terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Dias

Já me tinha esquecido o que é enfiar-me dentro de um comboio em hora de ponta, em que as misturas de gentes se fazem valer, e onde entra o executivo munido do seu computador portátil, o soldado que vai de fim de semana, que não foi o caso que hoje é terça, a cigana que vende na feira de sabe-se lá onde e leva a carga numa trouxa de pano encardido, e os estudantes que se arrumam aos magotes, enquanto ouvem música no iPhone e mascam pastilha elástica em forma de ruído. Entre outros. Enquanto as estações passam faço sempre aquele exercício engraçado de olhar pela janela e ver quem fica, e que provavelmente nunca mais vou voltar a ver. E se voltar, o mais certo é nem dar por isso, que os rostos são coisas que se somem no tempo, esquecemos os traços, os contornos, as definições. Os olhos são um sentido fraco, há muito que já o concluí. Tenho alturas em que inclino um bocadinho a cabeça para ver melhor quem fica, e que por qualquer pormenor me fixou a atenção, e fico a olhar enquanto posso, pessoas que não são minhas, vidas que correm, gente alheia que naquela hora me pertence. Pertencer, pertencer, até talvez nem seja bem o caso, que cada um, e na sua essência e vontade, pertence a si próprio e a mais ninguém, mas pertence aos meus olhos, à minha imaginação, ou seja, naquele exacto momento é minha e é dela, pelo menos enquanto eu assim o entender. Cá dentro de mim imagino e sinto o que eu quiser, construo as histórias que bem me aprouver, divago onde me apetecer. Um direito meu, igual à liberdade de toda a gente que me rodeia. A imaginação não é um sentido, mas se fosse era um daqueles muito fortes, quase semelhante ao cheiro, arrisco dizê-lo.
O tamanho das coisas continua a ser relativo para mim. É uma conclusão um pouco estranha para o texto, mas quem me lê sabe que por vezes tenho destas coisas assim. Os dias. Sim, os dias, caso não saibam, não têm todos o mesmo tamanho.

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