sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Casa Pia


Nem sei bem precisar o ano, que me esqueço de números depressa, mas nem importa isso. Julgo que corria 2003, e foi o meu segundo emprego. Alguém me liga, e me questiona sobre o meu interesse, visto ter deixado curriculum em tempos, porque alterações de fundo surgiam. Sabe, é o processo. Algo tem de ser feito. O meu interesse mantinha-se, e foi ai que entrei na Casa Pia de Lisboa, num trabalho rebuscado da Provedoria, que achava ser altura, de remediar. Nem gosto muito de remedeios, é um facto, soam-me sempre a isso mesmo, a um remendo, a uma solução de emergência para algo de ruim que poderia ter sido prevenido e não foi, típico do Homem, de resto. Mas urgia isso mesmo, que o mal, estava mais do que feito. Os abusos, já tinham sido cometidos, os olhos de muitos, já tinham sido fechados, e finalmente, abriam-se agora bocas, que traziam ao mundo uma dura realidade. A CPL, a Instituição que albergava meninos de rua, falhara redondamente a sua missão. Ao invés de proteger e amparar, permitiu, ainda que talvez em ignorância, crime também ela, quando responsabilidades se assumem, que um considerável número de crianças, fossem entregues às mãos de criminosos, deixando que à carga de um abandono, juntassem ainda a carga da violação. Terrível.
Ninguém mais se calou, claro que não, que há que descobrir e apurar culpados desta sórdida situação. Abrem-se processos, guardam-se as vítimas bem guardadas, admitem-se técnicos de retaguarda, a fim de terminar e remediar a tortura. Dai até hoje, algo se fez, pouco se concluiu. Os meninos estão mais cuidados, guardados por educadores devidamente credenciados, ao invés de auxiliares sem formação. Os técnicos são presença assídua no dia a dia das crianças e jovens, participam na elaboração dos seus projectos de vida, apoiam as famílias em caso de regresso, e tudo parece fluir.
Fica-me porém a mágoa dos outros, daqueles tais. A bem deles, espero, sinceramente, que a justiça se cumpra sensata e lógica, castigando de forma efectiva quem merece ser castigado. Espero também que a vida lhes tenha dado a oportunidade de seguir em frente, a todos, e com um carinho muito especial, aos que acompanhei bem de perto. Desejo ainda, que eles tenham perdoado a vida pelo mal que esta lhe fez, pormenor fundamental a um crecimento saudável, se possível isso for. Por último, desejava que a lei da prevenção se tornasse mais efectiva. Todos merecem. Crianças indefesas, merecem muito.
E mais não falo sobre isto. Já é mais do que altura do País arrumar, julgar, e calar para sempre, tão tamanha vergonha.

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