Gosto especialmente das antigas, por cá ainda existem algumas, uma delas, julgo até poder considerá-la, uma autêntica relíquia, começando pelo dono, passando por todo o material que lá está dentro. Fica num rés do chão, como qualquer boa barbearia que se preze, na zona velha da cidade, e o barbeiro apresenta um ar forte e determinado, quase parecendo, que o pescoço de quem a ele sujeita a barba todas as manhãs, corre sério risco de sair dali sem vida, tamanha injustiça, que o que mestre faz, faz com jeito e precisão, sendo que apenas e só olhos destreinados de Mulher, que nada entende do ofício, poderão julgar tal barbaridade.
A cadeira é de um verde água muito clarinho e reclina-se para trás com uma manivela, que os tempos da sua feitura, ainda não eram de grandes automatismos. Ainda assim, tem um almofadado confortável, que permite a quem nela se senta, o repouso devido, disso, não haja dúvida. Também de resto ali, na barbearia do Sr Chico, nem há lugar a modernices, que o de antigamente era de um outro calibre, pelo que o espólio que guarda, já de tempos de herança, nem sei se de pai se de avô, fazem as vezes necessárias, com a qualidade exigida, a quem diariamente o procura, com fidelidade e carinho. Para que caso não saibam, embora eu julgue até que já possam ter imaginado, fiquem sabendo que tem clientela de anos, de sempre, desde que são homens de barba rija, uma família, dizia-me em tempos.
Todas as manhãs, leva o Correio da Manhã para a sua loja, cuidadosamente dobrado debaixo do braço, devidamente protegido da chuva ou do vento, se for caso disso, que o cliente merece um jornal estimado. Ele nem sequer aprecia lê-lo amachucado, pelo que por si se referencia, que se em algum lado procurar serviço, seja ele de que ordem for, se há coisa a que dá apreço, é à ordem atribuída ao jornal, que deve estar sempre impecável e legível, a fim de bem entreter, quem se encontra a esperar vez. Embora nem se espere muito no seu estabelecimento, diga-se a bem da verdade, outro motivo de orgulho, que se organiza ao milímetro com toda a sua freguesia, que comparece religiosamente na hora marcada, já lhe conhecem a pontualidade, a fim de se poder dar o seguimento devido, ao trabalho do dia.
A rádio, é outro dos adereços que compõem o cenário, Renascença, que é o que se ouve de sempre, e irá continuar a ouvir-se, que já nem existem rádios como esta, de cariz sério e Português, onde se fala do que importa, e não cá de ninharias que não interessam nem ao menino jesus. O som vem directo de um aparelho creme, também ele de outros tempos, com um botão redondo que liga e controla o volume, e outro onde se encontra a banda desejada, sempre no sossego, pelo motivo que atrás já expliquei.
Temo-lhe a extinção. Nem sequer a frequento, por razões por demais óbvias, para que necessite especifica-las. Ainda assim faz parte da cidade. Nunca mais vai ser a mesma, sem a barbearia do Sr Chico.
São verdadeiros museus esse tipo de estabelecimentos :) De resto há já quem coleccione essas velhas cadeiras :)um mimo, diga-se em abono da verdade.
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