quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Saltos

A minha vizinha de baixo voltou a esperar-me. Quer que eu ande em pézinhos de lã, que me descalce mal chego, e que me calce só quando voltar a sair de casa. Está na reforma a minha vizinha, e como passa o dia em ócio, é frequente esperar-me envolta num robe cor de rosa bebé, muito peludo, que me parece extremamente fofinho. Se não fosse a carga de trabalhos que me acarta calçar-me apenas quando saio à porta, fazia-lhe a vontade. Mas de facto atrapalha-me, não me dá jeito. Só depois dos saltos nos pés consigo acabar de fazer tudo. Vestir o casaco, terminar o lanche da escola do meu filho, escolher os brincos que me compõem. Ela não sabe, mas tem em mim um aliado. O meu costado, malvado, que de vez em quando se queixa aqui do alto do meu metro e sessenta e cinco, nú, escalavrado, torto e encovado. Uns ossos entorpecidos sem qualquer réstia de graça, ao pé do robe felpudo da minha vizinha, e da sua presença possante. Pobres que são. Por muito que me agonizem o corpo, nunca questionei os saltos por causa deles.

3 comentários:

  1. Tive uma vizinha no andar de cima que nunca saía de casa. Contudo, era ouvi-la das seis da manhã à meia-noite de socas de madeira (só podiam ser socas!) a fazer sapaetado pela casa toda. Um dia fui lá cima solicitar novo calçado por clemência: apresentou-se-me descalça. A velha...! :)

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  2. Também já tive uma vizinha assim, que me veio pedir para não andar de saltos em casa :) bons tempos, esses em que eu calçava saltos :):):)

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