca e enraivecida. Gosto muito daquela rocha. A Nazaré não seria a mesma sem a sua presença. Fui até lá e cumprimentei-a, fiz-lhe uma festa delicada no seu corpo possante e encrespado, de cor verde, muito escura. A pobre gemeu e caiu, sendo devorada para todo o sempre por umas areias pequeninas e enfurecidas, cansadas do peso da resistência.

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