Luana tem seis anos, uma mãe e um pai toxicodependentes. Não tem avós que se conheçam, e tem uma tia, já de alguma idade, que diz não ter estrutura de suporte para ela, uma criança, que de tanto necessita. Está ao encargo de uma instituição desde bebé, com uma fraca presença parental, que faz aquilo que costumo chamar de apoio ocasional, do quando dá, quando apetece, quando calha. O pai está em tentativa de reabilitação, não tem emprego, e a reabilitação está difícil. A mãe continua toxicodependente, sem sinais de qualquer evolução positiva. A tia, embora não possa ajudar, indigna-se com o facto da Instituição falar agora em adopção. Porque a adopção implica um afastamento real e concreto dos pais, e a integração numa família que lhe possa dar uma vida adequada, mas longe. Porque iriam perder-lhe o rasto, e as referências parentais, por fracas que seja, dever-se-iam manter, ressalva-me a tia, de ar indignado. Eu, que também tenho direito à indignação, indigno-me com o facto de se poder considerar que o centro do problema são os pais que perdem o rasto à filha, aquela, da qual se lembram de vez em quando. Quando dá jeito, quando calha, quando passam, por mero acaso, na porta do lar. E não a filha, institucionalizada desde sempre, sem colo efectivo de onde este deveria surgir. Indigna-me ainda, e volto a dizer, ao abrigo do meu direito à indignação, com o facto de ser necessário esperar seis anos, para se pensar dar uma família à Luana, e a tantas outras Luanas por aí.
Nem podemos encaixar tudo, e ainda bem que assim é, que os sentimentos nefastos poderão ser de tal ordem, que a experimenta-los todos interiormente, decerto colapsaríamos de dor. Percebo pois a ignorância das gentes, sobre o que é estar à deriva num mundo, que ao invés de dar oportunidades, amor e segurança, dá dor, abandono e solidão. Percebo ainda que não encaixem, o que povoa as mentes daquelas crianças, quando nos olham de olhos lacrimejantes, cravejados de uma esperança que se esvai devagarinho, quando percebem no final da tarde de Domingo, que o pai que era para vir, não veio. Até percebo tudo isso, e ainda que não tenham estrutura suficiente para ajudar. Deixem-se é de indignações da treta, e permitam encaminhar para uma vida decente, pequenos seres que dela necessitam.
Porque uma criança de tanto necessita, chegou a dizer.
O que me deixa deveras apreensivo, é o pressentir, pelas evidências, que estes casos se vão multiplicar...
ResponderEliminar:( Pois é...
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