quinta-feira, 18 de março de 2010

Sítios

O desfecho era incerto. No local, uma urgência de um qualquer Hospital Distrital, funciona-se num contentor. Ciente da sua necessidade, não deixo de pesar. Julgo que não conseguia trabalhar um dia inteiro dentro de um contentor de lata cinzenta, sem janelas, e que abana quando andamos. As pessoas apinham-se, claro, como em qualquer urgência. O assunto, que me leva ali é delicado. Com jeito e paciência consigo o pretendido. Enquanto esperava, vejo de tudo um pouco. A cigana de olhos verdes, lindos de morrer, que fala do irmão que morreu no mês passado, com um à vontade supremo. O enfermeiro da triagem, com ar de enfado, que me encaminha. A Médica da ala de Psiquiatria, que se destaca pela simpatia. Quem lida com gente diminuída, desenvolve, por norma, uma doçura incrível. Vai ficar um tempo, numa tentativa expressa de controlar as crises psicóticas, que põem em causa a sua estabilidade. No internamento, tudo é estranho. Alterna entre gente que ri e gente que chora, num desespero angustiante. Venho embora, e ele fica lá. São só uns dias, vocifero-lhe ao ouvido. Ele acena-me que sim. Venho, e trago comigo a sensação de que o abandono, no meio da desgraça. Junto com o sentimento, de que talvez pudesse ser diferente. Condeno o sistema, por falta de alternativas viáveis. Condeno a sociedade, ou parte dela, pela frieza e desrespeito com que se trata a fragilidade, que era suposto proteger. Já falei disto por cá duas vezes. Estou chata com o assunto, eu sei. Não volto a fala-lo tão cedo. E não tenham receio, sou boa a cumprir palavras.

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