sábado, 4 de setembro de 2010

Feira


Resido em terras de feiras, feiras essas que se entranham nas gentes. A da cebola será já centenária, ou perto disso, por ora renovada pela vontade do povo, que se enfia em tendas onde se come e bebe vinho carrasco, como se o amanhã não existisse. Pelas ruas, o mesmo dá um ar de graça, ou de desgraça, nem sei bem o que diga. Já quase na aurora, num sono interrompido, logo hoje que estava profundo e de bons sonhos, oiço ameaças de morte. Eu mato-te, sua puta. Não te apanho hoje, é amanha. O posto da GNR, bem defronte à minha casa, nem deve ter percebido a algazarra, que se alastrou uma meia hora, com discussão acesa, entre os vários intervenientes. Levanto-me, bebo um copo com água, e vou fechar a janela, de onde já se sentia uma fresca brisa matinal, que desprezei em prol do silêncio. Um desperdício. Nesse exacto momento, o posto abriu-se e saem as autoridades. A Mulher e outros foram embora, ele pareceu-me ficar, nem sei se pouco, se muito tempo. Se a vontade em mata-la fosse real, teria sido consumada, que a lei, estava decerto adormecida. Ou distraída, ou um qualquer outro adjectivo, que nem importa qual, importa apenas e só, que tardou demais.
Somos um País de álcool, e eu, não simpatizo com ele, sem culpa alguma do próprio. A enologia até me seduz, que trata um assunto sério, de cultura, de ciência, que a ser respeitada, vale como qualquer outra. A incapacidade das gentes, de lidar com o prazer que lhe trás um bom vinho, de forma sensata e regrada, essa sim, intriga-me por demais. Esforço-me, mas nem assim compreendo, a necessidade constante de se intoxicar o corpo além limites, numa provocação a uma causa que demonstra bem a fraqueza do Homem, que ao invés de se proteger, entrega-se, ao ponto de se perder. Vai mais um copito?

Não sei se ele a apanhou se não, e se o fez, provavelmente nem a matou. Por esta hora, após o sossego, o recato, ou sabe-se se lá mais o quê, até talvez as pazes tenham surgido. Provavelmente agora, ela até já nem é puta nem nada.

4 comentários:

  1. Também nunca entendi o que leva certas pessoas não respeitarem os próprios limites e entregarem-se assim, nas mãos do vício que lhes consome o corpo e a alma mais tarde ou mais cedo...
    é triste...

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  2. Já toquei, há muitos anos nessa festa das cebolas, os artistas, eram o Herman José, e a Hermínia Silva, eu integrava a banda de suporte e bailarico. Agora sei onde moras :):)

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